A genialidade nata vista na indústria de videogames prima pela pluralidade. Produções caríssimas, gráficos e física executando um simulacro do mundo real, porém, apesar de bem-vindos, causam impressões momentâneas de vislumbre. Acredite: as idéias mais inventivas neste segmento são de profissionais que transformam conceitos simples em diversão que contempla tanto os jogadores ocasionais quanto os que adoram se aprofundar em bons desafios. Michel Ancel é um dos desses gênios e Rayman Origins, além de marcar o retorno do célebre personagem em sua melhor forma, nos brinda com um dos melhores jogos de plataforma desta geração.
O caos instaurado em Glade of Dreams, a harmonia com tons hilários e musicais externada na abertura, precedido por conflitos instaurados por criaturas do reino de Livid Dead são ingredientes essenciais para a receita que resultou nesta peça rara, voltando às suas origens, que remontavam meados da década de 1990. Os objetivos de Rayman para livrar o seu paraíso do pesadelo, ajudar Bubble Dreamer, libertar Electoons e a ninfa Betilla, junto às suas companheiras provavelmente não prenderão o jogador devido à abordagem simplista. Entretanto, além de ser o mote para as visitas constantes às áreas de Glade, convence. Somos atacados não apenas por Darktoons, pássaros rabujentos, peixes e outros obstáculos, sempre com olhos atentos aos movimentos de Rayman e seus amigos. Alvejadas de carisma insistem em nos atingir de forma fatal nos dez mundos presentes neste título da série.
Os movimentos são típicos de jogos de plataforma. Os personagens atingem os inimigos com socos, chutes ou com o pulo clássico em cima deles. Habilidades especiais como voar por um tempo limitado, ficar em tamanho diminuto para passar por aquele espaço íngreme, andar sobre as paredes, dentre outras, são conseguidas ao liberar a já conhecida ninfa Betilla e suas colegas. Contudo, o maior mérito aqui está no level design arrojado capitaneado pela equipe de Ancel. Cada nível dos dez “mundos”inseridos em Glade of Dreams são únicos. Dificilmente você perderá aquele ar de novidade durante a jornada. Estará pegando Electoons, completando o seu medalhão, vasculhando as localidades atrás das Hidden Cages ou os diversos desafios que destravam conteúdos e personagens novos. A disposição e a riqueza de detalhes da ambientação 2D, com um outro jogo de camadas, dando a ilusão de profundidade, são peças-chave para enriquecer a experiência em Rayman Origins. O jogo em si parece uma grande brincadeira. Ele parece ser um mensageiro que vem para dizer que os jogos devem aliar compromisso e descompromisso de forma equitativa.
Ao total, aqui, temos 60 níveis. Em tese, não resultaria em tarefa fácil para os desenvolvedores trazer tanta variedade, porém eles conseguiram. Mesmo nas fases especiais com o mosquito, nas quais você tem que atirar nas criaturas ou sugá-las, apesar de a mecânica ser símile, vários acontecimentos torna cada uma dessas fases diferenciadas. Cenários remetendo a elementos como floresta, fogo, gelo, água, que são comuns em jogos de plataforma, fazem sua aparição aqui. Entretanto, eles estão baseados nas idéias mais inusitadas, uma ode ao absurdo, convertida em guloseimas ou tambores, todos bem encaixados, formando algo bem compactado. Você estará pisando em pássaros ou em um pedaço de limão preso a uma colher resmungona, num pedaço de melância ou em nuvens que se dissipam gradualmente ou enfrentando aqueles chefes que exigem uma estratégia única para serem vencidos. Todos aliados e inimigos naturais ao mesmo tempo dependendo de suas habilidades em jogos do estilo que serão arduamente testadas.
O recolhimento de lums, pequenas fadas, é obrigatório para a obtenção dos Electoons e, por conseqüência, para a progressão do jogo. Há um número específico em cada fase e o desafio de recolher todas é considerável, desde aquela lum gigante que dará a oportunidade momentânea de recolher várias de suas comparsas valendo o dobro do valor colhido, até aqueles medalhões específicos, alocados em lugares inusitados, aumentando o nível de dificuldade em pegá-los para si.
Aqui há o velho sistema de “one hit die” dos jogos de plataforma o que tornam as tarefas gradualmente complicadas conforme os níveis se tornam mais difíceis. Dependendo do inimigo, dois golpes são necessários para que Rayman inflar e a tarefa ser iniciada novamente. Para atenuar isto, além de termos checkpoints generosos, existe a possibilidade de recolher corações durante a caminhada, o que prolongará a sua jornada sem problemas. Todavia, há o limite de um coração aqui. Aliás, devido ao grau de desafio, não é raro você perceber que conforme a sua jornada, o número de lums recolhidos vai diminuindo, o que testará a sua destreza para contornar esta situação e persistir, porque o jogo premia de forma sublime os persistentes, seja com tesouros ou acessos a outros conteúdos.
Casando perfeitamente com o restante dos elementos, a trilha sonora nos presenteia com composições bem ritmadas, indo desde violinos, passando por aquela cadência de música country ou até mesmo jazz, dentre outros estilos, intercalando instrumentos com uma vocalização imersiva ao clima proposto, principalmente nas fases aquáticas.
Esta geração se encaminha para o fim e felizmente foi marcada por diversos jogos de plataforma em diferenciadas perspectivas. Entretanto, raros foram aqueles que simplesmente tinham potencial de fazer o jogador se render ao carisma e ao bem arquitetado produto final e enxergá-lo como algo divertido e ao mesmo tempo desafiante. Eu entrava naquela sala escondida para libertar Electoons de sua jaula num campo de força várias vezes não crendo que poderia ter algo diferente e eis que, devido à genialidade posta, Michel Ancel e sua equipe fizeram meus pensamentos caírem por terra de forma fenomenal. Se divertir com amigos, num multiplayer offline, mesmo com a ausência de um online, estende a experiência para os níveis de diversão mais estratosféricos ao ter a possibilidade de jogar também com Globox, Teensies e variações.
Rayman Origins alia arte e desafio de forma única. Para os que acompanharam Rayman em seus primórdios, na década de 1990, este jogo vem como uma redenção, um maravilhoso e competente pedido de desculpas da Ubisoft por ter esquecido o personagem e o feito se constranger em meio a uma “coelhice” comercial e bizarra. Isto certamente também contribuiu para a alegria vista em Glade of Dreams.
— Resumo —
+ Cativante
+ Divertido
+ Desafiante
+ Bastante conteúdo
+ Visual e trilha sonora deslumbrantes
+ Mecânicas de jogabilidade simples
+ Acessível a diversos tipos de jogadores
+ Custa 99 reais aqui no Brasil
– Demora da Ubisoft em nos presentear com este jogo único