A menos que eu esteja bastante enganado, acredito que o que temos com a série Mass Effect (ME) é algo sem precedentes. Não é a primeira vez que uma história se estende por três jogos para criar uma saga épica, mas esta é a primeira vez que que o jogador influencia a conclusão do enredo de forma tão direta, muitas vezes com escolhas feitas há quase 5 anos. ME3 é o último capítulo da história do Comandante Shepard, e é um jogo que se destaca não apenas pela forma com que seu enredo progride – ME3 pega as melhores partes de cada um de seus antecessores e combina estes elementos com algumas ideias novas, com resultados excelentes.
Resumir os acontecimentos da saga até ME3 não é fácil – e honestamente, dada a forma como ME1 e ME2 influenciam ME3, a melhor maneira de saber sobre esses dois jogos é simplesmente jogando-os. A premissa básica deccore dos eventos de Arrival, o último DLC de ME2. Shepard destruiu um Mass Relay para atrasar a invasão dos Reapers – máquinas inteligentes avançadíssimas que têm como propósito a extinção da raça humana -, no processo destruindo um sistema inteiro e matando m ais de 400 mil seres vivos. Na Terra, Shepard está sob custódia, à espera do julgamento pelo seu “crime”, quando a inevitável invasão Reaper – que Shepard vem avisando a galáxia inteira desde ME1– acontece.
Com a humanidade subjugada, cabe a Shepard procurar auxílio com as outras raças do universo. É uma busca desesperada por ajuda contra um inimigo vastamente superior, não só de Shepard e a humanidade, mas de todos os seres vivos do universo – nada menos que o famoso “lutem juntos ou morram juntos”. A sensação de urgência do enredo é constante e não abandona o jogador nem mesmo nas side quests. O script é afiado como sempre, e o eventos são carregados de emoção sem tender para o lado excessivamente melodramático, mantendo a qualidade que viemos a esperar da Bioware nesse departamento.
“Escolha” sempre foi a palavra-chave de ME, e ME3 não foge à regra. O número de escolhas importantes parece ser menor que nos dois jogos anteriores, ams elas certamente são de um dilema moral muito mais pesado e com consequências mais drásticas. Não são escolhas tão “fáceis” quanto decidir quem vive entre Kaidan e Ashley, e sim eventos que, caso tenhamos um novo Mass Effect, podem alterar radicalmente todo o universo criado pela Bioware. Não existe opção”certa” e “errada”, apenas a sua convicção.
Para auxiliar neste ponto, temos o sistema de Reputation. A barra de Reputation é uma função agregada à dualidade Paragon (idealista que coloca o sentimento humano acima de tudo) e Renegade (soldado impiedoso que cumpre sua missão a qualquer custo) que evita a adoção de uma posição unilateral para suas escolhas e abre mais o “role-play”. Explico: em ME1 e ME2, você ficava “preso” às suas escolhas de Paragon e Renegade. Você poderia perder opções de diálogos de um ou outro caminho, o que induzia o jogador a se manter em apenas uma das moralidades ao invés de encarnar o “o que eu faria nessa situação?”. Em ME2, por exemplo, você poderia ter situações de instabilidade com Tali e Legion e Miranda e Jack, e as opções para resolução pacífica dos conflitos poderiam ser perdidas caso você não tivesse pontos suficientes de Paragon ou Renegade.
Em ME3, as opções de diálogos especiais dependem unicamente de seu Reputation, que nada mais é do que a soma de seus pontos Paragon e Renegade. Assim, mesmo que sua proporção de Paragon seja muito maior que a de Renegade, você não fica impedido de escolher os diálogos especiais de Renegade. Em um jogo que depende tanto de sua capacidade de fazer uma narrativa convincente, esse pequeno detalhe por si só torna suas escolhas mais naturais, e consequentemente, a história é mais agradável de se mergulhar.
Ao inciar um jogo novo, você poderá editar a aparência do seu/sua Shepard, bem como escolher uma classe de combate. Essa opção está aberta mesmo para aqueles que importarem um personagem de ME2, ou seja, se você terminou ME2 como Infiltrator, pode muito bem escolher Adept em ME3. O novo level máximo é 60, e você carrega toda a experiência adquirida em ME2 – portanto, se você importar um personagem level 30, já estará bem avançado no jogo. As classes são basicamente as mesmas do jogo anterior, com uma ou outra mudança na funcionalidade de seus poderes (o Tech Armor do Sentinel, por exemplo, não mais explode automaticamente com a depleção de seus escudos, e precisa ser detonada manualmente) e acréscimo de algumas habilidades. A grande mudança em relação a ME2 fica por conta das armas.
