Silent Hill: Downpour

Perdoem o trocadilho, mas acredito que o gênero Survival Horror não sobreviveu à mudança de geração. Jogos antes centrados em atmosfera e sobrevivência estão cada vez mais raros, com franquias originalmente voltadas ao horror focando-se cada vez mais em ação. Não entendam mal – eu adoro Dead Space e Resident Evil tanto quanto qualquer outro, mas eu realmente sinto falta de um jogo com munição escassa, atmosfera sombria, puzzles bizarros e uma mapa menos linear. Eis que temos em mãos Silent Hill: Downpour (Downpour).

 

 

Desenvolvido pela relativamente desconhecida Vatra Games, Downpour conta a história de Murphy Pendleton, um criminoso preso por motivos desconhecidos. No início do jogo, Murphy é transferido para outra prisão, mas o ônibus que o trasnporta sofre um acidente e cai de uma rodovia. Praticamente todos os passageiros morrem, mas Murphy continua vivo. Seguindo um caminho e procurando ajuda, Murphy eventualmente chega em Silent Hill. Desnecessário dizer, a partir daí o inferno está solto e Murphy precisará lutar pela sua sobrevivência.

 

Eu sempre gostei do enredo de Silent Hill (SH). Independentemente dele abordar problemas pessoais (SH2), problemas locais (The Room) ou catástrofes com possíveis repercussões mundiais (SH3), um dos pontos mais fortes de SH sempre foi seu enredo bem conduzido, interessante e povoado por personagens carismáticos ou, no mínimo, relatáveis. É justamente por isso que, a despeito de qualquer bug ou problema gráfico, o maior pecado que Downpour faz é não ter uma narrativa suficientemente forte para envolver o jogador.

 

Não é que o enredo seja ruim – a história é boa e tem um bom ritmo, não tenho o que reclamar. Meu problema fica mais com os personagens e a forma como eles são explorados. Tomemos Murphy como exemplo. Embora ele seja um personagem interessante, é difícil o jogador se relacionar com ele. Boa parte da trama advém do fato de você não saber o que Murphy fez ou deixou de fazer, então na maior parte do tempo ele é um personagem "em branco". Tão em branco, na verdade, que todo o enredo muda de acordo com o final obtido, o que não faz sentido e gera dificuldades para fazer de Murphy um personagem bacana. Grande parte do elenco de apoio também é subutilizado e não é tão interessante como deveria ser.

 

 

O que leva o jogador a prosseguir, mais que a própria história, são so ambientes. Silent Hill é explorável em Downpour, e a cidade está magnífica. A atmosfera aterradora e a tensão são constantes, impulsionadas pelo excelente design da cidade maldita. Os prédios, as pixações, as palavras bizarras, a chuva aleatória – tudo é muito bem feito, e merece os parabéns por fazer o jogador se sentir frágil e isolado. O Otherworld é espetacular em sua construção. As "máquinas vivas", a água constante… em termos de atmosfera, Downpour esbanja qualidade.

 

O mesmo, infelizmente, não pode ser dito dos inimigos. Com design sem graça, eles pouco refletem a psiquê de Murphy, e não assustam. Inimigos como o Screamer são construídos com texturas estranhas e de resolução baixa, enquanto os Prisoner Minions praticamente possuem "genérico" cravado em seus polígonos. Particularmente, gosto bastante das Dolls e Weeping Bats, mas não são nada espetaculares. O inimigo de maior destaque fica por conta do Wheelman, bizarro e assustador como deveria ser. Já o Bogeyman… *sono*.

 

 

Explorar Silent Hill é divertido (e assustador), e o jogo está lotado de side-quests, das mais simples às mais macabras. Os puzzles voltam com força em Downpour – são bem feitos e saciam a vontade de jogar algo mais cerebral do que os jogos de horror mais recentes. A água é um elemento central do jogo, e está de forma abundante (e muito bem feita, por sinal) em Downpour. Enquanto você explora Silent Hill, o clima pode passar da névoa comum à cidade para uma chuva torrencial – essa chuva indica que os inimigos estarão presentes em maior número e serão mais agressivos, então sua melhor opção é procurar algum abrigo para se proteger.

