Anunciado oficialmente pela conhecida distribuidora 505 Games e desenvolvido pela Point Blank, Stray Blade é um novo RPG de ação e fantasia que nos coloca no papel de um aventureiro que, ao lado de um inesperado companheiro, deverá explorar o antigo e esquecido Vale de Acrea, dominar o poder dos Três Metais e enfim restaurar a paz nesta terra devastada pela guerra.
O trailer de anúncio, do qual falamos aqui no site em fevereiro, nos dá um gostinho do jogo que promete um combate complexo e cadenciado, como se tornou comum na indústria. Falamos sobre isso – e sobre muito mais coisas – com o diretor do game Nicholas Zamo*, uma das mentes criativas por trás do projeto. Confira a entrevista abaixo, traduzido para o nosso português e na íntegra!
Entrevista
PSX Brasil: Quando se fala, hoje em dia, sobre o sistema de combate de um RPG de ação, imediatamente nos remetemos a um padrão dominante no mercado comumente chamado de soul-like. Essa é uma das inspirações para Stray Blade ou há outras bases de inspiração mais específicas? Quais os maiores diferenciais do game nesse aspecto em relação a outras produções que já conhecemos?
Nicholas: Especialmente no início, o gênero Souls tem sido uma das nossas maiores inspirações quando se trata do nosso combate. Durante o resto do jogo, tentamos nos distanciar de algumas convenções que normalmente são vistas nesse gênero. Por exemplo, a história do Stray Blade é contada de forma bastante direta, enquanto ainda é uma parte central do jogo, trabalhando como um fio que se pode seguir até ao fim, como numa aventura de ação. A progressão da personagem do jogador também se desenrola de forma muito diferente: Não há estatísticas únicas como STR ou INT para nivelar mas, em vez disso, para progredir, Farren precisa usar armas em combate para dominá-las. Ao fazê-lo, os atributos relacionados com armas na árvore de habilidades são desbloqueados, podendo depois ser nivelados. Mas estes não estão ligados a armas específicas ou classes de armas. Em vez disso, transformam Farren em um personagem mais forte, o que torna cada arma viável em qualquer momento do jogo. Além disso, existe o nosso “Mundo em Transformação”, que, como o nome indica, muda áreas que já se visitou anteriormente.
PSX Brasil: Ótimo! Nos últimos anos, jogos de ação e aventura pautados em elementos de fantasia tem buscado um pouco mais de diversidade ao ressignificarem culturas e mitologias menos conhecidas do grande público. A história de Stray Blade, até onde sabemos, lidará com divindades e outros seres fantásticos. Vocês podem nos falar um pouco mais sobre a criação da lore desse mundo e se há referenciais em mitos existentes?
Nicholas: Dentro do Stray Blade, temos dois grandes conflitos representados no Vale do Acrea: As três facções humanas que estão em guerra pelo controlo do vale, e o impacto destas novas civilizações que deturpam a antiga paz do Acrea. Para as três facções, quisemos centralizar o conflito entre elas por meio de diferentes motivos, neste caso, o choque de influência, força e fé. Por exemplo, a Ordem de Ouro, que representa a influência, foi visualmente inspirada pelo império romano e as suas belas armaduras douradas, enquanto o seu comportamento é fortemente influenciado pelas regras da monarquia e da nobreza inglesas. Ao mesmo tempo, fomos inspirados por culturas que vivem em biomas semelhantes como as respectivas facções. Como a nossa Igreja do Observador está baseada no deserto, queríamos que a roupas e armaduras evocassem esse sentimento, por isso olhamos para o leste. Dito isto, embora existam definitivamente influências culturais nos desenhos do nosso mundo, também olhamos para a definição de características dentro dos meios de comunicação modernos que estão associadas a certos atributos. No final, tudo isto acabou por criar uma combinação muito interessante de influências, e esperamos ter conseguido criar um mundo de fantasia fascinante onde eras e ideologias se juntam.
PSX Brasil: Falando nos ambientes e ainda sobre a exploração, nos parece que o Vale do Acrea é o ambiente primordial onde o game se passa. O quão vasto é o mapa do jogo e o que podemos esperar de coisas a se fazer para além dos embates contra grandes inimigos? Podemos esperar um mundo aberto ou a organização do level design é mais direto?
Nicholas: O Vale do Acrea está dividido em quatro zonas, cada uma com os seus próprios biomas únicos, incluindo por exemplo templos gigantes rodeados de prados e florestas exuberantes, ou picos de montanhas geladas que se elevam sobre minas subterrâneas. Em vez de ter um desenho de mundo aberto, a jogabilidade de Stray Blade envolve revelar gradualmente as diferentes regiões dentro das quatro zonas principais. Isto permite aos jogadores desbloquear novas áreas, atalhos e outras recompensas à medida que progridem, o que pode tornar a sua viagem através das regiões muito mais fácil. Esperamos proporcionar aos jogadores a oportunidade de descobrir e apaixonar-se pelo Acrea ao seu próprio ritmo, criando lugares interessantes, por vezes até místicos, e escondendo segredos como murais antigos ao longo do portão.
