Watch Dogs é um dos melhores jogos do ano. Essa afirmação poderia ser verdade se alguns problemas não existissem. O primeiro e mais importante de todos eles é o hype. Essa sensação exagerada criada por um marketing bem feito é uma das coisas mais prejudiciais ao mercado de games atualmente. O jogo é muito bonito, com ideias interessantes e cenas muito bem produzidas, mas se compararmos com o vídeo de demonstração da E3 de 2013, sabemos que não é bem assim.
Talvez o mais importante aqui seja pensarmos no jogo como uma nova franquia. Seja pelo enorme número de vendas ou pela própria história, sabemos que existirá uma continuação. O jogo oferece inúmeras possibilidades para um possível retorno, seja de forma direta ou não. Seria possível uma série ligada atráves de certos pontos comuns, como na série Assassin’s Creed¸ ou de maneira antológica, em que cada jogo contaria a história de um novo “vigilante”, com seus próprios motivos e incentivos. Independente do que vá acontecer, sabemos que o nome Watch Dogs ainda será ouvido por muitos anos.
A história conta eventos que ocorrem na vida de Aiden Pierce, um hacker que se envolve em diversos problemas e acaba sofrendo uma grande perda. Isso impulsiona toda a trama e, em busca de vingança, todos os eventos do jogo se entrelaçam. Com suas habilidades de hacker, ele se infiltra no submundo de Chicago e descobre como uma companhia chamada Blume Corporation está envolvida em todos os tipos de crimes através de seu sistema operacional interligado, CtOS. Aiden se torna um vigilante, que consegue ligar a sua vingança à queda da corporação.
Por mais que soe clichê, a história de Aiden é bem contada. A sua relação familiar, suas preocupações, o modo com que ele lida com os outros personagens… Tudo serve para mostrar que ele é apenas um cara com problemas comuns. Acho que a ideia principal do jogo era mostrar como alguém pode adquirir uma nova personalidade quando seus entes queridos são ameaçados. Aiden é capaz de matar pela sua família e, pelo menos para mim, isso não é pouca coisa.
A história também conta com personagens coadjuvantes bem construídos e que muitas vezes despertaram a minha curiosidade. Queria saber muito mais sobre a vida de Clara e Jordi, por exemplo. São personagens muito bem feitos e que têm papéis fundamentais e muito bem estabelecidos dentro da narrativa. Um deles, T-Bone, ganhou até a própria expansão, contando sobre um determinado episódio após os eventos do jogo principal.
Sobre a questão dos gráficos, vou avaliar apenas a minha experiência com o título, tentando deixar de lado os vídeos de gameplay incríveis que vi antes. Bioshock Infinite também teve mudanças enormes no gameplay ao longo dos anos e ainda é um dos jogos favoritos da minha vida. É óbvio que o jogo não é tão lindo como o esperado, mas está longe de ser feio.
Os gráficos de Watch Dogs no PlayStation 4 são muito bonitos. É um jogo com ideias legais e com uma cidade bastante interessante e rica. São muitos detalhes e por muitas vezes penso que possui mais atividades secundárias do que os jogos da série Grand Theft Auto. Mas confesso que, comparado com GTA V, o jogo deixa bastante a desejar. Problemas como queda de frames e física quebrada fazem com que muitas vezes se desanime um pouco.
A parte sonora também tem seus lados negativos. Alguns efeitos parecem um pouco estranhos e fora de lugar. A trilha sonora licenciada não é das melhores e a quantidade de músicas é pequena, apesar de algumas poderem ser adquiridas hackeando outros smartphones ou ouvindo em lugares públicos e baixando através de um aplicativo. Uma coisa incrível é poder ouvir músicas fora de veículos e poder escolher a faixa, por não se tratar de uma rádio, mas de um reprudutor de músicas. Ainda assim, acho que poderia ter a opção de costumizar a própria trilha sonora. Já a trilha original, que acontece em momentos de ação e durante missões, é bem feita e se encaixa muito bem.
No entanto, a coisa que mais odiei em Watch Dogs foi a direção dos veículos, que é péssima e, comparada com outros jogos de mundo aberto e de corrida, chega a ser ridícula. Existem várias habilidades que podem ser adquiridas para melhorar o desempenho no volante, mas mesmo com todas elas, é uma situação desagradável. Depois de algumas horas é possível “dirigir bem”, mas mesmo assim é algo muito chato. Escapar da polícia não depende da sua habilidade no volante, e sim da habilidade de hackear semáfaros ou bloqueadores de rua. É até interessante no começo, mas para alguém que adora dirigir em jogo e já passou algums boas centenas de horas jogando jogos de corrida, chega a ser deprimente.
