Análises

Death Stranding 2: On the Beach – Review

Falar sobre o impacto de Hideo Kojima na indústria de jogos é algo praticamente desnecessário já. Impossível criticar a qualidade criativa de uma das mentes mais importantes da indústria, ainda que o estilo dos produtos não coincida com o seu. Particularmente, nunca me apeteceu qualquer Metal Gear Solid que tentei, já que eu tinha memória de jogabilidade muito forte com Splinter Cell, da linha de espionagem que joguei bem antes de conhecer a série de Snake.

De toda forma, quando Death Stranding finalmente foi lançado e teve uma recepção até dividida, isso ficou mais compreensível por ser algo bastante novo em questões de jogabilidade e da complexidade de agradar um jogador sem qualquer base prévia. Erroneamente rotulado como “Simulador de Correios” por aqui e mundo afora também, a jornada de Sam Porter Bridges era algo bastante único e que dependia muito da aceitação e entendimento do jogador por horas para adentrar a jogabilidade e se assimilar em algo tão diferente até então. Ainda cabe aqui citar o ritmo de história e narrativa não muito balanceado, dependendo de mais um bom tempo dedicado para entrar no universo do jogo.

Com isso, ficou evidente que diversos jogadores tentaram e não avançaram nas primeiras horas de jogo pela dificuldade em assimilar uma quantidade excessiva de informações de jogabilidade e a deficiência das mesmas quanto à sua história, abandonando a experiência logo em seguida. Da mesma forma, o que não falta são relatos daqueles que passaram por isso e conseguem enxergar o jogo como uma obra de qualidade excepcional. Eu mesmo só consegui começar e terminar Death Stranding em 2025, e mesmo tentando antes não consegui graças a diversas situações do destino, como até meu cachorro comendo o disco.

Death Stranding 2 On the Beach

Se o primeiro jogo colocou Sam ligando o remanescente dos EUA após o evento cataclísmico do Death Stranding, usando o material quiral que surgiu após as ligações das entidades da praia com nosso universo, Death Stranding 2: On the Beach segue meses após o fim do primeiro jogo, com Sam tentando seguir sua vida da forma mais afastada possível. Aqui deixo quase como obrigatoriedade jogar o primeiro título de alguma forma e não se basear apenas no vídeo de recapitulação da história, já que há inúmeros pontos importantes não abordados.

Não querendo entrar em muitos detalhes do primeiro jogo, mas há aspectos importantes demais para o entendimento geral da história e das mecânicas básicas antes de entrar na sequência. A jornada de Sam e Lou, reconectando um país via a UCA e o que sobrou da população num mundo destruído, que preferiu se distanciar ao invés de se unirem após o desastre, é só parte da experiência como um todo. Como aprendi a dizer após concluir o jogo, Death Stranding é muito menos sobre o pacote que você entrega e mais da jornada para unir as necessidades de uns com o auxílio de outros enquanto enfrenta os caminhos mais tortuosos para isso. Vai além dos mistérios do que causou e o que realmente é o Death Stranding, das entidades mortas que se conectaram ao mundo dos vivos e que podem causar novos desastres a qualquer momento, ou mesmo daqueles que tentam seguir com o mundo e reconstruir tudo o que foi perdido.

Dito isso, recomendo novamente aproveitar o primeiro jogo antes do segundo, tanto pelo impacto da história, personagens e assimilação da jogabilidade inicial. Por outro lado, é uma sequência direta e, como praticamente qualquer sequência, ter conhecimento dos eventos anteriores é sempre válido. Apesar de tudo, em um último caso, ainda acho que seja possível ir direto para o 2 e aproveitar diretamente aqui, já que as primeiras 4 horas servem como um tutorial expandido e dá o pontapé inicial na história sem delongar muito. O que pode ocorrer é um efeito similar ao do primeiro jogo numa impressão inicial, com jogadores talvez não tendo o tempo correto até uma total adaptação ao estilo, mesmo On the Beach trazendo diversas melhorias que auxiliam nisso, em mecânicas e interface das quais falaremos mais adiante.

Death Stranding 2 On the Beach

E, finalmente direto sobre o segundo jogo, On the Beach traz Sam se juntando a Drawbridge, uma organização civil criada após o sucesso da reconexão da UCA nos EUA e tentando recriar o sistema de redes quirais para outros países, mas sem funcionar como uma expansão do país já reconstruído. Após eventos iniciais e que engatilham a criação de um portal tunelar quiral que agora liga continentes, indo diretamente do México para a Austrália, Sam precisa lidar com dores que não esperava e ameniza isso numa nova jornada. Tentar reconectar o novo país para que outro portal tunelar surja e, assim sucessivamente, reconectar novamente a humanidade em cada novo continente para recuperar um mundo perdido após o Death Stranding.

