Persona 5 Tactica – Review

Mesmo ainda estando relativamente pouco tempo após o seu lançamento, Persona 5 talvez já possa ser considerado um dos JRPGs mais importantes e influentes de todos os tempos. Certamente um dos mais importantes da última década. E, embora eu tenha minhas restrições em relação a alguns pontos do original, não há pontuações suficientes que eu possa fazer sobre o último terço do jogo que vá mudar isso.

É inegável também que a Atlus sabe como surfar na onda do sucesso das suas franquias, vide a já considerável quantidade de spin-offs vistas durante o seu aumento em popularidade com o lançamento original Persona 4 Golden e tudo que isso rendeu no PS3, PS Vita e Nintendo 3DS. E se aquele título já rendeu seus três spin-offs, imagina então o imensamente popular P5 (e sim, tecnicamente são quatro, se considerarmos Persona Q2 que também é um spin-off de P5, então as coisas ficam complicadas).

E se um dungeon crawler e um jogo de ritmo já não eram suficientes, muito menos o primeiro RPG de Ação da série, era hora de inovar em mais um gênero, entrando em ação Persona 5 Tactica, o spin-off levando a franquia pela primeira vez para o universo dos RPGs Táticos. E uma estreia que, como já era de se prever, foi feita com um nível de cuidado e maestria que poucas desenvolvedoras no mundo tem e se tornou a marca da Atlus.

Dessa vez nós temos os queridos Phantom Thieves prestes a encerrar o ano letivo, lembrando e pensando nas experiências vividas ao longo do último ano quando a porta de saída do Café Leblanc se torna uma porta misteriosa com um estranho símbolo gravado. Como sempre, sem pensar muito, os heróis decidem checar o que está acontecendo e se veem em um local totalmente novo e desconhecido do Metaverse.

Logo eles são confrontados pela estranha mente por trás desse local, a tirana Marie que é obcecada por adoração e vem subjugando o povo desse local (que eles logo descobrem ser chamado de Kingdom) para fazer o que ela bem entender. Após quase todos serem capturados, Joker e Morgana decidem unir forças com Erina, a líder do único grupo lutando contra Marie, a Rebel Corps, para resgatar seus amigos e acabar com os planos de Marie.

Ao longo dessa jornada, os heróis precisarão não só descobrir como vencer Marie e seu exército de Shadows, mas também explorar a própria natureza dessa nova manifestação do Metaverse. Afinal, com seus poderes bastante reduzidos, impossibilitados de voltar para casa e até mesmo as capacidades de uma certa amiga da Velvet Room sendo afetadas, as coisas começam a se complicar, especialmente quando eles descobrem que o Kingdom de Marie não parece ser o único.

Falar mais do que isso sobre a história talvez já nos coloque em um perigoso território de spoilers mas saiba que, se você é fã do jogo original, Persona 5 Tactica entrega muito da mesma qualidade narrativa, só que num pacote um pouco mais direto. Isso significa que, embora o jogo não dure as mais de 100 horas que você pode facilmente conseguir em Persona 5 ou Persona 5 Royal, ele ainda traz a mesma qualidade de escrita e narrativa vista lá.

Aqui temos diálogos mais concisos, sem momentos tão verborrágicos de exposição de todos os personagens envolvidos. Dito isso, cada um dos membros dos Phantom Thieves tem sua chance de brilhar e acrescentar ao jogo, por mais que as estrelas aqui sejam Joker e Erina. O mistério por trás de quem ela é e como ela pode ter passado a vida toda naquele lugar é muito bem explorado e o jogo acerta muito bem na hora de apresentar novos cenários e novos antagonistas para conseguir manter a escalada de ameaças sempre funcional (e evita se perder como, pra mim, acontece no último ato do jogo original).

Até por essa natureza um pouco mais concisa, os outros membros do grupo acabam ficando um pouco mais de lado aqui. Eles ainda fazem pontuações importantes e ajudam a mover o plot, especialmente Morgana como já é de se esperar, mas justamente essa nova dinâmica ajuda a tornar personagens que eu pessoalmente não tinha muita afinidade mais interessantes e, ao mesmo tempo, dá espaço para que os demais sigam brilhando.