No entanto, o grande trunfo do jogo e o carro-chefe da franquia é a habilidade de hackear. É um mundo cercado de tecnologia e nada está isolado. Aiden é capaz de ver seu nome, sua profissão, seu tipo sanguíneo, sua conta bancária, suas doenças. Tudo isso através de seu smartphone – apenas se aproximar de alguém é suficiente. Ele usa a própria rede interligada da cidade contra ela mesma, e isso é incrível. A sensação de hackear é muito boa. Ao longo do jogo, a extensão do seu “poder” é aumentada e o que no começo era hackear celular e semafáros, torna-se desligar a energia de bairros inteiros e incapacitar helicóperos no ar.
Dito isso, é possível notar que o jogo tem seus altos e baixos. Muitas ideias funcionam – e muito bem –, outras, nem tanto. As sessões de stealth são bem chatas e os controles não ajudam. Seguir pessoas e carros é interessante, mas muitas vezes fui interrompido por problemas ridículos de AI falha. A empresa ainda não entendeu que perseguir inimigos não é sempre a melhor opção. Mas, ao mesmo tempo, hackear é extremamente divertido e intuitivo, assim como explorar a cidade e adquirir novas habilidades.
O sistema de experiência é bem completo e permite que você crie um personagem que atenda melhor as suas necessidades logo no começo. Todas as missões secundárias geram novas recompensas também, como novas armas, habilidades e veículos. A lista de troféus também é bem interessante e garante muitas horas de jogo até que seja completada.
As missões secundárias são bem distintas e existem muitas coisas para se fazer em Chicago. Encontrar gangues, impedir crimes, perseguir ladrões, jogos de bebedeira, realidade virtual, pôquer, e o mais importante: as drogas virtuais. Esta é uma das partes mais diferentes e divertidas do jogo. São 5 drogas diferentes (1 adquirida via DLC), completamente díspares do resto do jogo e que são basicamente jogos próprios, com sua própria árvore de habilidades, objetivos a serem completados e mecânicas.
Em Madness, você controla um carro, estilo Vigilante 8 e a cidade está tomada por diversos demônios. Já em Epic Spider-Tank, você controla uma aranha robô gigante e precisa destruir diversos inimigos, completando objetivos. A aranha pode escalar prédios e pular enormes alturas. É sem dúvida a minha missão preferida. Alone é focada em stealth e Aiden deve desligar diversos geradores para que a cidade volte ao normal. Em Psychedelic, você cai de uma enorme altura e deve ir controlando Aiden para que ele vá batendo em diversas flores gigantes ao som de músicas psicodélicas. E Conspiracy! – adquirida como DLC – conta com ciborgues escondidos no meio da população, cabendo a você encontrá-los e matá-los usando seu olhar cibernético. Cada uma é bem diferente do estilo do jogo principal e são muito boas para passar o tempo.
O modo multiplayer é no estilo de Dark Souls, em que outros jogadores invadem a sua partida. O outro personagem invade o seu mundo e tenta hackear você. Para isso ele precisa ficar próximo, mas se manter escondido. É bem emocionante em alguns momentos e encontrar o hacker é geralmente uma tarefa difícil. Invadir o mundo dos outros também não fica muito atrás e fiz isso diversas vezes. Existem outros modos multiplayer, como corridas online, mas não são nem de perto interessantes como as de hackeamento.
Existe também um modo que utiliza o aplicativo para Android e iOS, em que você joga como a força policial e o jogador no console tenta escapar ileso. Esse modo é bem interessante, mas tive alguns problemas de conexão e estabilidade. Testei em outros smartphones e os problemas persistiram. Talvez tenha sido alguma falha na conexão da internet ou do próprio jogo, mas vale a pena experimentar o modo.
Watch Dogs é um jogo ambicioso, mirou muito alto e não teve forças para chegar lá. Mas isso não significa que suas ideias não tenham sido boas. Algumas mecânicas interessantes e outras mal implementadas o tornam um jogo divisivo: alguns odeiam e outros gostam. Minhas horas em Chicago foram bem interessantes e eu, com certeza, voltaria lá para uma nova viagem – ou para qualquer outra cidade! Eu particularmente gostei de Aiden Pierce e não acho que ele seja um personagem vazio, mas um personagem simples. Antes de dizer que o jogo é ruim, acho que é necessário tentar conhecer o que realmente acontece e tentar deixar o hype um pouco de lado. Por fim, deixo a dica de que todos experimentem o título, porque é realmente um jogo que você só sabe se gosta quando jogar.
Veredito
Watch Dogs é um jogo que comete muitos erros, mas ao mesmo tempo, muitos acertos. Mecânicas mal implementadas muitas vezes sobrepõem ótimas ideias, fazendo com que elas pareçam inúteis. Mas olhando o jogo como o primeiro de uma futura franquia de sucesso, acho que o esforço foi válido. Existe conteúdo suficiente para manter o jogador preso por muitas horas e o modo multiplayer também agrada. Espero que o próximo jogo da franquia consiga encontrar a sintonia perfeita para um jogo de ação de mundo aberto.
Jogo analisado com cópia digital adquirida na PlayStation Store americana.