Em 2005, após impressionarem os críticos com um pequeno título chamado ICO, Fumito Ueda e sua equipe do Team ICO estavam preparados para alçar voos mais altos, com um projeto bem mais ambicioso e complexo. O time traria para o mundo o que seria um dos jogos mais aclamados da geração do Playstation 2. Um jogo que, anos depois, ainda seria considerado por muitos o exemplo de uma obra de arte e parâmetro para o potencial emocional que a mídia poderia alcançar. Um jogo com um legado imenso, influenciador direto e indireto de diversos jogos que viriam nos anos seguintes. Tal jogo é Shadow of the Colossus.
Em 2011, a Bluepoint Studios, desenvolvedores responsáveis pelos melhores remasters, recebeu a tarefa de remasterizar o título (junto com o seu antecessor, ICO) para o PS3. Elogiado, a jornada de Shadow parecia ter recebido sua versão máxima, com gráficos em HD e um tratamento especial pela equipe. Porém, poucos imaginavam que 7 anos depois o mesmo estúdio seria responsável pelo remake completo do título em uma nova plataforma. Mas seria possível um estúdio completamente diferente atualizar e melhorar algo considerado tão sagrado pelos fãs da obra?
Simples e direto – e para não estragar a experiência para quem não jogou –, Shadow of the Colossus conta a jornada de Wander, um misterioso jovem que adentra terras proibidas para ressuscitar a garota Mono. Buscando alguma alternativa para realizar seu desejo, ele se submete às orientações de uma voz no templo, denominada Dormin, que manda Wander caçar e eliminar 16 colossos espalhados nas proximidades. Assim, o garoto parte com sua égua Agro em busca das gigantescas criaturas, com o desesperado desejo de mudar o destino de sua amada, não se importando com as consequências.
A principal melhoria da nova versão está claramente em seu visual. Retrabalhado do zero, os cenários e modelos dos personagens receberam uma repaginação que trouxe a imersão do título a outro nível. O design e base visual continuam exatamente as mesmas, mas muitos detalhes foram inseridos, com texturas e modelos remodelados e detalhados ao máximo em uma nova engine. Alguns cenários estão completamente irreconhecíveis, como as florestas do mapa, que agora são mais densas e possuem diferentes tipos de folhagens e árvores. Os pelos dos colossos também são um dos destaques, mostrando um realismo inédito e reagindo a cada movimento dos gigantes e de Wander. O trabalho que a Bluepoint fez em modernizar o visual do jogo é sublime.
O estúdio conseguiu também maximizar a performance e possibilitar que o jogo rode em 1080p/30fps no PS4 normal e alcançando até 4K e 60fps no PS4 Pro, com duas opções de performance no Pro, priorizando taxa de quadros ou resolução. Em qualquer versão, há pouquíssimas quedas de framerate, incluindo os encontros com os colossos. Um dos detalhes que mostram a excelência técnica da versão é a possibilidade de tirar completamente o motion blur do jogo, usado na versão original para esmaecer a queda de quadros com o movimento dos personagens. Os usos dos “clarões” nos cenários também foram alterados, com um draw distance impressionante e que realça ainda mais a beleza, solidão e vastidão do mapa. Há sim algumas pequenas alterações que brilham menos que outras, como os modelos dos personagens, que parecem um pouco mais lavados e menos estilizados que os originais, em especial Wander, que parece mais jovem e com traços mais arredondados que o original.
Fora isso, Shadow of the Colossus tem uma direção de arte impecável, realçada pela nova equipe mas mantendo o trabalho que o Team ICO fez originalmente. O mundo envelhecido e morto de SotC é um personagem por si só, contando através de suas ruínas uma história trágica e silenciosa. E a parte sonora não deve em nada, com a magnífica trilha sonora de Kou Ohtani entregando o épico, o belo e o melancólico da história de Wander. A Bluepoint também incrementou os efeitos sonoros e sons ambientes, tornando tudo mais imersivo (e os colossos, ameaçadores).
Em termos de gameplay, temos algumas modernizações, mesmo se atendo às raízes do original. Agora o título oferece dois esquemas de controle (com mais duas alterações), com a opção do mapeamento clássico ou moderno do controle, simplificando alguns movimentos (para rolar, não é mais necessário apertar dois botões em sincronia), facilitando a vida para os jogadores recém-apresentados à obra.
