Um dos maiores casos de oportunidades perdidas em tempos recentes tem sido os jogos lançados pela Tokyo RPG Factory, estúdio criado em 2014 pela Square-Enix dedicado exclusivamente a desenvolver RPGs com um estilo inspirado por clássicos do gênero, tentando recapturar o espírito e a essência da Squaresoft dos anos 90 e modernizá-la para a atual geração.
Enquanto I am Setsuna, primeiro jogo dos desenvolvedores, foi um relativo sucesso, Lost Sphear já foi um passo na direção errada. Tentando colocar as coisas de volta nos trilhos, ONINAKI, terceiro e mais recente lançamento do estúdio, traz uma equipe criativa renomada e testa sua mão em um sub-gênero novo, abandonando as batalhas por turno dos jogos anteriores em prol de um RPG de Ação.
Colocando o jogador no controle de Kagachi, um jovem que perdeu os seus pais muito cedo em uma terra em que sentimentos normais, como o luto e a dor, são vistos como negativos e capazes de prender as almas dos mortos em um plano de sofrimento e incapazes de seguir o seu caminho rumo a reencarnação. Kagachi em sua adolescência assume então o papel de Watcher, um grupo responsável por proteger os vivos de espíritos ruins e ajudar a guiar os mortos à próxima vida.
Acumulando a dor da perda dos pais quando muito novo e os difíceis anos de treinamento, Kagachi se torna um jovem frio e sem emoções, capaz de lidar com as difíceis tarefas que a função de Watcher coloca sobre ele… Até conhecer Linne, um espírito que se nega a reencarnar e que, ao convencer Kagachi a ajudá-la, será responsável por fazê-lo explorar alguns dos mais bem-guardados e assustadores segredos por trás do seu mundo.
Para os jogadores familiares com os jogos anteriores da Tokyo RPG Factory, essa exploração sobre o significado da vida e da morte é algo de se esperar, mas Oninaki surpreende ao ir ainda mais a fundo nisso do que até mesmo I am Setsuna, entregando um jogo com uma premissa e lore fantásticos e que sabe usá-los para colocar o jogador em situações que o forçam a questionar as suas próprias escolhas.
Isso poderia ter sido o suficiente para catapultar Oninaki a um alto nível, o que acaba não ocorrendo porque, apesar de desenhar um mundo incrível, o jogo tropeça em vários clichês de JRPGs, pintando Kagachi como um típico protagonista angustiado e cujos caminhos são determinados por forças maiores e se pondo no caminho daquilo que o jogo faz de melhor.
Também não ajuda que ele acaba entregando horas e horas de exposição antes de realmente explorar os pontos mais interessantes seu plot, fazendo com que o jogador tenha que aguentar horas bem lentas até alcançar a segunda metade do jogo, onde a história acaba engrenando, com reviravoltas e desenvolvimento de personagens muito bem escritos, algo que, infelizmente, só os jogadores mais dedicados vão acabar experimentando.
Essas horas de abertura seriam ainda melhores se o gameplay de Oninaki não fosse um bom exemplo de oportunidade perdida. Sendo o primeiro jogo do estúdio a abandonar os combates por turno em prol de um sistema de RPG de Ação em que o jogador controla apenas um personagem, é aqui em que ele mais tropeça, mostrando-se uma amálgama de ideias que poderiam ter se combinado de forma muito melhor do que o resultado final entrega.
A essência do combate gira em torno dos Daemons, um tipo especial de espíritos que são capazes de se unir aos Watchers e ajudá-los em batalha. Cada um dos Daemons tem seu próprio grupo de habilidades, tanto ofensivas quanto passivas, e ataques, modificando inclusive o tipo de arma usado pelo Kagachi. É possível ter até quatro Daemons “equipados” ao mesmo tempo, alternando entre eles apenas segurando uma das quatro direções no analógico direito.
Isso traz uma série de oportunidades distintas ao combate, com alguns Daemons mais focados em combate corpo-a-corpo, outros contando com uma vasta gama de opções de combate à distância e opções de cura entre outras opções, fazendo com que cada um deles seja mais indicado para situações diferentes, sendo um importante elemento de estratégia a construção da equipe mais balanceada possível a todo momento (apesar de as estações em que é possível trocar os Daemons são bem frequentes nos mapas).
Apesar dessa grande variedade, o combate nunca realmente engrena, sofrendo de algumas decisões compreensíveis mas muito limitantes. Ele se torna bem repetitivo bem rapidamente e o quão lento é alternar entre os Daemons acaba tirando qualquer possibilidade ou motivação para se alternar entre eles e tentar criar um combate mais criativo além da mais pura necessidade. Para completar, o ritmo em que o jogo vai introduzindo novos elementos ao combate é excessivamente lento, o que torna ainda mais imperdoável a enorme repetitividade dos inimigos.
O grande efeito disso é que Oninaki acaba se tornando um jogo entediante. O combate em RPGs que tentam se focar tanto na sua história precisa ser desafiante ou dinâmico o suficiente para manter o jogador engajado até o próximo momento de exposição e isso nunca acontece nesse jogo, se tornando muito mais uma série de mapas a serem atravessados e explorados (duas vezes, pela possibilidade de fazê-lo tanto no reino dos vivos quanto no mundo dos espíritos), sem muita diversão a ser extraída dele, mesmo que o combate não seja ruim, apenas medíocre.
Algo que acaba ficando um pouco na cabeça é que essa sensação de tédio talvez tenha sido em parte o objetivo, já que muito do visual do jogo e da trilha sonora evocam um forte sentimento de melancolia, algo que vem aos poucos se tornando uma marca da Tokyo RPG Factory. Como era de se esperar, tanto a OST quanto os gráficos são uma bela mistura de nostalgia da era dos 16-bits com sensibilidades mais modernas.
Essa inspiração em jogos da geração do Super Nintendo e Mega Drive é algo que permeia o jogo como um todo, em parte como uma forma de trazer para a atual geração as sensibilidades da equipe por trás dele. Ter a presença do influente Takashi Tokita (diretor de Chrono Trigger e alguém que viu uma de suas outras obras, Live a Live, ser a inspiração para o aclamado RPG da Square-Enix Octopath Traveler) trabalhando em conjunto com a equipe parece ter sido fundamental para os seus sucessos.
No geral, Oninaki é um bom RPG, muito na força da segunda metade da sua história e da lore meticulosamente criada para ele, trazendo uma ambientação ainda mais sóbria do que os jogos anteriores da Tokyo RPG Factory. Infelizmente, a sua intenção de recriar um RPG de Ação nos moldes dos clássicos acaba limitando o jogo como um todo.
Jogo analisado no PS4 padrão com cópia digital fornecida pela Square-Enix.
Veredito
Apesar da boa história e de ser recheado de ótimos conceitos e ideias que poderiam ter funcionado melhor com mais tempo de desenvolvimento, Oninaki acaba sendo um RPG de Ação decente mas que falha em realmente capturar o espírito dos JRPGs antigos ou entregar uma experiência realmente cativante.
Veredict
Despite the good story and being full of great concepts and ideas that could have worked out better with more development time, Oninaki ends up being a decent Action RPG that fails in actually capturing the spirit of old JRPGs or delivering a truly compelling experience.