Funcionando de forma independente e sem apoio governamental da UCA, a Drawbridge foi financiada por um benfeitor e trabalha agora em parceria com a APAC, uma organização privada que automatizou as entregas após a ligação total da UCA e tenta deixar os humanos mais seguros sem a necessidade de portadores num mundo. Atendendo ao pedido de Fragile, Sam ruma para a Austrália a bordo da DHV Magalhães, uma espécie de nave e submarino que foi desenvolvida para transitar entre o alcatrão e as correntes quirais emanadas da praia. Junto da tripulação da DHV, capitão Tarman, Rainy e Dollman, Sam começa uma nova e longa caminhada, lutando contra perigos externos de outros humanos, as entidades da praia ainda mais agressivas, uma nova geografia na perigosa Austrália e, também, seus próprios demônios não superados.

Death Stranding 2 On the Beach

De forma direta, a construção da história agora é focada quase que totalmente nos personagens e abdica de um escopo maior para se justificar. A reconstrução da Austrália vira pretexto para dedicar mais tempo e foco na jornada de Sam e dos mais diversos personagens nessa caminhada. Ainda que mais contrita nisso, acaba entregando algo muito mais interessante e emotivo, que fará cada jogador se apegar mais aos personagens do que numa reestruturação do mundo.

A narrativa é melhor estruturada e abandona os espaços deixados que antes eram usados para apresentar diversas mecânicas e explicações do mundo de antes. Não espere várias entregas e horas a fundo apenas para saber como Sam atravessa de um local para outro, com isso agora acontecendo em paralelo à estrutura da história e não mais como foco de apresentação ao jogador. Ainda vai ser um jogo pautado pelas suas entregas e caminhos conectados ao longo da jornada, portanto vai seguir certa estrutura de antes, como conectar um Centro de Distribuição que daí será um gatilho para avançar pela história.

E se há algo que realmente possa destacar de forma levemente negativa aqui é que parte dessa história se torna até previsível em alguns momentos, com o jogador podendo até mesmo antecipar pequenos twists e revelações. Serão ainda momentos incríveis de se presenciar, mas se tratando de Kojima e de como o primeiro jogo se revelou, talvez tenha faltado momentos de grande surpresa. Parte disso pode ser exatamente pela assimilação de tudo antes e estar bem preparado para o que acontece agora, o que pode se revelar mais impactante para jogadores de primeira viagem aqui.

Death Stranding 2 On the Beach

De toda forma é uma trama extremamente interessante, divertida e emocionante, com personagens de impacto, como Tomorrow pelas mãos da ótima Elle Fanning, e até mesmo a volta de Troy Baker como Higgs e um vilão melhor explorado do que antes. Mesmo Sam, que nunca demonstrou muito de si mesmo no jogo anterior, tem mais carga emotiva maior e graças ao uso da paternidade como subtrama aqui. Demais personagens que retornam também tem seus pontos de impacto e melhor uso além de apenas âncoras de explicação para a história, como Heartman, por exemplo.

Talvez a carga emotiva aqui seja de um impacto maior do que as “nonsenses” do universo, usando uma história mais conectada entre os personagens principais, companheirismo e a já citada paternidade. Há, pelo menos, duas cutscenes extremamente satisfatórias reforçando isso, além de todo um terceiro ato de uma qualidade excepcional, tanto para a história e narrativa quanto do ponto cinematográfico.

Death Stranding 2 On the Beach

Adicional a tudo isso ainda temos missões secundárias diferentes do tradicional levar e entregar, ou eliminar os MULAS e novos inimigos do jogo, como criaturas quirais integradas ao mundo, ainda agressivas mas não tão passivas quanto EP’s. Há realmente histórias paralelas, com arcos e mistérios próprios que deixam a integração com algumas localidades e os Preppers ainda mais interessantes. Há algumas outras surpresas quanto ao conteúdo secundário do jogo e com algumas sendo das mais interessantes da série, mas isso fica a cargo do jogador descobrir.

A jogabilidade sempre foi o ponto mais fora da curva em Death Stranding, assim como o mais questionado pelos jogadores. Da forma como já disse antes, muito cabe em entender e adentrar o sistema até assimilá-lo por completo. On the Beach é uma evolução em termos de praticidade e facilidade de entendimento agora, sendo talvez o grande ponto positivo nesse quesito.

Melhores menus e interface como um todo, diversas melhorias no uso de cargas, elevada qualidade de vida nas interações pelos usuários e um sistema quase que reformulado pensado para servir melhor. Saem de início algumas mecânicas que complicam o jogo e que voltam apenas no futuro quando há uma assimilação completa. Por exemplo, o combate armado é quase todo feito por meio de uma nova munição chamada de MU, sendo efetiva contra EP’s e humanos, assim como os novos inimigos mecânicos do jogo. Essa munição impede a morte de humanos, o que causaria alguma obliteração e, com isso, game over. Deixa o início mais prático e funcional, mas essa mecânica retorna no futuro de forma simplificada sem ter um impacto tão grande.

