Grandia HD Collection – Review

Permitam-me começar com uma história pessoal. Era o ano 2000, eu tinha um Nintendo 64 e pensava em trocá-lo por um PS1 para jogar JRPGs. Lendo uma revista casualmente (a Ação Games, para quem lembra), vi o preview de um jogo em meio a tantos outros: Grandia. Tinha apenas duas imagens de tela e dois parágrafos, mas, por algum motivo, eu me apaixonei na hora. Troquei logo meu console e, assim que pude, joguei a aventura de Justin e Feena, confirmando meus bons pressentimentos.

Passado algum tempo, comprei uma revista para passar o tempo no ônibus de volta para casa (era uma Gamers) e lá estava, na seção de notícias: Grandia II anunciado! Fui ao céu, mas a frase seguinte me trouxe ao chão com força: apenas para Dreamcast, um aparelho que estava muito além das minhas condições financeiras. É sério, segurei as lágrimas naquela hora. O final foi feliz, pois, alguns anos depois, consegui jogá-lo pela versão europeia para PC, que guardo até hoje.

Dá para imaginar que a chegada desses jogos ao PS4 é bastante importante para mim, não é? No entanto, como veremos adiante, é um lançamento agridoce.

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Como Grandia foi originalmente lançado no Saturn, ambos os jogos começaram suas vidas em consoles da SEGA e sobreviveram para alcançar outras plataformas. O primeiro ficou disponível no PS3 e nos portáteis da Sony por meio do PS Classics, enquanto o segundo saiu depois para PS2 e PC, para o qual também recebeu um remaster, em 2015.

Em 2019, a GungHo Online Entertainment, mais conhecida pela franquia de Ragnarok Online, publicou para PC e Switch uma remasterização, que agora temos em mãos no PS4. Sim, passaram cinco anos antes que Grandia HD Collection chegasse ao console da Sony, mas se trata da mesma versão de antes.

O primeiro ponto que chama atenção é que, apesar de ostentar o nome Collection, apenas os dois primeiros jogos fazem parte do pacote. Grandia III e Grandia Xtreme ficaram de fora (aparentemente, é por uma questão de direitos sobre os jogos). Ainda que o terceiro título tenha elevado o sistema de combate ao ápice, a história é muito aquém dos predecessores, então não é uma grande perda.

Para falar da “dupla de dois”, é melhor dividir também em dois tópicos: os jogos em si e a HD Collection.

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Para quem gosta de JRPGs com batalhas por turnos, não tem erro: Grandia e Grandia II são excelentes, estando entre os melhores de sua época e passando no teste do tempo em vários aspectos, ainda que não em todos.

O sistema de batalha é uma variação bem elaborada da velha barra de ação. Todos, aliados e oponentes, “correm” pela mesma barra, que é dividida em dois segmentos. O primeiro, mais longo, é o que marca o tempo de esperar a vez de escolher uma ação, de acordo com a agilidade de cada um. Ao chegar ali, o tempo para e podemos selecionar entre as opções comuns do gênero: ataques, magias ou itens.

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O segundo trecho da barra é a principal diferença: ele representa o tempo que leva para executar a ação em si. A velocidade varia segundo o poder da ação e a proficiência do personagem naquela técnica específica.

Agora vem uma parte importantíssima: há dois tipos de ataques comuns para selecionar, com diferentes efeitos em combate. O Combo faz o personagem realizar dois golpes. O Crítico dá apenas um, mas tem impacto sobre a barra de ação do oponente, fazendo-o regredir nela ou até mesmo cancelando por completo sua ação, caso já se encontre no segundo segmento da barra.

Somando tudo isso, o que temos é um sistema bastante tático que vai muito além da lógica de usarmos tudo o que temos de mais poderoso. É muito comum que, em vez disso, precisemos escolher executar aquilo que será mais rápido, na aposta de ultrapassar o inimigo na corrida pela barra de ação. Um Crítico bem executado pode ser muito mais valioso do que uma técnica especial que daria mais dano. O mesmo vale para os nossos grupos de heróis, é claro, então ações demoradas correm mais risco de cancelamento por ataques inimigos.