As armas agora não são mais restritas às classes, então você pode equipar seu personagem como bem entender. Há, porém, um detalhe: cada classe conta com um certo valor de “Weight”, ou “peso”, que nada mais é que a carga máxima que seu personagem consegue carregar. O peso influencia diretamente a velocidade de recarga dos seus poderes, com personagens leves ganhando um bônus de até 200% de velocidade e os mais pesados com 200% de prejuízo. Assim, embora você teoricamente possa carregar uma arma de cada classe, há de se levar em conta se o excesso de peso pode prejudicar a forma como você joga. Da mesma forma, um arsenal mais limitado pode ser compensado pela alta velocidade com que você pode suar seus poderes.
Seu arsenal, aliás, é um tanto mais variado que em ME2, e conta novamente com as modificações que existiam em ME1, aumentando o leque de opções e estratégias para os combates. O combate em geral é mais rápido e flui melhor que em ME2, além de contar com uma IA aprimorada dos inimigos. Muitos encontros do jogo são montados de forma a manter o jogador circulando pelo cenário em busca de opções de cobertura, com combinações de inimigos rápidos e que avançam diretamente sobre seu grupo (como Husks e Geth Hunters) pareados com inimigos mantém protegidos na distância (Marauders, Phantoms e Nemesis). Oponentes poderosos como Brutes e Banshees frequentemente são acompanhados uns dos outros ou por tropas menores, gerando sempre conflitos tensos. Seu número de parceiros disponíveis é bem menor que o visto em ME2, mas a variedade de combinações continua boa e você sempre tem opções para enfrentar os obstáculos.
A engine gráfica de ME3 já é conhecida pelos jogadores de PS3, por ter sido utilizada em ME2 no console da Sony. Não há nenhuma diferença singificativa no departamento gráfico em relação ao jogo anterior, o que não é algo ruim – ME2 era fantástico graficamente e ME3 não fica atrás. Os personagens, animações e texturas continuam muito bons, a paleta de cores é agradável e o jogo de luz é excelente. O design de fases é muito bom, e o dos personagens é nada menos que espetacular. Entretanto, o jogo ainda sofre de alguns pequenos percalços – um slowdown aqui, um defeito de colisão ali eum pop acolá, mas nada gritante e, felizmente, de forma muito rara quando em combate. Estes momentos são mais frequentes nas partes de exploração, em especial na Citadel, quando o frame-rate cai notavelmente dentro de algumas áreas.
A trilha sonora de ME3, por outro lado, é simplesmente impecável. As composições são de um bom gosto ímpar e contam talentos como Cris Velasco (cujo trabalho pode ser apreciado na série God of War) e Clint Mansell (mais famoso por seu trabalho no filme Cisne Negro). Do início ao fim, as músicas de ME3 nunca deixam de agradar e surpreender pela excelente qualidade, e é uma OST que definitivamente merece ser ouvida e apreciada. Por fim, pesos-pesados como Jeniffer Hale e Martin Sheen emprestam suas vozes aos personagens da saga espacial e completam o que é um trabalho de áudio excepcional.
ME3 se destaca de seus antecessores também por ter um modo Multiplayer. Este modo é cooperativo para até 4 jogadores online, e funciona como um “horde mode”, em que os jogadores devem trabalhar juntos para sobreviver a ondas cada vez mais difíceis de inimigos. O Multiplayer se acopla ao enredo por ser o principal determinante do Galactic Readiness, que indica a porcentagem dos seus recursos de guerra que poderão ser usados contra os Reapers na última batalha – afina de contas, se a galáxia está em guerra, isso significa MENOS recursos disponíveis para Shepard, não? O Multi funciona de forma semelhante ao single, e conta com várias classes e raças alienígenas para escolher. É um modo divertido e totalmente opcional – embora ele ajude com seu Galactic Readiness, você pode conseguir tudo em ME3 sem nem encostar no online -, tal e qual um Multi para um jogo focado em sua experiência single player deve ser.
Antes de encerrar a análise, temos ainda um ponto a tocar: o encerramento do jogo. O final de ME3 foi alvo de muitas críticas por parte dos jogadores, que o acusaram de “incompleto” ou simplesmente insatisfatórios. Discutir o final do jogo não é o nosso foco nesta análise, mas particularmente, enquanto eu compreenda as frustrações de tantos outros jogadores, a reação a ele foi desproporcionada. Não é (a menos que uma certa teoria que circula a internet seja verdadeira) um primor de final, mas está muito longe de ser o lixo completo que tantos acusaram.
Ademais, mesmo se o final fosse um lixo completo, não vejo como 20 minutos possam invalidar as centenas de horas que passamos com Shepard, Garrus, Liara e tantos outros. Como eu disse desde a análise de ME2, a beleza de ME está em seus meios, não em seus fins. ME3 é indiscutvelmente um jogo excelente, que seguramente figurará entre os melhores do ano.
— Resumo —
+ Enredo, personagens e script espetaculares.
+ Escolhas e consequências das mesmas.
+ Multiplayer bacana.
+ Trilha sonora impecável.
+ Ótimos gráficos.
+ Sistema de Reputation
– Final controverso.
– Pequenos deslizes gráficos.