PSX Brasil: A presença de um companheiro de viagem, o sidekick por assim dizer, parece ponto central do sistema de suporte em combates, além de ser tradicionalmente uma ferramenta narrativa importante. O que vocês podem nos contar sobre a participação de Boji tanto no que se refere a trama quanto na ação propriamente dita?
Nicholas: Queríamos realmente enfatizar a importância de Boji como a segunda metade da nossa dupla, que é, em muitos aspectos, tão importante quanto Farren. Foi por isso que lhe demos uma espécie de “agência” em combate. Embora ele tenha uma habilidade ativa que pode ser invocada pelo jogador, outras habilidades são utilizadas por ele próprio sem input. Ele traz um certo elemento de surpresa a cada encontro, pois nunca é demais ter certeza se Boji vai ou não intervir por sua própria vontade. As habilidades dele, que são principalmente para apoio ao jogador, são destravadas através do progresso da história, para enfatizar como sua conexão com Farren se fortalece, e Boji encontra cada vez mais coragem para agir por suas próprias mãos, ou patas. Para a narrativa, nosso companheiro oferece uma perspectiva realmente interessante sobre o Acrea. Ele cresceu no vale duas vezes, uma como um “lobo normal” e depois renasceu como Boji, o pupilo do sábio Erray. Através de Boji, podemos aprender sobre a história de Acrea e ver como Boji redescobre sua casa do passado, que em muitos aspectos mudou em relação ao que ele um dia conheceu.
PSX Brasil: Mal podemos esperar para ver do que Boji é capaz. Pelo lado artístico, Stray Blade parece apostar em cores vibrantes e cenários belos e deslumbrantes e certamente vai exigir bastante dos consoles de nova geração e de computadores mais potentes. Como foi o processo de criação artística para dar vida a esse mundo e o quanto isso influencia no desempenho técnico para que, mesmo visualmente impactante, se mantenha fluido para favorecer a precisão imersiva de gameplay?
Nicholas: O processo de criação de ambientes começou definindo a jornada narrativa que Farren e Boji deveriam realizar dentro de uma determinada área e, em seguida, criando um bloqueio de design de nível para projetar a experiência do jogador. Com base nisso, foram feitas muitas pinturas e os recursos foram projetados para definir o aspecto e a sensação desses locais. Durante um processo iterativo, os elementos foram traduzidos para belos ambientes, sempre testando se estamos nos aproximando de nosso objetivo e levando em conta o feedback de todos os lados. Para os personagens, começamos escrevendo uma descrição para determinar suas características e comportamento, além de falar muito sobre como aquele personagem deve aparecer na jogabilidade, no passado e no design de nível, para definir uma visão nítida que estamos almejando. Passando por conceitos, bloqueios e várias etapas de definição, até que personagens, chefes e criaturas foram então trazidos à vida. Alguns desafios para o desempenho técnico vieram dos grandes níveis complexos que temos em Stray Blade, pois eles são bastante abertos em todas as direções e os elementos de entrada e saída não funcionam tão bem quanto em outras configurações. A redução dos detalhes pela distância se tornou uma solução essencial aqui, para alcançar uma jogabilidade fluente e ainda manter o alto nível de detalhes para os ambientes de close-up. Felizmente, o Unreal Engine vem com muitas características fortes em relação à otimização de desempenho. Isto nos ajuda muito a melhorar continuamente nosso desempenho, o que faremos até o lançamento.
PSX Brasil: Promissor. Trailers e outros materiais de divulgação tem nos dado uma amostra da diversidade de equipamentos disponíveis no game, algumas focadas na cadência de golpes pesados e precisos, como espadas longas, e outras mais direcionadas à agilidade, como lâminas curtas para duas duas mãos. A proposta é que o jogador se especialize em um formato que lhe é mais confortável ou que tenhamos configurações distintas para desafios que exigem abordagens diferentes?
Nicholas: Considerando que que tentamos projetar um arsenal diversificado de armas, é claro que ficamos felizes se um jogador encontrar uma arma de que ele goste verdadeiramente. E é também uma vantagem para o jogador encontrar uma arma com a qual se sinta especialmente à vontade. Dito isto, o sistema de progressão da Stray Blade incentiva o jogador a dar uma chance a cada equipamento, já que dominar uma nova arma é a única maneira de desbloquear habilidades e atualizações para Farren. Em nossa equipe, acredito que todos encontraram uma “arma de conforto” que gostam de usar e que preferem para encontros difíceis. Assim, o que acontece com frequência é que eles têm uma nova arma equipada que estão tentando dominar atualmente, enquanto têm sua “arma de conforto” no segundo slot para que possam mudar para ela como uma garantia quando um inimigo se mostra mais difícil do que o esperado.
