Com a consolidação quase unânime dos roguelites, acaba sendo difícil ver propostas roguelike mais frequentes ou fora de certos nichos. Heading Out tenta arriscar nisso de forma bastante diferente, única e curiosa, apostando principalmente em uma estética visual artística notável e com foco na paixão de diversos jogadores: carros.
No papel de Jackie, ou Jackalope como o personagem passa a ser conhecido no mundo do jogo, o jogador assume um corredor único em busca de enfrentar o melhor motorista do existente e também fugir de seus traumas. Na posse de um punhado de dólares e com seu possante clássico das décadas de 70/80, começa uma jornada através das interestaduais dos Estados Unidos da América em busca de uma reconciliação com desavenças passadas e um passo para o futuro.
Atravessando estados, superando dificuldades e empecilhos que surgem pelo caminho, gerenciando recursos e itens para aquela tentativa e vencendo as corridas e desafios num estilo bem arcade para jogos de corrida, Heading Out mescla vários elementos para ainda dar vida aos roguelikes. Sem apelar para melhorias durante cada tentativa, acúmulo de recursos para sobressair com isso as tentativas frustradas e mais, o jogo volta ao clássico de tentar e tentar novamente, independente do resultado.
O objetivo é simples, atravesses as rodovias e cidades no caminho até chegar ao ponto final da última disputa contra o corredor misterioso e, caso obtenha sucesso, veja como a história progride a cada tentativa vá dando passos até concluir o que seria a campanha principal. Realize quatro disputas e desvende o mistério de Jackie em sua jornada.
De forma simples, o progresso do jogo só é contabilizado durante aquela tentativa, portanto não há como planejar recursos para uma próxima jogada. Seja surpreendido por onde sua jornada vá terminar e parta do mesmo ponto inicial sempre enquanto adentra pelo mapa do país numa espécie de tabuleiro e, quando solicitado ou por opção, tome o volante e acelere para vencer suas corridas ou fugir da polícia em seu encalço.
Apesar de ter recursos gerenciáveis, nada mais é do que manejar seu dinheiro que será gasto entre cada trajeto até uma próxima cidade e também cuidar do estado do carro e capacidade de concentração de Jackie no volante. Por exemplo, um carro muito detonado andará bem mais lento e, como sempre o jogador é perseguido pelo Medo que o força a ir sempre adiante, pode precisar de reparos ou itens que farão o veículo voltar ao melhor estado possível. Outra variante é o cansaço via concentração, que visualmente trará dificuldades ao dirigir, esmaecendo a tela ou mesmo causando acidentes durante percursos não guiados.
Em resumo, Heading Out aposta na clássica história do road trip americano, nas lendas de cada locais e histórias que vão surgindo, completando tudo isso com música do período e que concilia com a ambientação. Adiciona a isso os programas de rádios que vão debatendo temas clássicos e até atuais, as histórias de personagens que surgem em cada local de parada ou no meio da estrada, e até mesmo missões únicas e aleatórias que possam surgir.
Enquanto a direção é básica e força a apenas acelerar e tomar melhores rotas enquanto evita os demais obstáculos, os objetivos de cada corrida tentam disfarçar através da aleatoriedade. Force demais contra a polícia de determinado estado e precisará fugir deles eventualmente. Corra contra 1 ou até 3 outros corredores em disputas valendo preciosos dólares e trace novos caminhos ou gastar em itens e opções interessantes pela jornada. Não importa como você dirige, o objetivo sempre é avançar e chegar em algum lugar, desviando de trânsito, fugindo ou acelerando contra oponentes.
Com a direção sendo básica, o jogador fica apenas à mercê das variações de cada trajeto, como até mesmo a mudança dos cenários e das estradas. Por exemplo, estados mais montanhosos dos Estados Unidos tendem a ter pistas mais curvilíneas, enquanto traçados mais retos são encontrados próximos ao desertos e outros locais mais ao sul do país. Fora isso, a grande parte do jogo se torna apenas um grande tabuleiro onde o jogador destina seu veículo e trata as consequências pelo caminho, tentando chegar até mais rápido e sem muito sofrimento.
Talvez essa parte do tabuleiro seja a mais tediosa e até desinteressante com o tempo. Enquanto é necessário as 4 tentativas para concluir a história, no meio da terceira já se nota uma quantidade exagerada de repetições de eventos, diálogos e até opções. Mesmo com o mapa do país sendo imenso, as variações de rota nas minhas jornadas foram bem reduzidas e, ainda que haja aleatoriedade, deixa a próxima tentativa mais desinteressante. Com isso, o jogador ainda vai precisar tentar inúmeras combinações de rotas e também depender da aleatoriedade da formação de cada tentativa nova para ver novas histórias, que existem de forma considerável mas o jogo parece teimar em não te mostrar todas possíveis de forma mais clara.
Um ponto alto é exatamente a estética artística aqui, mantendo um tema mais “noir” em preto e brando quanto à paleta de cores enquanto força o amarelo, vermelho e azul para pontos chaves e notáveis. A princípio vai te lembrar de obras com visual assim em que o jogo possa ter se inspirado, como Sin City e 300, ou até mesmo os jogos originais de Max Payne. Há ainda um charme a mais no fim da campanha quanto a isso e que realmente é um achado quando se nota a combinação do estilo com a história em si.
Heading Out trata bem o roguelike e a mistura disso com uma corrida arcade e micro gerenciamento, mas a aleatoriedade precisa de ajustes e melhorias para justificar o jogador de arriscar e tentar novas jornadas pelas histórias de Jackie. Mesmo o modo desafio, que força uma dificuldade maior em todos os sentidos, parece perdido se formos colocar a repetição de eventos constantes e que degradam a experiência como um todo e entrega o jogador para uma aleatoriedade sem muita aleatoriedade no fim. Um bom exemplo são os constantes engarrafamentos que, assim como na vida real, quando surgem só vão te fazer bufar e reclamar, sabendo que vai perder ali muito mais do que gostaria.
Heading Out está disponível para PS5, Xbox Series e PC com legendas em português do Brasil. Esta análise é da versão PS5 (no PS5 Pro) e foi realizada com um código fornecido pela Crunching Koalas.
