Análises

Little Nightmares

Talvez muitos desconheçam, mas a empresa por trás de Little Nightmares é uma das desenvolvedoras de Little Big Planet Vita e colaboradora de diversos outros games da série da Media Molecule. Ambas séries de plataforma, mas com propostas diferentes e elementos estéticos completamente opostos. 

Little Nightmares não lembra nem vagamente os trabalhos mais recentes da Tarsier Studios. Ainda que tenha uma jogabilidade executada em três dimensões, é um jogo sombrio que mais se assemelha aos produtos da Playdead – Limbo e Inside -, comparação esta que já dá uma ideia da alta qualidade do projeto da desenvolvedora sueca.

Mesmo existindo suporte ao idioma em português, é um jogo que independe do reconhecimento de palavras, visto que sua narrativa é comunicada puramente por meio do gameplay. São poucas as cutscenes e não há diálogos ou trechos de textos, portanto, o jogador deve absorver a história por meio dos cenários e dos elementos que o compõem – similar ao que acontece em Inside, por exemplo.

O jogador “presencia” o universo de Little Nightmares pelo olhar de uma criança, a garota Six. Presa em uma base submarina permeada de criaturas grotescas, ela deve transitar por várias localidades dessa estrutura subaquática em busca de uma saída para a superfície. Após um breve tempo investido no jogo, nota-se que boa parte dessa base é destinada a processar alimentos, e a matéria prima são crianças. Para onde a comida vai? Isso é parte do mistério que o jogador vai descobrindo aos poucos, com a progressão dos capítulos.

Diversos cenários estão associados à produção de alimentos e a própria garota Six precisa comer com o passar da jornada. Percebe-se que o pecado capital da gula é um dos temas de Little Nightmares e seu universo não poupa os sensíveis ao tratar de temas sinistros, expondo logo no início uma espécie de açougue de crianças.

Componente importante da história e do gameplay são as criaturas que caçam a menina Six. O design desses “monstros” acompanha, na mesma medida, a ambientação doentia de Little Nightmares. São criativos e bem feitos – em relação aos gráficos. Parecem vestir uma “carcaça” de humanos, mas é difícil compreender o que realmente são. O som emitido pelos seres serve como orientação para o jogador e é um importante recurso para um stealth bem sucedido. O jogo traz efeitos sonoros muito competentes, simulando com precisão, por exemplo, a propriedade de cada material com o qual a protagonista Six interage.

A variação de locais dentro da base subaquática é satisfatória e cada capítulo possui uma área temática. Existe, por exemplo, o cenário da Fábrica, da sala de estar, da cozinha, entre outros. A cozinha é o meu favorito; um local gerenciado por dois cozinheiros gêmeos que preparam as crianças processadas na Fábrica. Nela, o jogador testemunha todas as etapas de preparação dos pratos e precisa se esconder debaixo de mesas ou em partes altas dos móveis para escapar do faro apurado desses monstros.

Referente ao gameplay, Little Nightmares traz doses equilibradas de plataforma, puzzle e stealth. Não há enigmas complicados. O jogo é até, de certa forma, previsível. Os momentos de stealth funcionam bem e o jogador pode utilizar objetos do cenário para confundir e distrair os inimigos por meio do som gerado.

A interatividade com os objetos representa uma importante distinção do game em relação a outros jogos de proposta similar. O jogador pode, e, em alguns casos, precisa fazer uso dos elementos do cenário para avançar. É comum ter de arrastar objetos para servir de plataforma ou atirar itens em botões a fim de abrir portas.

A física de tais elementos funciona muito bem e é interessante a consequência das interações. Alguns objetos macios, por exemplo, podem não ser ideais para distrair um inimigo, mas ao atirar uma vasilha de material delicado, o som do objeto quebrando é suficiente para chamar a atenção mesmo de inimigos distantes, permitindo que o jogador percorra rotas seguras e sem ameaças.

Minha maior queixa com Little Nightmares diz respeito à falta de alternativas na progressão do jogo. Isso talvez se evidencie mais com o replay dos capítulos, quando se nota que a resolução dos enigmas ou problemas impostos é quase sempre única. Se houvesse maior liberdade para escapar de uma determinada área do jogo ou até mais caminhos secretos, seria muito mais gratificante. Essa linearidade desestimula a experimentar o jogo por muitas vezes ou buscar por soluções criativas.

Há dois tipos de colecionáveis escondidos no jogo: as estatuetas e as criaturas chamadas Nomes. Embora a busca por esses elementos estenda a longevidade do produto, não há uma recompensa clara para o jogador. Um pouco decepcionante, a não ser que o jogador queira os troféus relacionados a tais tarefas.

Veredito

No que tange o gameplay, é impossível não associar Little Nightmares a Limbo e Inside. Embora similares nesse quesito, o jogo de plataforma e terror da Tarsier Studios traz uma atmosfera singular, povoada por criaturas que causam certo desconforto (o que é bom nesse caso). Seus visuais polidos, além de sua jogabilidade funcional e inteligente, fazem do jogo uma ótima indicação para qualquer jogador que queira uma experiência macabra e pouco convencional.

Jogo analisado com código fornecido pela Bandai Namco.

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