 

O combate de Downpour é uma benção e uma maldição – gostar dele dependerá unicamente se você acha que um personagem de Survival Horror tem que ser frágil ou não. O combate do jogo é focado primariamente em corpo-a-corpo, com poucas armas de fogo espalhadas pela aventura. Com armas de fogo, o jogo segue uma tradicional visão sobre o ombro, com uma pequena retícula indicando o local do seu tiro, e os momentos em que você tem uma psitola ou outro projétil em mãos são os que você se sente mais seguro em Downpour. Ficar de frente e próximo ao inimigo, por outro lado, é sempre tenso, e em Downpour os inimigos são inteligentes – não adianta atacar impensadamente, já que eles bloqueiam e contra-atacam frequentemente. O combate melee de Downpour exige mais estratégia, especialmente porque suas armas se degradam com o uso e você não pode carregar mais de uma de cada vez. Isso gera um contraste interessante, em que você pode muito bem ter a munição e simplesmente não dispor da arma de fogo, por exemplo. Sua melhor opção, na maioria das vezes, é fugir.

 

 

O "problema" do combate é que ele é um tanto quanto truncado. Murphy não se move com tanta agilidade e um pouco "pesado", enquanto os inimigos são bem mais rápidos e agressivos que em outros jogos da série. Combates contra inimigos isolados não costumam dar muitos problemas, mas é só ter 2 ou mais na tela e você estará lutando para sobreviver. Numa perspectiva de que combate é o último dos recursos em um Survival Horror e que você estará mais bem servido fugindo do que lutando, o combate é ótimo por criar ainda mais atmosfera. Se, por outro lado, você é parte da escola Resident Evil 5 de "mate-tudo-com-fogo", o combate será um empecilho à diversão.

 

Outro empecilho à diversão são os bugs. A quantidade de bugs em Downpour é quase desconcertante. Portas, inimigos, itens… praticamente tudo pode sofrer de travamentos inexplicáveis e impedir o jogador de continuar. Além dos bugs, Downpour sofre ainda um pouco na parte gráfica. Os gráficos do jogo são agradáveis (nada espetaculares, mas ainda assim bons, com ótimos efeitos de névoa e luz), mas são pouco otimizados – pop-ups, texturas que demoram a carregar, slowdowns inexplicáveis, inventário mal organizado e loadings em lugares incômodos, além de outros -, e Downpour necessita urgentemente de um patch.

 

 

As músicas, por outro lado, merecem um destaque especial. Akira Yamaoka, famoso por suas composições para SH, não fez a trilha sonora de Downpour, sendo substituído por Daniel Licht. Isso por si só fez muitos fãs virarem o nariz, e quando foi anunciado que a música-tema do jogo viria da banda Korn… bem, vocês podem imaginar a "alegria" dos fãs. Podem ficar tranquilos – a música do Korn só toca na abertura (quando você deixa o jogo no menu inicial sem apertar nada), e Dan Licht faz composições dignas de Yamaoka. De fato, Licht consegue emular o antigo compositor de forma surpreendente, com banjos, harpas e violinos criando músicas bonitas e aterrorizantes, e em momentos eu quase tive dúvidas se estava ouvindo músicas de Licht ou de Yamaoka. As músicas são excelentes, embora a dublagem seja apenas boa.

Desde que a produção de SH deixou de ser a cargo do Team Silent, os fãs sempre esperam que a nova iteração seja um retorno à gloriosidade dos 3 primeiros jogos. Minha opinião é a de que ainda não, mas parece que a série finalmente retomou o rumo. Downpour tem suas falhas, mas acredito firmemente que esta é a direção geral certa para a série seguir – a evolução natural que Homecoming e Shattered Memories deveriam ser e não foram. Downpour ainda não é o retorno triunfal da série pelo qual os fãs têm esperado, mas os elementos para se fazer um grande SH estão aqui.

No fim das contas, Downpour pode ser decepcionante para quem esperava algo à altura de SH2 e SH3, mas é um jogo competente e verdadeiramente "Survival Horror", que deverá agradar os fãs tanto de Silent Hill quanto do gênero como um todo. Vale a pena conferir.

 

— Resumo —

+ Atmosfera matadora.
+ Músicas excelentes.
+ Puzzles, enfim!.
+ Tensão constante.

 

Combate truncado.

Uma quantidade fenomenal de bugs.
Enredo e personagens inconsistentes.
Monstros sem inspiração.

 

Veredito

75

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