Encontrar o equilíbrio entre manter satisfeita sua base de fãs veteranos e, ao mesmo tempo, conquistar novos jogadores tem sido o grande dilema enfrentado pela franquia Battlefield nos últimos anos. Desde o lançamento morno de Battlefield V até o conturbado Battlefield 2042, a DICE tentou implementar mudanças radicais na jogabilidade e adotar um modelo que priorizava um conteúdo mais voltado ao pós-lançamento. O resultado, no entanto, foi uma comunidade frustrada, a ponto de muitos acreditarem que a franquia jamais voltaria aos seus dias de glória.
Reconhecendo esse cenário, mas também ciente do imenso potencial ainda presente na série, a Electronic Arts decidiu agir. Ao lado da DICE, outros três dos principais estúdios da empresa foram mobilizados para formar o chamado Battlefield Studios, uma nova estrutura dedicada exclusivamente a resgatar a essência da franquia, mas sem deixar de lado a ideia de inserir conceitos modernos.
Com isso, o novo título prometia oferecer a melhor experiência multiplayer desde os icônicos Battlefield 3 e 4, marcar o retorno da campanha single player, expandir o modo Portal e até explorar uma nova abordagem dentro das características da série para o battle royale — embora este último ainda não tenha data de lançamento confirmada. Diante de um projeto tão ambicioso, nenhum nome pareceria mais apropriado do que Battlefield 6.
Após cada trailer revelado, prévias divulgadas e um dos maiores testes beta abertos já realizados na franquia, a expectativa se tornava cada vez maior. Agora que temos acesso ao jogo completo, é muito bom poder confirmar que Battlefield 6 realmente corresponde ao que os fãs esperavam. O título também se mostra o mais próximo que a série já chegou de agradar tanto aos veteranos quanto aos novos jogadores, embora algumas decisões polêmicas de design ainda possam causar estranhamento entre aqueles mais puristas.
Mas antes de mergulhar no que o jogo tem de melhor, vale destacar aquilo que funciona como um bom aperitivo: a campanha single player. Além de oferecer uma dose consistente de ação, ela cumpre de forma satisfatória seu papel de introduzir as mecânicas de jogo e contextualizar o cenário geopolítico que sustenta os conflitos de Battlefield 6.
A trama se passa em 2028, em um mundo à beira do colapso diplomático. Após um grupo militar de mercenários conhecido como Pax Armata assumir a responsabilidade pela morte de um importante líder da OTAN, uma onda de instabilidade se espalha por diversos países. Como resposta, várias nações decidem abandonar a aliança para apoiar a Pax Armata, deixando os Estados Unidos praticamente isolados na luta contra uma força paramilitar altamente equipada e organizada.
A campanha abandona o modelo de missões no formato de histórias de guerra adotado em BF1 e BFV, para assumir uma narrativa mais direta. O jogador segue os passos do esquadrão de elite Dagger 1-3, em uma série de nove missões ambientadas em locais ao redor do globo. Desde os bairros famosos de Nova York, até a Cidade do Cairo e o importante ponto estratégico de Gibraltar, a campanha é focada em ditar de forma cinematográfica o ritmo frenético que será encontrado nas partidas multiplayer.
Embora a premissa “Estados Unidos contra o mundo” soe como um clichê já exaustivamente explorado em jogos de guerra, Battlefield 6 consegue ao menos entregar uma experiência funcional dentro dessa fórmula. Apenas não espere por uma história marcante, repleta de reviravoltas e com personagens aprofundados.
A estrutura das missões é simples e direta. Algumas delas até tentam variar um pouco a jogabilidade com partes focadas na furtividade, mas, no fim, a ideia é que você saia atirando em tudo que encontra pela frente sem se importar com o motivo. Durante essas missões haverá momentos para pilotar veículos, participar de batalhas entre blindados, testar diversas armas e ferramentas, além de também entender um pouco mais sobre as classes dos personagens.
Um ponto fraco evidente é a inteligência artificial dos inimigos. Em diversas ocasiões, soldados da Pax Armata permanecem inertes ou agem de forma completamente desconexa com o combate ao redor, mesmo em dificuldades mais elevadas. Essa limitação compromete parte da imersão e da intensidade dos confrontos, tornando algumas sequências até previsíveis.
Claro que ninguém procura Battlefield por seu modo single player, mas ter esse conteúdo de volta é sempre interessante, ainda que inevitavelmente gere expectativas por uma campanha de qualidade. De forma geral, as poucas horas da história não chegam a ser um desastre, mas também deixam um gosto meio amargo de algo que poderia ser melhor, mas que parece estar sendo preparado para o futuro.