Embora não reinvente a roda nem nada do tipo, a confluência do notoriamente carismático grupo de personagens de Persona 5 com uma nova história que traz algo novo para eles explorarem dentro de um cenário ainda não explorado e uma nova personagem que adiciona a dinâmica entre eles e cuja amizade com os heróis vai sendo bem construída graças aos seus próprios atos de heroísmo, faz com que a história aqui seja excelente. Dito isso, ela espera que você tenha jogado pelo menos o jogo base, já que ele não gasta um segundo sequer explicando quem são os Phantom Thieves ou porquê algumas figuras apresentadas ao longo do jogo não são muito fãs deles.

Uma coisa que é importante apontar aqui é que, embora não existam Social Links aqui, o jogo conta com um sistema próprio de diálogos extras (aptamente chamado de Talk) no menu na sua base, então existem alguns bons diálogos secundários que não só te dão pontos usados para melhorar suas árvores de habilidade, mas ajudam a expandir a dinâmica dentro do grupo.

Falando nisso, cabe dizer que não há qualquer tipo de exploração livre aqui. O jogo segue uma estrutura de missões bem direto, com o jogador retornando ao Café Leblanc após cada missão e lá podendo se preparar para o combate, ver cenas de diálogo secundárias, acessar a Velvet Room para cuidar das suas Personas e armas,concluir missões secundárias, rejogar missões da história ou avançar nela. É tudo bem simples e direto, mas bastante funcional e especialmente adaptado para quem não tem tempo para dedicar a longas sessões de jogo já que cada missão é bem curta.

Falando sobre o combate, talvez seja estranho dizer que é a primeira experiência da série com o gênero, mas isso se dá por ele não trazer muito do DNA que inspirou Shin Megami Tensei:Devil Survivor, por exemplo. A melhor forma de estabelecer suas expectativas aqui em relação ao gameplay seja ignorar um pouco o nome do jogo. Ao longo dos anos, a indústria se habituou a chamar de “tactics” (ou alguma variação disso) todo e qualquer jogo inspirado por Final Fantasy Tactics. Apesar do nome e embora traga alguns resquícios de jogos clássicos do gênero, Persona 5 Tactica é muito mais inspirado em uma recente reimaginação do gênero, os dois excelentes jogos da sub-série de spin-offs Mario + Rabbids.

Isso significa que o mapa não é necessariamente dividido em quadrantes como um tabuleiro de xadrez ou dama, com os personagens tendo liberdade para se mover pela área, por mais que no fim eles tenham que ficar parados em um quadrado (se você não jogou Mario + Rabbids, é basicamente como funciona em XCOM). Isso te permite se colocar em um dos pontos mais importantes da dinâmica do combate: cobertura.

Ao contrário dos jogos anteriores (sejam os RPGs por turnos normais ou o spin-off Persona 5 Strikers) em que se usava a arma de fogo para explorar fraquezas e abrir espaço para ataques físicos poderosos, a dinâmica aqui é exatamente inversa. A maior parte dos seus ataques é feito usando as armas de fogo dos seus personagens (tanto que não é nem possível melhorar sua arma branca), dando uma importância fundamental a sempre se posicionar em cobertura, seja ela parcial (que reduz o dano sofrido) ou completa (que bloqueia o ataque inimigo).

Isso não quer dizer que o combate corpo-a-corpo não tenha seu lugar. Aqui ele é basicamente usado para tirar inimigos da cobertura, jogando-os para a posição mais vulnerável possível: em pé no meio das arenas. É aqui que vemos outro elemento da série, já que ao atacar inimigos nessa situação você ativa o sistema de turnos extras do jogo, o chamado “1 More”. Ao derrubar inimigos assim não só você os deixa mais vulneráveis aos ataques dos demais, mas é possível também usar a versão de P5T para os famosos All-Out Attacks, aqui chamados de “Triple Threat”.