PSX Brasil: A dicotomia entre a vida e a morte parece central não só na história como também para o modelo de gameplay de Stray Blade. Como tem sido o processo de incorporação de um tema relativamente sensível como esse para que funcione organicamente na trama? Podemos esperar algo parecido com, por exemplo, “Shadow of Mordor” ou “Sekiro: Shadows Die Twice” ou a proposta aqui será diferente destas duas?
Nicholas: Desde muito cedo quisemos incorporar uma explicação de certa forma viável do porquê Farren pode simplesmente voltar dos mortos. Ao mesmo tempo, um tema muito importante do Stray Blade é o companheirismo entre Farren e Boji. Por isso, queríamos encontrar uma explicação que se baseasse nesse vínculo entre os dois. O que acabamos encontrando é Boji usando nosso “sistema mágico” para reanimar Farren. Veja, quando Farren “morre”, o espírito dele não deixa exatamente seu corpo. Farren carrega uma pedra onde esse espírito é preso no momento de sua morte, e Boji pode guiar esse espírito de volta ao corpo do parceiro. No início, Boji precisa de um lugar tranqüilo para isso, para que possa se concentrar, de modo que ele sempre arrasta Farren de volta aos Santuários do Renascimento do Acre. Mas mais tarde, quando seu vínculo se fortalece e Boji se torna mais confiante em suas próprias habilidades, ele pode pular para o combate e reviver Farren no local para que a luta continue. É claro que temos algumas restrições a isso, pois também queremos que o jogador morra em algum momento 😉
Preview
Ficamos muito agradecidos com a disponibilidade e com a generosidade do nosso entrevistado, e a expectativa para a chegada do game só aumenta. Aliás, também tivemos a oportunidade de acompanhar um preview hands-off do game e, com isso, pudemos ter uma visão mais detalhada sobre muitos detalhes ainda não revelados. A princípio, é possível dizer que o jogo parece realmente investir fortemente em três grandes aspectos: a construção de um mundo complexo e cheio de nuances para explorarmos; um sistema de combate equilibrado e com um ritmo interessante baseado nos movimentos de ataque certeiros e em um sistema de defesa e parry ajustado; e na relação próxima entre os dois protagonistas do game como bem destacou nosso entrevistado em suas respostas.
No primeiro caso, a preocupação em tornar o mundo algo interessante parece ter resultado em uma base narrativa bastante rica e cheias de detalhes valorizando eventos que precedem a aventura e dando sustentação aos eventos significativos da história a ser contada no jogo. Temos facções muito bem desenhadas e adaptadas ao mundo, cada qual com suas características que devem se refletir até mesmo no estilo de luta de cada uma delas, nos incentivando a compreender origens e adaptar nossa ofensiva a cada realidade. Como a árvore de habilidades está desenhada para quem consigamos novos perks conforme aprendemos e dominamos um tipo de armamento, será interessante verificar se esse incentivo à diversidade de combate será refletido em uma experiência mais plural de fato.
Também parece promissora a forma de se lutar de forma mais estratégica, mesmo que estejamos em um momento onde muitos jogos do gênero parecem cada vez mais uns com os outros. O timing se mostra fundamental aqui, então esqueçamos o estilo esmagador de botões de um hack ‘n slash por enquanto, mesmo que o jogo esteja evitando o rótulo de ser mais um souls-like, pelo menos até agora. Gosto da ideia do desenvolvimento do personagem sem vincular isso necessariamente a equipamentos mais potentes. Enquanto que, diferente do comum (onde eu estabeleço um setup com o qual devo me acostumar e especializar ao máximo), seremos convidados a experimentar de tudo um pouco ao longo da aventura, enquanto é interessante poder nos adaptar melhor a algo que faça o nosso estilo e estejamos com ela sempre em mãos na hora do aperto.
E por fim, será curioso acompanhar uma nova aventura com uma dupla de heróis tão diferentes dividindo a ação, algo que tem se tornado bastante recorrente, e os últimos jogos de God of War talvez sejam o maior parâmetro nesse sentido. Afinal Boji não é só um pet de suporte, mas também não é um filho ou coisa parecida. E se ele é outra coisa, como será que isso vai se refletir no desenvolvimento de ambos? O quanto essa relação vai influenciar nas escolhas e caminhos do jogador? E como esse sistema de suporte que mescla comandos secundários e ações independentes vai funcionar a nosso favor? São perguntas que parecem postas para os desenvolvedores e que serão fundamentais na percepção final do game, creio.
Enfim, faltam mais algumas semanas para termos o jogo completo em mãos e encontrarmos (algumas) respostas. Stray Blade chega em 20 de abril de 2023 para PlayStation 5, além de PC (via Steam) e Xbox Series.
*Nicholas faz parte dos Point Blank Games há três anos, trabalhando atualmente como diretor de Stray Blade. Ele garante que a equipe permaneça focada em sua clara visão para o jogo. Originalmente formado em química, ele seguiu sua paixão de vida por videogames e investiu na carreira em design e produção de jogos. Ao longo do desenvolvimento da Stray Blade, Nicholas começou cuidando da narrativa, do projeto do jogo e do departamentos de áudio, assumindo eventualmente o papel de diretor.