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Existem mais nuances, como o alcance das técnicas e magias segundo o posicionamento no campo de batalha. A questão é que Grandia já traz esse sistema de forma bastante amadurecida, mas Grandia II o aperfeiçoa ao conduzir um fluxo melhor ao combate em si e à evolução das magias.

É importante ressaltar que as campanhas seguem suas história ponto e a ponto, guiando os grupos no clássico formato de viagem pelo mundo de fantasia. A exceção é que Grandia tem duas dungeons opcionais perto do fim e Grandia II tem uma. Fora isso, não há atividades paralelas, missões secundárias ou mapa de mundo aberto para revisitar locais e procurar segredos. A exploração fica por conta do design das dungeons, que não são lineares e escondem baús com equipamentos e itens valiosos. Essa lógica do jogo controlar a aventura também é aplicada aos elencos, com personagens entrando e saindo dos grupos no decorrer das campanhas.

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Um ponto que muito aprecio é a ausência de encontros aleatórios. As áreas são povoadas por monstros visíveis e, muitas vezes, evitáveis. Não é preciso enfrentar todos eles para manter o grupo subindo de nível e com dinheiro suficiente para fazer compras na cidade seguinte. Isso também significa que o famigerado grind de certos JRPGs não é exatamente obrigatório na dupla de Grandia, mas talvez você se pegue recorrendo a isso uma vez ou outra.

No que os dois jogos diferem entre si é nos tons das histórias, que se passam em mundos diferentes e não têm qualquer relação direta, podendo ser jogadas de forma completamente isolada.

Grandia é um épico juvenil com protagonistas empolgados que se envolvem em mistérios maiores do que eles. É um mundo desenhado para a aventura, especialmente por ter um continente recém descoberto que abriga uma muralha intransponível, alta como uma montanha, chamada de Fim do Mundo. Ninguém sabe o que há depois dela, então prepare-se para descobrir. Há um pano de fundo sobre um exército em busca de relíquias de uma antiga civilização, com reviravoltas e drama, mas, em geral, o que sobressai é o jeito leve e carismático dos personagens e da história desse mundo misterioso, resultando em uma saga muito envolvente.

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Grandia II, por sua vez, dá uns poucos anos a mais para seus personagens serem jovens adultos. Ryudo, o protagonista, é um mercenário cínico que é envolvido pela igreja em uma questão religiosa antiga. A mitologia deste jogo segue o maniqueismo: eras atrás, o Deus da Luz lutou contra o Deus das Trevas em uma batalha tão feroz que o golpe final abriu um corte na própria terra, criando um longo e profundo cânion de precipícios que divide o mundo. É uma ideia grandiosa e impressionante, partindo até o leito do mar em cataratas sem fim, mas não tem o mesmo encanto misterioso do Fim do Mundo. O interessante do enredo é a representação da dicotomia dos deuses em suas personagens principais que acompanham Ryudo, uma dinâmica que também é dotada de carisma. No geral, Grandia II é um jogo mais conciso que o primeiro, apresentando uma jornada menos longa e com ligeiramente menos personagens.

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Agora que já tratamos dos jogos, chegou a hora de falar da HD Collection. O primeiro ponto é que os dois títulos não podem ser adquiridos separadamente (apenas a versão de PC permite isso). Seria uma boa opção porque já existe a versão PS Classics do primeiro Grandia, lançada há apenas quatro meses e disponível no catálogo do PS Plus Deluxe. Após cinco anos, ninguém sabia que a HD Collection chegaria ao PS4 com duas semanas de anúncio prévio, então quem optou por comprar a clássica e quer somente o segundo jogo precisará comprar o pacote todo. A propósito, cada jogo tem sua lista de troféus separada, com platinas próprias.

O segundo ponto é que as novidades se resumem à adaptação ao formato widescreen, a maior resolução de imagem e seleção de idiomas (não há português brasileiro), permitindo escolher entre as dublagens em inglês ou japonês.

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Fora isso, nenhum extra foi adicionado para tornar o material mais atraente, como galeria de artes, reprodutor de músicas e, de maneira mais grave, funcionalidades de qualidade de vida que já são esperadas em relançamentos assim. Seria muito bem vindo poder salvar diretamente do menu a qualquer momento, acelerar o jogo e pular diálogos, mas não podemos nem mesmo pausar em meio a cenas narrativas. O funcionamento é plenamente igual às contrapartes de mais de vinte anos atrás. Em comparação, a versão PS Classics permite pausar, retroceder e criar pontos de salvamento.