Esses ataques devastadores são bem simples de se usar e te permitem usar um poderoso golpe conjunto contra todos os inimigos dentro de um triângulo desenhado ligando os três membros da sua equipe. Esses ataques só podem ser ativados pelo membro da sua party que estiver no 1 More, então é necessário explorar as fraquezas dos inimigos, incluindo aí usar suas Personas para usar magias, buffs e debuffs e o sistema de Charge que traz efeitos especiais aos seus personagens por não atacarem em um turno. Se, ainda assim, algo não der certo, não se preocupe, pois qualquer aliado derrotado em batalha poderá ser substituído por um membro em standby através do Baton Pass.

Talvez a única reclamação que possa ser feita é que Persona 5 Tactica é um jogo relativamente bem fácil para os fãs mais veteranos do gênero. Apesar de trazer várias opções para o combate, eles são bem diretos e rápidos de se entender e até mesmo as batalhas com chefes não são muito desafiantes. As únicas missões que realmente te fazem pensar bastante são as missões secundárias, mas mais por agirem como pequenos quebra-cabeças dado a pequena quantidade de turnos para completá-las do que dificuldade em derrotar os inimigos (dito isso, elas são muito bem pensadas e divertidas).

Um diferencial que o jogo traz é que dessa vez todos os membros da sua equipe podem equipar uma Persona secundária. Isso se dá porque aqui elas são bem menos poderosas, cada uma possuindo duas habilidades, uma padrão e outra herdada na fusão, o que faz também com que o Joker não seja tão fundamental em combate (já que normalmente só o protagonista pode usar múltiplas personas). Cada personagem possui também uma habilidade única e, quando não estão em combate, começarão a próxima luta com um bônus, havendo bastante incentivo para rodar sua equipe e manter todo mundo sempre avançando.

O sistema de progressão do jogo, aliás, é bem interessante. Cada personagem possui uma árvore de habilidades e é possível ir gastando pontos de GP nela para destravar melhorias para eles. Elas vão de efeitos especiais no Charge, aumento no poder das suas habilidades ou efeitos especiais quando o Triple Threat é ativado,então é possível ir ajustando cada personagem do jeito que você melhor preferir.

Alusões foram feitas, mas cabe dizer que a Velvet Room retorna também um pouco diferente. Naturalmente, aqui é possível fundir personas ganhas em combate (após cada batalha, ao completar objetivos secundários, você ganha engrenagens douradas que podem ou desbloquear uma persona ou te dar EXP caso você já a tenha), desmontar ou fundir armas. É algo mais simples, mas bem funcional e é fundamental manter sua equipe sempre com os melhores equipamentos possíveis.

Por fim, cabe dizer que, apesar de não ser tão bonito e estiloso quanto o jogo original, a adoção de um estilo mais chibi pros personagens é bem legal e funciona. O visual diferente é bem agradável e ajuda na dinâmica do combate e os cenários são bem legais. A trilha sonora é um show à parte, por mais que já seja algo que se espera de um título da franquia, sempre com suas músicas excelentes.

No geral, Persona 5 Tactica é um excelente RPG Tático e traz bastante coisa bem divertida para o gênero, por mais que não seja uma grande reinvenção dele. A questão da dificuldade, que é meu maior problema com o jogo, é muito sintomático do jogo querer ser mais acessível para potenciais fãs da franquia que não o conhecem, então é algo que se consegue relevar porque eu ainda me diverti muito com o jogo.

Portanto, se você é um fã de longa data de Persona ou especificamente Persona 5, há muito a se aproveitar aqui já que temos mais uma excelente experiência com o ótimo elenco de personagens, uma narrativa excepcionalmente construída e um divertido sistema de combate amigável a novatos do gênero que com certeza terão seus corações roubados pela maravilha que é um RPG Tático de tanta qualidade.

Jogo analisado no PS5 com código fornecido pela Atlus.