Death Stranding 2 On the Beach

Sendo esse apenas um exemplo, pense que outras mecânicas tomaram tratamento similar para deixar o jogo mais prático e dinâmico. De toda forma, não pense que isso quebra a experiência como um todo, mas sim mantém o mundo de Death Stranding muito como você já o viu antes. Em resumo, os diversos ajustes feitos fazem sentido, deixam o jogo mais funcional e menos complicado, sendo alterações bem vindas para novatos ou veteranos.

Já sobre a maior parte do jogo, o sistema de entregas, busca e eliminação segue de uma maneira padrão como antes, mas reforçada pelas novas ferramentas e melhorias existentes. Afinal, Death Stranding sempre vai ser um jogo sobre portadores e suas viagens para entregar pacotes requisitados. Com isso, a essência não mudou e a estrutura foi incrementada graças às mudanças realizadas no processo. Novos equipamentos, estruturas, caminhos, aperfeiçoamento de veículos e mais vão ditar o ritmo de como o jogador progride, mas com a vantagem de haver um balanceamento mais acertado agora quanto a tudo o que você pode usar.

Death Stranding 2 On the Beach

Que atire a primeira pedra aquele que não fez uma rede de tirolesas no primeiro jogo para facilitar a transição entre pontos anteriormente. Isso ainda é possível, mas todas as demais opções foram aprimoradas para também serem efetivas e funcionarem como opções em terrenos diferentes. Uma pick-up off-road é muito mais efetiva que uma tirolesa em boa parte dos trajetos, assim como a boa e velha caminhada enquanto amarra um trator flutuante com carga segue sendo opção útil em vários pontos de difícil desbravamento inicial.

Há sim alguns veículos e ferramentas novas que vão dar ainda mais opções, que vão fazer uso da estrutura do alcatrão e também dos materiais quirais para isso, inclusive andando sobre a água, mas com algumas limitações. Quanto a tudo o que pode ser usado e os caminhos a percorrer, On the Beach entrega uma variedade ainda maior e que justifica os experimentos e uso de artifícios diferentes agora, não mais ficando preso às já citadas tirolesas ou estradas pavimentadas como únicas opções viáveis.

Death Stranding 2 On the Beach

O combate também é parte aprimorada e dá mesma forma como o sistema de entregas. Além da mudança de munição para balas MU, novos sistemas e inimigos deixam essa parte mais interessante e bem diferente do que era antes, sendo até dita como a menos explorada no jogo anterior. Ainda é possível usar de surdina em várias situações, principalmente contra as EPs e humanos, já que robôs quase sempre vão partir para um confronto direto na maioria das situações. Há ferramentas que reforçam ainda mais o modo stealth, até mesmo camuflagem na roupa de Sam, mas a maior expansão do sistema é no combate direto.

Seja corpo a corpo ou à distância, On the Beach até parece incentivar mais o combate direto em contraparte ao jogo anterior. Além de novas armas e equipamentos que Sam terá à disposição, há também uma boa mudança na estrutura geral para deixar o jogo mais indicado ao confronto. EP’s tem um padrão de busca e aleatoriedade maior que deixa a opção de passar despercebido longe de ser a única e com o combate mais divertido em reflexo a essas mudanças. Humanos ainda vão continuar sempre procurando atacar direto, mesmo que haja padrões de flanqueamento e cobertura mais frequente agora, assim como também possuírem novos aparatos, como minas e ferramentas de detecção.

Death Stranding 2 On the Beach

Entra ainda o novo sistema de progresso e evolução via atualizações da APAS. Sam vai melhorar conforme o jogador realiza diversas ações que contam para um ranking de progresso. Carregue sempre cargas próximo ao limite ou prenda bastante o ar quando próximo de inimigos para evitar ser detectado e melhore nesses quesitos, sendo possível carregar ainda mais carga e segurar o ar por mais tempo. Use um tipo específico de arma mais frequente e fique perito nela, com maior velocidade de carregamentos ou mira mais precisa.

Já o sistema da APAS permite o jogador gastar pontos ganhos ao conectar e aperfeiçoar a ligação dos locais com a rede, permitindo assim uma abrangência maior não apenas de estruturas possíveis, mas habilidades únicas que vão mudar o sistema de scanner, uso de veículos, resistência das ferramentas e mais. Há nisso um pouco de RPG e que aumenta ainda mais as opções dentro de todo o sistema de jogabilidade da série.