Partindo então para o que realmente importa, é no modo multiplayer que Battlefield 6 brilha com intensidade. Um dos grandes acertos está na ampla variedade de modos disponíveis. Dos clássicos confrontos em larga escala de Conquista e Investida, passando pelo já consolidado Ruptura e pela boa novidade Escalada, até os modos mais compactos, como Mata-mata em Equipe e Dominação, há conteúdo de sobra para agradar a todos os perfis de jogadores.
Essas partidas se desenrolam em uma boa variedade de mapas, com layouts que favorecem desde intensos confrontos de infantaria até combates entre veículos, além daqueles momentos épicos que só Battlefield é capaz de proporcionar. O design de áudio está entre os melhores da franquia, entregando uma ambientação sonora impressionante. Somando-se a isso o retorno de um sistema de destruição à altura do legado da série, o resultado é um jogo que captura com excelência o verdadeiro espírito da guerra.
Os cenários oferecem diversas possibilidades táticas, com mapas que vão de áreas urbanas com ruas estreitas e prédios a terrenos abertos que fazem excelente uso da verticalidade. No entanto, um ponto que pode ser visto como negativo é a semelhança visual entre alguns mapas. Embora isso deva ser resolvido com a adição de novos conteúdos em futuras atualizações, Battlefield 6 ainda parece um pouco atrás nesse aspecto quando comparado à variedade presente nos lançamentos anteriores da franquia.
A movimentação dos soldados foi ajustada em relação à versão Beta, deixando uma impressão bastante positiva. O estilo mais acelerado, que permitia manobras pouco condizentes com o DNA da franquia, foi refinado para se alinhar melhor à proposta mais “pé no chão” do jogo. Ainda é possível deslizar para evitar disparos ou saltar para surpreender inimigos, mas as penalidades aplicadas à precisão durante esses movimentos incentivam uma abordagem mais estratégica e consciente nos combates.
Além disso, melhorias no sistema de travessia de obstáculos, o retorno da corrida enquanto agachado, a possibilidade de apoiar armas enquanto se inclina nas paredes e a excelente adição da mecânica de arrastar companheiros até uma cobertura antes de reanimá-los contribuem para uma jogabilidade mais refinada. Esses elementos reforçam a proposta de resgatar o espírito clássico da franquia, ao mesmo tempo em que modernizam suas mecânicas de maneira inteligente e funcional.
Com isso, chegamos ao que considero a maior polêmica de Battlefield 6: a liberação de armas para todas as classes. Essa decisão, que já foi uma das principais críticas em Battlefield 2042, retorna como padrão no novo título e acaba gerando um desequilíbrio desnecessário no sistema de classes. Embora exista a opção de buscar partidas com armas restritas por classe, a sensação é de que esse modo tende a ser cada vez mais escanteado tanto pela desenvolvedora quanto pela comunidade.
A liberdade na escolha de armas pode parecer uma boa ideia, mas também acaba gerando metas que incentivam uma abordagem mais egoísta. Um exemplo clássico é o jogador que escolhe o kit de suporte, mas se equipa com uma sniper para se isolar do objetivo com munição infinita e apenas prejudicar o time. Além disso, esse sistema acaba criando situações em que todos os jogadores, independentemente da classe, acabam usando a mesma arma, o que reduz um dos maiores diferenciais e atrativos do jogo.
O arsenal disponível desde o lançamento é bastante variado, e a sensação de mirar e atirar continua sendo uma das melhores entre os jogos do gênero. Há diversas opções de acessórios que podem ser desbloqueados à medida que o jogador se especializa com cada arma durante as partidas, permitindo ajustes no desempenho e estilo de jogo. O recoil foi melhor balanceado, oferecendo uma resposta mais realista, de forma que cada arma transmite uma sensação única ao ser disparada.
Algumas adaptações no sistema de distribuição dos pontos de customização das armas foram implementadas para melhorar o equilíbrio, embora certas combinações com multiplicadores de acertos na cabeça ainda causem a impressão de estarem um pouco mais fortes do que deveriam. O time to kill continua a depender da cadência da arma, da distância em que ela é mais eficaz e dos modificadores aplicados, mas a sensação de morrer instantaneamente parece ter sido reduzida, proporcionando um combate mais justo.
Claro que essa impressão é baseada em um período inicial, no qual poucos jogadores estavam ocupando os servidores ao mesmo tempo, mas acredito ser seguro afirmar que Battlefield 6 tem tudo para entregar um dos lançamentos mais estáveis da franquia, apresentando belos gráficos tanto no PS5 quanto no PS5 Pro, uma performance sólida e praticamente livre de erros graves que possam comprometer a experiência inicial daquilo que promete ser um período intenso para os servidores.
