Children of Zodiarcs

Uma das experiências mais marcantes que se pode ter é jogar um jogo cuja paixão por trás de seu desenvolvimento exala de cada detalhe dele. Desde os primeiros minutos, fica claro para o jogador o quanto Children of Zodiarcs, jogo desenvolvido pela Cardboard Utopia e publicado pela Square Enix Collective, foi feito por desenvolvedores apaixonados por RPGs, jogos de estratégia e jogos de tabuleiro, que buscaram consolidar essas paixões em um jogo só.

Uma das primeiras coisas que Children of Zodiarcs apresenta é o quão visualmente interessante ele é. Com um estilo artístico diferenciado, sua arte é muito charmosa e parece ter sido desenhada à mão, evocando bastante uma estética semelhante à que costumamos ver em jogos inspirados por artistas do mediterrâneo e oriente médio. Isso por si já bastaria para diferenciá-lo, mas é apenas a ponta do iceberg.

Children of Zodiarcs conta a história de crianças pobres e abandonadas nas favelas da cidade de Torus, que, para sobreviver, precisaram se juntar a uma gangue chamada The Family, e sobrevivem à base de migalhas dos Nobres, moradores do The District, o bairro rico e opulento construído sob as antigas ruínas de Torus. Esses Nobres enriqueceram com base nas relíquias chamadas Zodiarcs, pedaços de tecnologia remanescentes da chamada Age of Apex, uma era de enorme prosperidade que acabou em guerra, que possuem altíssimo valor e poder.

O jogador segue as aventuras de Nahmi, a mais talentosa das ladras da gangue, cujo objetivo principal é roubar relíquias e utilizar o lucro desses roubos para sustentar as crianças que perderam sua família e foram adotadas pela gangue. Apesar de jovem e relativamente inocente, Nahmi nutre um ódio gigantesco pelos Nobres e pelo mal que eles fizeram a sua família, sendo  este o principal combustível para suas ações.

Se CoZ conta uma história sombria e cativante, que tem como um de seus principais talentos o quanto ela consegue envolver o jogador ao fazê-lo sentir algo por todos os personagens, o seu principal chamariz e brilho estão no seu incrível sistema de combate que, não só entrega com primazia a promessa de integrar jogos de tabuleiros e RPGs de Estratégia, como provavelmente é o mais inovador dos últimos anos.

A primeira coisa que fica claro é que CoZ é um tradicional SRPG. O campo de batalha é visto de maneira isométrica, como na maioria dos jogos do gênero, e a movimentação é feita por um tabuleiro, reiterando a tradicional máxima de que posicionamento é a chave para qualquer vitória, em especial por CoZ reduzir o tamanho da party para 3 membros e constantemente te colocar contra grupos de 10, 20 inimigos de uma vez só, sendo fundamental calcular os movimentos com 2 ou 3 turnos de antecedência.

Onde Children of Zodiarcs abandona as tradições do gênero e incorpora novas mecânicas é justamente no combate. Todas as ações são determinadas por meio de um deck de cartas e as opções do jogador estão limitadas às que estão na mão de cada personagem, sendo que, ao contrário da maioria dos jogos de cartas, não há um saque automático, sendo necessário sacrificar um turno para poder pegar duas cartas do baralho.

A outra mecânica que o jogo traz das influências de tabuleiro são os dados. Após cada ação escolhida pelo jogador, é necessário jogar uma mão de dados (que pode variar de apenas 2 no começo até mais de uma dezena no final do jogo), que determinam a quantidade de dano (antes da escolha da ação há um indicador do mínimo e máximo possível), a ativação de efeitos secundários da carta ou até mesmo podem dar uma ação extra ou determinar o saque de cartas. Existem também efeitos negativos nos dados e boa parte das magias de buff ou debuff funcionam com o acréscimo de dados positivos ou negativos à mão do personagem.

Outro ponto de destaque que CoZ tem é o quão simples e intuitivo é a customização tanto do baralho de cada personagem quanto dos dados. Com a evolução dos personagens, novas cartas e novos espaços para dados são liberados, as cartas evoluem e dados de nível mais alto podem ser encontrados como loot das batalhas.

O jogo não coloca um limite na quantidade de cartas que o jogador pode carregar e é possível adaptar os personagens ao estilo que mais interessar a cada um. Infelizmente, não há uma possibilidade de mudar o equipamento, sendo a customização restrita às cartas e aos dados. Além disso, ainda no começo é aberta a possibilidade de modificar os dados na mão do jogador utilizando as sobras do inventário.

Pode parecer bastante informação para se ter em mente em um jogo que, por seu gênero, já exige que o jogador tenha controle sobre muitas informações ao mesmo tempo. CoZ facilita muito isso com uma Interface clara e simples, de visualização intuitiva que permite ao jogador saber tudo o que ele precisa com facilidade. Adicione a isso uma trilha sonora bastante agradável e está pronta a receita para se passar horas e mais horas jogando sem sentir o tempo passar.

E horas o jogador realmente passará. Apesar da campanha relativamente curta (são apenas 19 missões) o jogo possui algumas missões secundárias e dois modos de batalha aleatória (chamados de skirmish e elite skirmish que são fundamentais para ganhar mais experiência), além de um altíssimo nível de desafio em todas as missões, o que torna toda a experiência recompensadora.

Nem tudo são flores, infelizmente. Os modelos dos personagens são estranhos (apesar de seu design bonito) e suas animações são bem simples e repetitivas, os cenários são pouco variados e o design dos mesmos não é muito criativo. Para completar, como as batalhas são longas, a falta de uma maneira de acelerar ou pular as animações de combate dos inimigos faz bastante falta. São pequenos problemas mas que, quando acumulados, tiram um pouco do brilho do jogo.

Children of Zodiarcs é um jogo cuja paixão e carinho em seu desenvolvimento ficam claros. Por mais clichê que possa parecer citá-lo, é um jogo que bebe diretamente do mais icônico do gênero, sendo, senão um sucessor, uma homenagem digna à Final Fantasy Tactics (a temática zodiacal que permeia FFT está bem presente aqui), que se sustenta muito bem sobre as suas duas pernas, inova e, principalmente, enebria o jogador com suas qualidades.

Jogo analisado com cópia digital fornecida pela Square Enix Collective.