Algo que realmente pode ser dito aqui é como a Kojima Productions pegou todo o feedback dos fãs e colocou muitos aprimoramentos para uma experiência mais divertida. Indo além da versão Director’s Cut do primeiro jogo, há coisas que foram retiradas e outras adicionadas apenas para deixar o jogo mais fácil de se entender, sem perder sua essência, mas que talvez possa ser uma versão um pouco diferente para os mais puritanos dos fãs, com algo agora mais padrão e menos excêntrico.

Death Stranding 2 On the Beach

Ainda acredito que a sequência possa ser sim uma experiência divisória entre jogadores atuais, que não vai agradar a todos mesmo sendo mais abrangente para com seu público. Mesmo mais contido, há muito de Hideo Kojima com seu pensamento fora da caixa em On the Beach e seria estranho caso não fosse exatamente assim. Mesmo assim, e indo muito além do que reforço para o primeiro jogo, é algo extremamente excepcional quando o jogador investe e adentra no universo do jogo, sendo uma experiência gratificante e que reforça as teorias de conexão entre as pessoas, sendo aqui ainda mais nítida ao ver como outros jogadores interagem no seu mundo.

Se você passa por um caminho mais de uma vez, isso se torna uma trilha. Se outros jogadores online usam essa trilha, ela se torna uma estrada com o tempo. O mesmo acontece com as estruturas compartilhadas pelo mundo, seja as suas para outros jogadores ou de outros para o seu mundo. Chegar num momento de sufoco, sem muito fôlego e ver ali que alguém construiu um abrigo contra chuva temporal que vai te proteger por um tempo e impedir a deterioração da sua carga é sempre um alívio. Essa junção dos eventos e ações de cada jogador que reforçam a experiência para outros é algo fantástico desde o primeiro jogo e funciona bem similar aqui, expandido graças às novidades adicionadas ao jogo.

Death Stranding 2 On the Beach

Um dos grandes trunfos do primeiro jogo era sua trilha sonora. Enquanto jogava, me perguntava como Kojima tinha encontrado a Low Roar e a Silent Poets e de que formas as músicas já prontas haviam casado de forma tão magistral com o jogo. O que, para mim, define Death Stranding é o jogo ser quase uma mistura de um cozy game de caminhada e entregas enquanto fica no limiar da ação e tensão de um AAA padrão da indústria. A trilha sonora do jogo fazia algo incrível, mesclando esses estilos, mas também reforçando cada um quando necessário, principalmente a primeira parte.

Em On the Beach isso não é diferente, mas não tem mais a surpresa do estilo musical funcionar de forma inesperada. Woodkid cria uma trilha completa de excelente qualidade, dinâmica em relação às ações do jogador, mas ainda com as faixas separadas para momentos únicos que vão continuar dando aquela sensação de descoberta e relaxamento em meio a uma entrega.

Death Stranding 2 On the Beach

Isso é boa parte do que faz a experiência ser algo excepcional aqui, mas outra tão importante quanto é o fator visual e técnico. A Decima Engine se mostra novamente fantástica e temos um jogo de melhor visual no PS5 em todos os quesitos. Jogar a 60 quadros por segundo, com uma imagem extremamente limpa e num mundo repleto de detalhes visuais é algo que era esperado do console até então. Mesmo que DS já fosse considerado um salto incrível no PS4, DS2 é uma evolução perfeita e impressionante nesse sentido, sendo um jogo que realmente impressiona em todos os quesitos técnicos e visuais no PS5 padrão.

Death Stranding 2: On the Beach é uma sequência impecável, que não perde sua essência e ainda incrementa inúmeras melhorias e aprimoramentos necessários e válidos. Expande sua história da forma certa, sendo mais intimista e focando nos personagens principais e não mais em apresentar um universo totalmente diferente. Aprimora sua jogabilidade nos pontos mais fracos e balanceia a experiência como um todo para entregar muito mais opções do que antes, mas continuando a ser um jogo de conexões e entregas. Perfeito em diversos aspectos e continuando sendo uma experiência impressionante, o mais recente jogo da Kojima Productions é uma obra mais mainstream do que antes, que deve agradar os mais diversos jogadores e ser um ponto de entrada perfeito caso haja mais da franquia no futuro.

Death Stranding 2: On the Beach está disponível para PS5 com dublagem e legendas em português do Brasil. Esta análise é da versão PS5 e foi realizada com um código fornecido pela Sony Interactive Entertainment.

Veredito

Tecnicamente impecável e visualmente impressionante, Death Stranding 2: On the Beach é uma sequência excepcional e com nítida evolução para um jogo já repleto de qualidades. Uma história ainda mais envolvente e com narrativa aprimorada, além de enormes avanços na sua jogabilidade única, são só alguns pontos de um dos melhores jogos do ano.

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