A mira do arco e flecha está levemente mais precisa, mas ainda não é tarefa fácil acertar o ponto fraco de um colosso. Problemas com a câmera em locais fechados ainda são presentes, apesar do esforço da Bluepoint em amenizá-lo. Os controles são diferentes de um jogo de ação de mundo aberto moderno e podem oferecer uma leve estranheza para os jogadores acostumados a games do gênero atuais.
E é claro, o cerne da experiência está nos encontros com a colossais criaturas. Doze anos depois de seu lançamento, Shadow of the Colossus ainda tem alguns dos momentos mais marcantes da história da mídia. Encontrar pela primeira vez os colossos, sem saber exatamente como enfrentá-los, e ainda sentir um gosto amargo na boca ao dar o derradeiro golpe na criatura é uma experiência que oferece um leque de emoções que poucos games conseguiram replicar até hoje. O jeito cinematográfico como a câmera do jogo funciona, destacando a proporção do mundo em relação ao tamanho de Wander é de tirar o fôlego, e ainda mais com a possibilidade de tirar completamente o HUD da tela.
O corpo das colossais criaturas possui um level design por si só. Enfrentá-las se agarrando em seus pelos até a barra de energia se exaurir é um trabalho que exige paciência e frustração. As mecânicas, junto com a física e o sistema de colisão, acabam oferecendo um desafio extra, o que pode afastar muitos jogadores. Mas, ao contrário de muitos que pensam esse ser o ponto fraco do jogo, ele é na verdade o seu forte. Sua jogabilidade não convencional torna a experiência única até para pessoas acostumadas com outros jogos de mundo aberto.
Não ter assistências como câmera lock-on só tornam o momento a momento do gameplay muito mais gratificante. É todo mérito do jogador eliminar as criaturas. E também pesa a culpa de derrotá-los, ao ver magníficas entidades tombando ao final de cada encontro. O gameplay é intrínseco para a experiência e filosofia do game, e isso não pode ser mudado.
Apesar de uma campanha relativamente curta para os padrões atuais (o jogo pode ser terminado de 6 a 7 horas para quem apenas for direto aos confrontos dos colossos), o game recompensa bem aqueles que estiverem aptos a enfrentá-los em modos mais difíceis, no Novo Jogo+ e o desafio cronometrado. Além dos dois tipos de coletáveis do título original, os lagartos de cauda brilhante e as frutas espalhadas no mapa. A adição de Estatísticas para o game facilita na hora de ir atrás de tais itens, e tudo isso em uma inédita adaptação das legendas e textos para o português.
Há também novos bônus, como imagens conceituais desbloqueadas, o usual Modo Foto dos jogos exclusivos da Sony (e que mostram ainda mais os detalhes visuais do game), nova lista de troféus, um modo com o mundo espelhado e as misteriosas moedas de ouro, novo coletável no mapa que, no momento em que esta análise foi escrita, não se sabia o real propósito de pegá-las.
Veredito
Dizer que o Shadow of the Colossus original é um dos jogos mais importantes e fascinantes de todos os tempos é falar o que muitos já sabem. Mas o que ainda poucos descobriram é como a Bluepoint conseguiu, como poucos estúdios, retrabalhar visualmente um clássico e ainda assim manter a mesma essência do que o fez tão importante em seu tempo. Mesmo com algumas falhas do original, a experiência permanece fiel para os puristas e modernizada o suficiente para se tornar acessível para novos jogadores, com o estúdio retrabalhando elementos do original na medida certa.
O remake traz uma obra de arte para um novo público no PS4, mostrando a melancólica e épica busca de Wander em uma terra de colossos para salvar a sua amada. Uma jornada inesquecível e inigualável para os jogadores.
Jogo analisado com cópia física fornecida pela Sony.
Veredito
Veredict
To say that the original Shadow of the Colossus is one of the most important and fascinating games of all time is to speak what many already know. But what few have yet discovered is how Bluepoint managed, like few studios, to visually rework a classic yet retain the same essence of what made it so important in its time. Even with some flaws from the original game, the experience remains true to the purists and modernized enough to be accessible to new players, with the studio reworking elements of the original in the right measure. The remake brings a work of art to a new audience on PS4, showing the melancholy and epic quest of Wander in a land of colossus to save his beloved. An unforgettable and unparalleled journey for new and old players.