Dizer que Atelier Ryza: Ever Darkness & the Secret Hideout é uma grata surpresa não faz jus ao quão surpreendente e bom o jogo é. Com a franquia tendo, de alguma forma, mantido um ritmo de produção frenético e quase assustador apesar das várias mudanças de geração, era de se esperar que o quarto título lançado em um ano sofresse um pouco.
Mas, ao contrário, o que temos aqui é um jogo consciente dos pilares sobre os quais a história série Atelier foi construída e os usa não para reinventar a roda, mas para entregar um jogo sólido em todos os seus aspectos que deve agradar não só aos fãs de longa data da franquia, mas especialmente aos novatos que nunca tiveram contato com ela.
Esse último talvez seja o ponto mais importante de Atelier Ryza. Marcando o primeiro jogo desde Atelier Sophie: The Alchemist of the Mysterious Book em 2015 que não se trata de uma sequência a uma das outras séries existentes dentro da própria franquia (Atelier Firis e Lydie & Suelle eram sequências da saga Mysterious iniciada com Sophie e Atelier Lulua: The Scion of Arland é o quarto jogo da saga Arland) e, assim, sendo o ponto de entrada perfeito para possíveis fãs.
O que esses possíveis fãs vão encontrar aqui é um JRPG que lhe coloca no comando da protagonista Reisalin Stout, uma adolescente que vive em uma ilha relativamente isolada, passando a maior parte do seu tempo se divertindo com seus dois melhores amigos, Lent Marslink e Tao Mongarten, e fugindo dos seus compromissos com os seus pais de ajudar na lavoura da fruta típica da ilha.
E é justamente essa fruta que acaba mudando o destino dos três amigos. Reisalin, ou Ryza como é mais conhecida, convence seus amigos a partir em uma aventura na ilha para poderem aproveitar melhor o que lhes resta do verão e trazer mais emoção a sua rotina entediante, se aproveitando da chegada de um mercador a ilha como distração. Em meio a essa empreitada, o trio de “baderneiros” acaba indo parar em uma floresta onde acabam salvando uma jovem do ataque de um monstro.
Essa jovem é ninguém menos do que Klaudia Valentz, a filha do mercador Lubart Valentz, e esse encontro acaba não só criando uma forte amizade entre Ryza e Klaudia, mas fazendo com que Ryza e seus amigos conheçam dois membros importantes da comitiva do Lubart: a guerreira Lila Decyrus e o alquimista Empel Vollmer.
A partir daí, Ryza se apaixona por alquimia, passando a estudar tudo que pode da arte com Empel, enquanto Lent quer se tornar um grande guerreiro sob a tutela de Lila e Tao passa a ajudar Empel nos seus estudos de ruínas antigas espalhadas pelo mundo, enquanto os três buscam passar o máximo de tempo possível com a nova amiga Klaudia. Aos poucos, os estudos de Tao e Ryza vão revelando mistérios ocultos da ilha e fazendo com que tudo que eles aprenderam precise ser colocado a prova para salvar as pessoas que eles amam.
No geral, a história de Atelier Ryza, apesar de ter os seus desígnios de contar uma história grandiosa e eventualmente chegar lá, é muito menos sobre o seu enredo geral e mais sobre as pequenas interações entre o elenco principal de personagens. No seu cerne, essa é uma narrativa muito mais sobre as experiências vividas com os seus amigos e as memórias que nós fazemos com eles e como cada um as leva pro resto da vida.
Esse foco nas relações interpessoais, o fato do jogo se passar com a Ryza e seus amigos à beira da idade adulta, o pano de fundo e o clima de verão que o jogo tem… Tudo isso contribui para que se tenha uma enorme sensação de se estar vendo um dos bons filmes da “Sessão da Tarde”, já que ele não faz nada de especial, mas traz uma constante sensação de conforto e diversão, sendo um jogo quase perfeito para se desestressar e jogar aos poucos.
A Reisalin é uma protagonista especialmente cativante, sendo notório o cuidado da Gust ao criar a personagem. Seja pelo seu visual chamativo, seja pela sua personalidade, ela passa a sensação de ser como uma menina normal, cheia de energia, cabeça dura, mas com um bom coração e forte senso de justiça, ela é muito bem escrita (e a interpretação da Yuri Noguchi, sua dubladora, também é muito boa) e funciona muito bem com o elenco de apoio, ajudando-os a brilhar junto com ela.
Isso é especialmente notável porque pela forma como o jogo implanta os sistemas de alquimia, com a Ryza sendo uma mera aprendiz se acostumando com ela aos poucos, faz com que não se tenha a pressão que os limites de tempo colocavam sobre a trilogia Arland, por exemplo. O jogo te permite explorar, coletar, preparar os itens e partir para o combate ao seu tempo, se tornando um ótimo jogo para simplesmente se deixar envolver e esquecer do tempo.
A alquimia, naturalmente, tem um papel muito importante no jogo. Ao explorar as diferentes áreas do jogo é possível usar o cetro da Ryza ou uma das várias ferramentas de coleta que se pode criar para coletar materiais que poderão posteriormente ser utilizados no caldeirão dentro do workshop da Ryza para criar uma série de diferentes itens, desde poções de cura a bombas e outros itens de ataque, incluindo diferentes equipamentos para serem equipados pela sua equipe.
