Não é segredo que o mercado de jogos demonstra mudanças ao longo dos anos, visto como exemplo, hoje em dia, o foco em ambientes competitivos e no já famigerado Battle Royale. Algumas experiências que tivemos no passado ou foram abandonadas ou modificadas para atender melhor o que o mercado deseja, como os antigos jogos no formato FMV (Full Motion Video).
Um jogo FMV é uma história interativa, contada por meio de escolhas e de cenas gravadas com atores reais ou até pré-renderizadas e desenhadas, como Dragon’s Lair. The Infectious Madness of Doctor Dekker é um jogo feito nesses moldes, uma história de investigação contada por meio de perguntas e respostas com vídeos gravados com atores reais, dentro de um universo bastante inspirado pelas obras de H. P. Lovecraft.
Em Dr. Dekker, o psicanalista que dá nome ao jogo é morto de forma suspeita dentro de seu próprio consultório. No papel de um novo médico para o local, o jogador é responsável por entender a morte do colega de profissão, ajudar a polícia a encontrar o suspeito e, principalmente, interagir com os pacientes do antigo doutor, a fim de ajudar cada um com seus distúrbios e descobrir a relação deles com o assassinato.
Conforme explicado anteriormente, todo o jogo é feito com atores reais, que representam os personagens da história. As interações de cada um com o jogador ficam a cargo das perguntas que são feitas. Há duas formas de se interagir com os pacientes. A primeira é utilizando as perguntas pré-definidas, bastando apenas selecioná-las e obter uma resposta. A segunda é dando a possibilidade de o jogador digitar sua própria pergunta, criando assim uma interação maior e mais pessoal para cada momento.
Mesmo que essa interação seja simples e funcional, os maiores trunfos do jogo com certeza são seus personagens e as atuações dos atores. Cada um tem características distintas e histórias peculiares que vão deixar o jogador curioso até o fim. Apesar de todos serem interessantes, alguns acabam se sobressaindo aos demais, como uma bela jovem que vez ou outra acorda nua na praia, uma enfermeira conhecida como anjo da morte, já que praticamente todos os pacientes morrem sob seus cuidados, ou até mesmo sua própria assistente, que parece sempre estar escondendo algo.
Mesmo assim, os outros personagens não deixam de ser menos impactantes ou importantes, talvez apenas não haja uma química tão boa entre o ator e seu papel, como o coveiro que afirma viver uma hora a mais todos os dias ou outro paciente que diz reviver o mesmo dia todos os dias. Há alguns outros personagens que não são tão importantes, mas que surgem para dar uma pista extra, como uma mulher que consegue entrar nos sonhos das pessoas.
Uma parte bastante interessante é que, estando ao lado do médico e observando cada personagem com suas características, traz ao jogador um pouco da experiência de entender pessoas com problemas diferentes, mas que apenas elas afirmam existir. Isso cria a sensação de dúvida, em que acreditar ou não depende muito da interpretação do jogador para que, no fim, crie certa conexão até mesmo com o assassino.
A cada dia e a cada conversa, novas pistas e diálogos vão aproximando o jogador da verdade e do assassino, mas isso também começa a ser um dos pontos negativos do jogo. Como tudo é baseado nas conversas, todas ocorrem exatamente no mesmo consultório, ou seja, o jogador vai ver sempre o mesmo sofá, a mesma parede e nenhuma mudança no ambiente, o que, com o tempo, acaba por deixar uma imagem sempre monótona e tediosa, principalmente com aqueles personagens com quem você irá se apegar menos.
Num tempo total e tentando resolver tudo apenas com os diálogos padrões, uma jogada deve durar algo em torno de 5 horas. Para se conseguir todas as respostas possíveis, o jogador deve obrigatoriamente digitar e fazer as demais perguntas, sendo que para um jogo todo em inglês, acaba sendo algo um pouco forçado para os jogadores de demais línguas. Mesmo que isso ajude bastante no estudo de outro idioma, se torna algo não tão acessível para os que querem apenas aproveitar a história.
Um bom ponto positivo é que há um fator replay interessante, sendo que sempre que se começa um novo jogo, o assassino pode ser diferente e com uma nova história a ser contada, dando maior longevidade ao título. No fim, os fãs das obras lovecraftianas ficarão felizes com várias menções no jogo, até mesmo com o ícone do escritor, o próprio Cthulhu.
The Infectious Madness of Doctor Dekker acerta em vários atributos, assim como erra em outros, mas talvez não seja tão abrangente para o público, principalmente pelo formato como é feito ou pela jogabilidade, que para alguns pode parecer tediosa. De certa forma, isso pode restringir o jogo a um público mais específico, mas que deve aproveitar a obra em todo seu contexto.
Veredito
Alicerçado fortemente em seus personagens e nas boas atuações de seus atores, The Infectious Madness of Doctor Dekker entrega uma história interativa agradável de acompanhar em um ritmo mais lento, sem forçar um progresso que pode atrapalhar a experiência ou deixar o jogo monótono demais a ponto de destruir agradáveis surpresas.
Jogo analisado com código fornecido pela Wales Interactive.