Shinobi: O Senhor da Guerra – “Review”

Shinobi: O Senhor da Guerra

Diz o Bushido, compilação do código dos samurais que ficou famosa depois de ser a base para um quadro esportivo na TV, que não existe nada para além do certo e do errado. Não há meios termos, não há tons cinzentos, não há relativização. Shinobi: The Warlord não abre mão desta verdade absoluta e segue os ensinamentos ancestrais para retratar uma jornada de autodescobrimento e da realização da verdade absoluta por meio da lâmina da katana de um guerreiro sem rosto que nasceu pra morrer, para cumprir a ordem natural das coisas.

Nesta novíssima obra do visionário autor, diretor, roteirista, programador, sonorizador, modelador, e artista Gilson B. Pontes, somos transportados para a segunda metade do século XVI, um período conturbado do Japão feudal onde um jovem chamado Tokugawa Ieyasu surge como uma verdadeira força da natureza depois de uma infância difícil. Feito de refém pelo clã Imagawa à mando de seu próprio pai, ele se aperfeiçoou no campo de batalha e também na política, sem saber que o destino tinha seus próprios planos para ele. Esse é só o início de uma trama revolucionária cheia de cavalgadas e assassinatos, que termina com outros assassinatos e um pouco menos de cavalgada.

Com uma espada em mãos e outras duas nas costas, tal qual o lendário espadachim Roronoa Zoro, o guerreiro sem mestre e nem nada precisa atravessar um portal para encontrar samurais gigantes se cruzando diante dragões sob a luz de um planeta em chamas no horizonte, para enfim encontrar guerreiros caminhantes do nada e acabar com suas torpes vidas por um motivo oculto para cada um de nós. Uma causa própria, elevada por si mesma, porque no final das contas é preciso defender a justiça que emana dele e somente dele.

E se o ambiente lhe é reconhecível, não é um engano seu, nem meu. Estamos diante de uma nova produção que compõe o intrincado GilsonBPontesVerso e que dialoga intracomposicionalmente com outras criações como Ashigaru: The Last Shogun e Jimbaori: The Onin War de uma forma tão orgânica que pobres desavisados poderiam acreditar piamente serem o mesmíssimo jogo. Para garantir uma narrativa transmidiaticamente coesa, até mesmo o terreno acidentado e inócuo, bem como o prédio que sintetiza toda a arquitetura replicado por todos os lados estão presentes. Cada um de nós, fãs de longa data, poderemos reconhecer os meandros de um conjunto compartimentalizado em partes igualmente empolgantes, porque quando embriagados por Shinobi: The Warlord, nos tornamos um só com ele, tal como a sombra do guerreiro em seu portentoso alazão.

Há detalhes importantes, porém, que somente os mais atentos poderão contemplar. Os inimigos que explodem em luzes quando derrotados trazem o místico para um cenário extremamente realista, e a esperança de ver os gigantes se encontrando é o combustível que nos guia diante rivais tão sofisticados. As conquistas que levam à platina, aliás, são totalmente dedicadas à morte de cada um dos inimigos escondidos em um mapa que, não fossem as barreiras invisíveis que nos mantém no foco, nos levaria a cavalgadas infinitas. Uma vez imbuídos da jornada, nada poderia parar nosso herói indefinido. Para ele, se propor a realizar uma tarefa é como se a já tivesse feito.

Shinobi: The Warlord (ou, para manter a pureza idiomática da ambientação, Shinobi: O Senhor da Guerra) traz na sua granulação imagética a aridez de um mundo antigo, buscando a representação fidedigna da forma como aquele povo realmente via o mundo antes dos nossos olhos se importarem com a futilidade das altas definições. Olhar para o jogo é como se estivéssemos realmente lá, recebendo quilos de areia áspera nos olhos, e ouvi-lo é ainda mais agressivo do que se esta areia ardida rompesse nossos tímpanos. São sensações únicas que enobrecem a escolha inexplicavelmente insana de se estar experienciando isto e não qualquer outra coisa enlatada e mundana.

Os mais fracos poderiam sangrar pelas cavidades ósseas de suas cabeças, assim como jamais suportariam o peso da vibração dos controles quando seres monstruosos se fazem presentes, e é uma pena que o jogo seja exclusivo de PS4, porque eu adoraria ver o que essa mente faria com as sutilezas do DualSense. Os auto-falantes do controle, entretanto, refletem o sofrimento dos moribundos inimigos vencidos, talvez até em lamentos de alívio por terem sido libertos daquele mundo. Muitos jogos podem dizer que não são feitos para qualquer um. Este, porém, não teria receio em dizer que é feito para ninguém.

O filósofo Jean-Paul Sartre nos diria que “a beleza é uma contradição velada”, e usaria este jogo, caso estivesse aqui na redação do site, para ilustrar melhor aquilo que desejava realmente falar. Se a perfeição é uma montanha que não pode ser escalada, resta aos idealistas subir alguns centímetros por dia para se aproximar dela; e se não há jogo perfeito, há que se apontar para a direção contrária. A busca não é fácil, e cada nova batalha vencida pelo exército de um desenvolvedor só é um passo mais perto da luz obscura. Ninguém pode se preocupar em superar aquilo que os outros são, mas sim, superar a si mesmo, e tudo o que já vimos nas obras anteriores deste multiverso complicado está aqui, elevado a um outro nível. Você, caro leitor, certamente não está pronto para isso.

Jogo (versão de PS4) “analisado” no PS5 com código fornecido pela LGS Games Productions.

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