Algo bem interessante que o jogo faz é trazer uma série de variações na forma como os itens podem ser coletados. No início, será necessário visitar os pontos existentes no mapa para coletar os materiais, com mais opções se abrindo à medida que o jogador cria novas ferramentas de coleta, ampliando o leque de maneiras em que se pode coletar materiais, com a mesma fonte liberando itens distintos a depender do equipamento utilizado. Além disso, após se tornar mais proficiente na alquimia, a Ryza pode até mesmo criar pontos de coleta com alquimia, variando os materiais ali disponíveis a depender do que ela usar para criar o ponto.
Para criar estes itens, é necessário que a Ryza conheça as receitas, sendo que elas podem ser ganhas no decorrer da história, atendendo a diferentes pedidos dos personagens, cumprindo as missões específicas dos membros da equipe, comprando livros nas várias lojas espalhadas pelo mundo do jogo ou usando itens específicos em determinadas receitas para gerar variações especiais delas. É um sistema bem complexo e bem desenvolvido que é simples de se entender mas te dá inúmeras opções de como proceder, tornando-o bem recompensador.
É claro, nem tudo se resume a coletar e criar itens espalhados pelo cenário, sendo necessário também entrar em batalha para progredir (e coletar os materiais desses monstros), apesar do foco ser muito menor nisso do que em outros JRPGs. O combate se inicia ao atacar os monstros espalhados pelo mapa com o equipamento de coleta equipado (cada um gera um bônus distinto) ou ao encostar no inimigo.
Durante a ação, o jogo conta com um interessante sistema de batalha, misturando elementos de combate por turnos com tempo real, com o jogador assumindo o controle primário de um dos três membros da equipe (sendo possível alternar entre eles com o mero toque de um botão a qualquer momento), enquanto a IA cuida do resto (sendo possível alterar entre um modo passivo e um modo agressivo que define o comportamento deles).
O tempo passa constantemente, não se interrompendo enquanto você escolhe a ação a ser tomada. Usar itens, atacar, usar habilidades ou se movimentar pelo campo de batalha é definido por um dos quatro botões de face do controle. Pela forma como o tempo funciona, não é possível parar e analisar cada movimento, sendo necessário pensar sempre bem rápido e decidir as coisas com um constante senso de urgência.
Além disso, o jogo traz um sistema de Action Points (AP), uma barra que vai sendo carregada com cada ataque dos membros da sua equipe e que traz uma dualidade bem interessante ao combate. Por um lado, é possível usar esses APs para usar as habilidades e causar mais dano ou então, acumulá-los para aumentar o seu “Tactics Level” e, consequentemente, aumentar a quantidade de ações em um ataque simples e o poder das habilidades, além de tornar mais provável que um dos membros da equipe use uma Action Order, um ataque especial ativado após determinadas ações.
Essa combinação de sistemas gera um sistema de combate é bem interessante e desafiador, fazendo com que qualquer falta de atenção mais prolongada possa gerar a morte da equipe. No entanto, o jogo em si não é difícil, contribuindo para a sensação de ser um jogo confortável e divertido para os fãs de longa data do gênero, até mesmo os que não conhecem a série Atelier.
Por fim, algo que não pode deixar de ser apontado é o ponto de vista técnico do jogo que é um dos seus pontos mais altos. Apesar das limitações orçamentárias que a Gust tem, ainda assim temos um jogo que se destaca não pelos gráficos realistas ou tecnologia de ponta, mas pelo quão belo o jogo ainda assim é, com um verdadeiro toque artístico permeando o design dos personagens e dos ambientes,e com as artes tanto em 2D quanto em 3D merecendo figurar entre as melhores vistas nesses JRPGs intermediários.
Mas, é claro, mais do que o belo trabalho das artes do jogo, algo que a Gust sempre foi bem reconhecida por fazer e que é especialmente notório aqui é a trilha sonora. Cada momento do jogo se torna mais especial, cada momento se torna mais emocionante e o combate se torna mais envolvente pelo quão incrível a trilha sonora do jogo é. Isso é algo que se percebe em todo o trabalho da desenvolvedora e que, mais uma vez, merece ser aplaudido de pé.
Olhando para o todo, então, fica claro que ao contar com uma história sólida cheia de ótimos momentos de interação entre os seus personagens cativantes e muito bem escritos, o sistema de alquimia bem vasto e o combate desafiador e divertido pontuados pela bela arte e uma das mais fenomenais trilhas sonoras do ano, Atelier Ryza pode não ser um JRPG revolucionário mas trata-se de um jogo muito bom e que precisa estar no radar de todos os fãs do gênero.
Veredito
Atelier Ryza: Ever Darkness & The Secret Hideout não só faz mais do que o suficiente para se diferenciar dos jogos mais recentes da série, mas se coloca firmemente como um dos, se não o melhor título nos 22 anos dessa franquia, se valendo muito bem de todos os seus pontos mais fortes para entregar uma experiência memorável.
Jogo analisado no PS4 padrão com cópia digital fornecida pela Koei Tecmo.
Veredito
Veredict
Atelier Ryza: Ever Darkness & The Secret Hideout not only does enough to differentiate itself from the most recent games of the series, but also puts it firmly as one of – if not the best – titles in the 22 years of the franchise, using all of its strongest points to deliver a memorable experience.