Everhood: Eternity Edition – Review

Everhood parece uma ideia que já nasceu pronta. Eu imagino alguém jogando “Through the Fire and Flames” em Guitar Hero quando, em meio à enxurrada de notas, o pensamento de design reverso se intromete de repente: “E se, em vez de acertar as notas, tivéssemos que desviar delas? Taí, isso dá um jogo!”

Daí em diante, parece um fluxo natural. Na clássica pista de cinco faixas, os objetos descem do topo da tela no ritmo da música. Abaixo está o protagonista, evitando tudo em três movimentos: esquerda, direita e pulo. É como se a música do adversário o atacasse e a única maneira de vencê-la fosse acompanhar o passo, dominá-la pela dança. Em Everhood, dançar é lutar.

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Eu disse única maneira? Não, há outra. Você pode revidar, mas apenas quando tiver experiência para rebater seus passos ágeis de volta na cara do rival e mostrar que é ele quem não consegue acompanhar você.

Isso faz do protagonista um lutador na jornada heróica para superar todas as adversidades musicais, conquistar o merecido reconhecimento de suas habilidades e aprender algumas Verdades Absolutas.

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Espere, Verdades Absolutas? De onde veio isso? Não é à toa que o subtítulo do jogo é “Um conto inefável dos inexprimíveis momentos divinos da verdade”. Para que fazer uma simples história de herói esquivo dançando seu caminho até a vitória? Por que não viajar um pouco? Ou muito. Ah, vamos dar as mãos ao nonsense e abraçar o surrealismo de vez com imagens e personagens que pretendem mais evocar impressões e perplexidade do que fazer sentido concreto.

Recheie a receita com abstrações filosóficas sobre o tempo, a vida, a morte e a condição humana. Faça com que o poste de luz de salvamento converse com o protagonista. Faça com que “eles” conversem com o protagonista. Ou será que fala diretamente ao jogador? Espera, eles quem, um narrador onisciente? Um reflexo da consciência? Uma inteligência artificial em um jogo? Afinal, onde estamos?

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Tentar desatar os fios do novelo para encontrar significados em Everhood é uma tarefa tão vã quanto vasculhar pela essência de uma alucinação. Enquanto joga, aceite a loucura, abandone a o instinto humano de prender-se à razão e vasculhe aquela realidade lunática, sempre procurando o próximo desafio musical.

Para não dizer que não há uma âncora que impeça o jogador de ficar totalmente à deriva, há a história de Vermelho. É como o chamam, devido à cor da capa. Sendo um boneco de madeira, um dia ele acordou em pedaços, se recompôs e viu que um braço estava faltando. Com o canto do olho, percebeu para que lado foi o ladrão de membros.

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Vermelho seguiu pela floresta até a boate dominada pelo monstruoso Porco D’Ouro. O Azuladrão levou seu braço até o chefe suíno, mas não temos chances de enfrentar a criatura medonha. Atravesse a morte, leve o ladrão junto com você (o ex-chefe levou as pernas dele) e entre em várias pontas simpáticas que levam a lugares diferentes: um castelo amaldiçoado, uma pista de corrida, uma cidade tortamente rabiscada e por aí vai.

Aceite o sonho. Siga. Dance. Morra. Lute. Persevere. 

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Engana-se quem pensa que em Everhood a estética retrô de linhas coloridas sobre um plano preto é sempre minimalista. Ela é o ponto de partida simples que permite que a tela exploda em psicodelia pirotécnica para bombardear os sentidos de quem joga.

Para ter uma ideia, em um momento conhecemos um personagem cogumelo que pergunta se queremos uma experiência diferente, avisando que “as coisas podem ficar estranhas”prometendo que “as coisas podem… ficar estranhas”. O aviso surge na pista: “é hora de endoidar”, antes da tela entrar em um espelho curvo que distorce a noção espacial enquanto os perigos luminosos deixam rastros ao passar por você. Dê uma olhada no trailer e entenderá do que estou falando.