Embora possa parecer óbvio mencionar isso após o fatídico Battlefield 2042, o retorno do sistema de classes está entre as melhores decisões para BF6. As quatro classes tradicionais da franquia continuam oferecendo suporte essencial para o time nos modos de jogo em larga escala, mesmo que, em alguns modos menores, o sistema de classes por muitas vezes acabe ficando em segundo plano.
Os equipamentos e as habilidades passivas de cada classe se encaixam dentro da proposta mais centrada do jogo, apesar que algumas combinações que marcam os jogadores no mapa continuem parecendo exageradas. O principal problema neste sentido continua sendo a habilidade de auto-spot da classe de reconhecimento, que inclusive permanece sendo ativada ao mirar com armas automáticas.
O sistema de progressão é amplo, e privilegia realizar ações que favoreçam seu time e o desempenho pessoal para desbloquear novos equipamentos e itens cosméticos. As skins de soldados, veículos e armas, assim como os elementos de personalização do cartão dos jogadores, adotam tons mais sóbrios, sem exageros nos designs. Agora, resta saber se esse padrão será mantido quando as recompensas das temporadas e os itens vendidos por microtransações forem liberados. Sinceramente, espero que sim.
Esse suporte pós-lançamento será fundamental para manter a comunidade engajada. Com a primeira temporada marcada para começar em algumas semanas, trazendo novos mapas, equipamentos, modos de jogo e até um evento sazonal, o Battlefield Studios promete um conteúdo robusto para o futuro do game.
Outra ferramenta que pode ser um diferencial nesse aspecto é a criação e edição de mapas no modo Portal. Além de permitir a personalização de mapas oficiais — com a disponibilidade de um servidor persistente por jogador, ativação ou desativação de elementos como armas, classes, modificadores de dano e outros recursos —, a novidade agora inclui um editor espacial, que possibilita criar as mais diversas situações de jogo.
Essa funcionalidade abre um leque imenso de possibilidades, que vão desde novos modos de jogo e mapas únicos até cenários inspirados em outras franquias. No entanto, também há o risco de os mapas criados descambarem para algo que foge completamente da proposta original do game. Tudo vai depender de como a comunidade irá abraçar essa mecânica para sabermos se o Portal será, de fato, a ferramenta valiosa que todos esperam em Battlefield 6 ou se mais uma vez carregará o rótulo de potencial desperdiçado.
O que acaba prejudicando um pouco a proposta do modo de criação é o fato de ele exigir o uso de um site externo para ser acessado, além de demandar tempo, dedicação e certa habilidade para que os jogadores consigam realmente tirar proveito do que a ferramenta tem de melhor.
Outro ponto que ainda prejudica um pouco a experiência, embora não esteja diretamente ligado ao modo Portal, é a interface de busca por partidas, assim como os menus de configurações, que continuam bastante confusos e pouco intuitivos.
Para encontrar uma partida no seu modo favorito, é preciso navegar por banners na tela inicial, que rotacionam conforme novas experiências ganham destaque. Além disso, o sistema de matchmaking continua confuso, agrupando, por exemplo, modos como Investida e Ruptura na mesma lista, ainda que cada um tenha quantidades bem diferentes de jogadores.
As configurações oferecem boas opções para personalizar a experiência de jogo, mas muitas funções ficam escondidas em submenus, o que torna o processo mais trabalhoso do que deveria. Embora isso não comprometa diretamente a experiência, uma interface mais intuitiva seria muito bem-vinda, especialmente em um jogo como Battlefield 6, onde ajustes finos nos controles e nas configurações visuais podem impactar significativamente a performance do jogador.
A verdade é que, mesmo com alguns problemas pontuais e decisões de design que podem ser contestadas, é inegável o salto de qualidade que Battlefield 6 representa em relação aos seus antecessores. Com a proposta da EA de resgatar os melhores momentos da franquia sendo bem executada, e com o suporte contínuo prometido pelo Battlefield Studios para manter o jogo sempre atualizado, Battlefield 6 tem potencial não apenas para marcar a retomada da série, mas também para se firmar como um dos maiores títulos da franquia.
Battlefield 6 está disponível para PS5, Xbox Series e PC com dublagem e legendas em português do Brasil. Esta análise é da versão PS5 (no PS5 Pro) e foi realizada com um código fornecido pela Electronic Arts.