O terceiro ponto é que, visualmente, o trabalho está no mesmo nível: apenas o mínimo do mínimo foi feito. O formato de tela está exclusivamente em widescreen, sem outras opções. No primeiro jogo, o mesmo se aplica ao filtro suavizador, que não pode ser desligado. Pessoalmente, ao comparar com o do PS Classics, preferi o visual modificado em HD, especialmente nos textos e interface, mas seria bom ter opções para os que gostam do visual pixelizado, principalmente quando consideramos que muitos jogarão movidos pela nostalgia. Além disso, de vez em quando topamos com texturas claramente distorcidas, um estranho efeito colateral para o que deveria ser, afinal, uma melhoria.

Em Grandia, os retratos de personagens também foram filtrados e ficaram com um resultado misto, às vezes bom, combinando com o trabalho feito nas texturas dos cenários, em outras vezes estranho e pouco detalhado, parecendo borrados em alguns cantos.

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Nesses retratos podemos ver a inconsistência do produto enquanto coleção: Grandia II não teve o mesmo tratamento e seus retratos são pixelizados, destoando de outras partes da interface. Ou melhor, os retratos menores exibidos em batalha têm o efeito aquarelado, mas a baixa qualidade deles torna um alívio que não tenham sido usados nos diálogos.

As cenas pré-renderizadas também tiveram esse mesmo tratamento diferente. As de Grandia foram suavizadas e até ficaram razoáveis de ver, embora muito borradas pelo estilo aquarelado. Para mim, ficou melhor que a granulação da baixa resolução presente na versão PS Classics.

Já Grandia II sofre da granulação, ao ponto de estragar os belos murais mitológicos da abertura do jogo. Imagino que isso tenha acontecido por usarem o port para PC de Grandia II Remaster, de 2015, anos antes de aplicarem a suavização HD no primeiro título para o lançamento de 2019. Veja uma comparação abaixo entre imagens de suas respectivas aberturas:

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A parte técnica de Grandia II realmente está mais precária, com efeitos sonoros ruins, sombras estranhas e engasgos — a animação de vitória de Ryudo sempre dá uma travada no mesmo momento. Grandia, por sua vez, sofre da tremulação de sprites quando a câmera se move, algo típico do primeiro PlayStation, mas que hoje em dia seria passível de correção.

Acho que já deu para entender que tudo o que Grandia HD Collection tem a oferecer são os dois títulos em estado jogável, com alguns altos e vários baixos causados tanto pela idade das obras quanto pela inaceitável falta de iniciativa para polí-las e modernizá-las segundo padrões mais atuais. Em resumo, esse lançamento agridoce é o que temos para hoje. Para os apreciadores de JRPGs que ainda não os jogaram, recomendo a dupla em qualquer versão disponível, até mesmo esta.

Jogo (versão de PS4) analisado no PS5 com código fornecido pela GungHo Online Entertainment.

Veredito

Grandia HD Collection precisa ser enxergado por dois ângulos. Como jogo, traz duas excelentes e carismáticas aventuras com um dos melhores sistema de combate por turnos em JRPGs, altamente recomendadas para quem curte o estilo. Como coletânea para relançar jogos antigos, porém, apenas o mínimo do mínimo foi feito, sem extras nem melhorias de qualidade de vida. Mesmo com o importante passo de trazer os jogos para mais plataformas atuais, essas versões apresentam falhas técnicas e passam longe de ser algo definitivo.

70

Grandia HD Collection

Fabricante: Game Arts / Sickhead Games

Plataforma: PS4

Gênero: 8,28 GB

Distribuidora: GungHo Online Entertainment

Lançamento: 26/03/2024

Dublado: Não

Legendado: Não

Troféus: Sim (inclusive duas Platinas)

Comprar na

Veredict

Grandia HD Collection needs to be seen from two perspectives. As a game, it features two excellent and charismatic adventures with one of the best turn-based combat systems in JRPGs, highly recommended for anyone who enjoys the style. However, as a collection to relaunch old games, only the bare minimum was done, without extras or quality of life improvements. Even with the important step of bringing the games to more current platforms, these versions have technical flaws and are far from being definitive.