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Em termos de gameplay, você possui uma barra de pontos de vida que recebe dano sempre que é atingido. Ao perder tudo, a música volta ao começo. Não se preocupe, sua saúde regenera automaticamente, então você pode levar pancadas de vez em quando, contanto que não sejam contínuas.

O menu da derrota traz explícita a opção de mudar a dificuldade. Acima dele vem alguma mensagem reflexiva, como a que diz “É a jornada que importa, não o destino”. Entendi como um incentivo para manter a peleja e o aprendizado até superar a dificuldade, então resisti – mas só por alguns minutos! As músicas até começam tranquilas, mas depois evoluem para arranjos esmagadores que já são um desafio para entender o que está acontecendo na tela, ainda mais para ter reflexos para desviar!

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Logo mudei da dificuldade recomendada, a Difícil (“Deixa as vitórias satisfatórias. Você vai morrer”) para a Normal. E não demorou muito até eu ter que diminuir para o modo Fácil de vez em quando. Para quem precisar, há ainda o modo História.

Acontece que o design de dificuldade é muito diferente do que vemos nas inspirações. Em Everhood não há versões diferentes de cada música de acordo com a dificuldade selecionada. Nada muda na música em si, mesmo nos trechos de torrente implacável de notas. O que a seleção de dificuldade altera é a resistência do protagonista, aumentando sua velocidade de regeneração e até concedendo uma segunda chance.

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Penso que esse formato é ambivalente. Por um lado, reconheço que é uma maneira dos desenvolvedores tornarem o título mais acessível aos menos ágeis sem abrir concessões no design e desafio das músicas. Por outro, a ideia não favorece a curva de aprendizado na qual, idealmente, a pessoa que joga passaria por desafios que gradualmente exigem mais de seu aprendizado, absorção visual e memória muscular, conquistando mais patamares.

Foi por isso que preferi mudar a dificuldade já no terceiro duelo: a primeira metade era tranquila, mas o frenesi da segunda me aniquilava em poucos segundos, sem chances de realmente aprender alguma coisa em meio ao desespero. Afinal, a jornada realmente importa mais que o destino, mas cada um tem seu caminho. A minha trilha precisou de ajustes e isso não é um problema. Na verdade, eu queria que tivesse mais ajustes.

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Tá, mas a versão de PS4/PS5 tem subtítulo, não é? Por que é diferenciada como Eternity Edition? O jogo foi originalmente lançado para Switch e PC em 2021 e esta última plataforma tem entre suas vantagens a atuação da comunidade de jogadores na produção de mods.

Para trazer o título a mais consoles, a dupla de desenvolvedores incluiu no pacote uma seleção das melhores criações. São 16 novos desafios desbloqueados no menu principal à medida que se avança na campanha, incluindo músicas de veteranos da indústria, como a compositora Manami Matsumae (Mega Man, Shovel Knight), Keiji Yamagishi (Ninja Gaiden, The Messenger, Streets of Rage 4), Disasterpeace (Hyper Light Drifter, FEZ, Super Meat Boy) e o lendário David Wise (Donkey Kong Country)!

Jogo analisado no PS5 com código fornecido pela BlitWorks.

Veredito

Everhood: Eternity Edition traz às plataformas PlayStation intensos desafios de ritmo, boas músicas eletrônicas, história surrealista e muita psicodelia. Felizmente, opções de dificuldade ajudam a tornar essa viagem mais acessível aos que querem a experiência onírica sem sofrer (muito) com os reflexos exigidos. Pode não ser para todos, mas suas peculiaridades vão cair no gosto do público-alvo.

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Everhood: Eternity Edition

Fabricante: Foreign Gnomes

Plataforma: PS4 / PS5

Gênero: Aventura / Ritmo

Distribuidora: BlitWorks

Lançamento: 28/09/2023

Dublado: Não

Legendado: Sim

Troféus: Sim (inclusive Platina)

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Veredict

Everhood: Eternity Edition brings intense rhythm challenges, good electronic music, a surrealist story and lots of psychedelia. Fortunately, difficulty options help make this trip more accessible to those who want the dreamlike experience without suffering (too much) with the required reflexes. It may not be for everyone, but its peculiarities will surely appeal to the target audience.