Ah, a bendita nostalgia… não fosse aquela sensação de saudosismo que se apropria de alguns desenvolvedores, o que seria dos títulos que, para grande parte das pessoas, ficaram esquecidos nos porões mofados da história nem tão recente assim dos videogames? Zool, um relativo clássico do lendário Commodore Amiga, lançado em 1992 e que mais tarde seria portado para a poderosa geração 16 bits de consoles domésticos (para Mega Drive e SNES), tinha a meta de, como outras dezenas de personagens, conquistar um lugar no disputado panteão de mascotes. Certamente, ele não chegou a se tornar tão popular quanto seus concorrentes da época, mas o game parece ter conquistado alguns fãs no processo.
Zool Redimensioned, lançado em 2021 para PCs traça um caminho similar chegando ao Playstation 4 algum tempo depois, agora em 2023. Ainda que pareça se vender como uma remasterização, é bastante óbvio perceber que mesmo mantendo um ótimo nível de fidelidade, há aqui uma reconstrução praticamente completa na comparação com o original não só para se adequar aos padrões da alta definição, como também para poder dialogar com uma geração 30 anos depois daquela que encontrou em seu lançamento original. Basicamente, seguindo na direção contrária de muita obra recente, este pode ser compreendido como um remake disfarçado de remaster, talvez até para se vender como uma nova versão do mesmo jogo, e não uma reimaginação ou algo do tipo.
Sejam quais forem os motivos para este retorno, o game é objetivamente um típico exemplar dos padrões das aventuras de plataforma estrelados por personagens antropomórficos radicais dos anos 1990. Zool, uma criatura alienígena ágil, esguia e toda paramentada como um verdadeiro ninja, advindo diretamente da Dimensão Nth, tem a meta de salvar o multiverso dos perigos da dominação do poderoso Krool, e para tanto precisa enfrentar sete mundos distintos, superar seus perigos e, enfim, encarar os generais do terrível vilão. Um óbvio e verdadeiro clichê, mesmo para a época quando foi lançado, mas sejamos sinceros: é exatamente disso que o mercado vivia naquele momento e dá pra entender o que está tentando ser emulado aqui.
Ainda que a cena de abertura só apresente a trama se esperarmos um pouco na tela inicial, e os mais apressadinhos provavelmente só vão saber dessa história quando terminarem a campanha pela primeira vez, há, ao menos, um esforço em dar um mínimo de contexto para o jogador e, assim, tentar criar um vínculo de interesse. O grande problema aqui é que nada disso faz qualquer diferença e todo o resto parece só uma coleção de elementos temáticos aleatórios, esquecíveis e sem qualquer carisma. Se o herói da história ainda é engraçadinho e tem lá o seu charme, tudo o que o envolve é fraco, incluindo os chefes, cada qual com seus próprios poderes e habilidades, mas que importam muito pouco. Definitivamente, não é pela trama ou pela ambientação que o jogo vai conquistar alguém, como não o fez nem quando era compatível com a tecnologia mais moderna de seu tempo.
Como um típico game de plataforma, porém, ele tem suas especificidades na comparação com seus rivais mais óbvios. Ele é rápido como Sonic, por exemplo, mas é preparado para o combate a distância com disparos de tiros de energia. Isso significa que o jogador pode sim se aventurar eliminando os inimigos, um a um, pulando sobre eles, mas poder atirar projéteis muda completamente todo o modelo de combate e enfrentamento. Outra característica que está lá desde o princípio é que, tal como Knucles, Zool tem a capacidade de escalar superfícies sólidas, ampliando de forma significativa a exploração vertical de cada fase. Ele é, não se esqueça, um ninja, e tem reflexos apurados, habilidades físicas superiores e recursos interessantes para lidar com os obstáculos que irá encarar.
Chegar ao fim da fase, entretanto, pode não ser tão simples como atravessar de um ponto ao outro do mapa. Na dificuldade padrão, chamada intimidadoramente de Ultimate Ninja, é necessário coletar um número mínimo de itens dos mais diversos espalhados pelo cenário para ter o direito de conclui-lo. Basicamente, é como se em Super Mario Bros fosse necessário coletar um mínimo de moedas para finalizar o nível. Além disso, há ainda três colecionáveis especiais espalhados (muitas vezes, escondidos), que não tem efeito prático nenhum e só correspondem àquela sensação de completude que muitos de nós temos e outros tantos, não. Ao final da fase, é possível verificar as estatísticas com badges para outras conquistas, como terminar sem morrer e coisas do tipo.
Estruturalmente, também não há qualquer subversão de modelos consagrados, e temos o padrão onde cada mundo tem algumas fases, sendo a última aquela que abriga o chefão. Aqui, não são três, mas quatro delas, e nem sempre o inimigo principal está lá no finalzinho da quarta, mas é basicamente o mesmo modus operandi que já estamos acostumados. Há uma variação discrepante aqui de nível de dificuldade não em uma curva ascendente como se espera, mas com uma certa variação menos óbvia e, confesso, não sei se intencional. Fato é que há chefes com padrões de ataque bem simples e fáceis de se aprender, e outros bem mais complicados, tal como fases iniciais que, por vezes, são muito mais complexas que outras já no mundo final. Uma curva de aprendizagem, no mínimo, diferente.
Há uma contagem de vidas, mas elas são importantes somente no caso de morte em checkpoints avançados, já que quando elas terminam, você simplesmente volta do começo da fase atual com outras cinco novas chances. Com save automático e possibilidade de se repetir fases superadas a qualquer momento – seja para buscar todos os colecionáveis, acumular mais vidas ou só por diversão mesmo – essa versão jamais se esforça para que o jogador se sinta realmente punido. E se ter um modo mais fácil (chamado de Redimensionado e escancaradamente dedicado a iniciantes no gênero ou crianças pequenas) já não era suficiente, há ainda um menu de assistências onde se pode habilitar invencibilidade, salto duplo infinito, disparos em turbo e outros facilitadores dedicados a quem só quer simplesmente sair andando por aí e, sem querer querendo, terminar o jogo. Para quem já conhece o gênero, porém, a dica é que o normal já é muito fácil e garante a obtenção de troféus. Só não espere uma platina rápida, porque o jogo não tem essa conquista.
O maior facilitador do game, porém, está exatamente na característica destacada no título. Ao redimensionar a tela do jogo (por padrão, a câmera está muito mais distante do que era no original), a visão sobre o ambiente é ampla o suficiente para evitar surpresas, sejam inimigos à espreita, sejam salas e caminhos escondidos. É fácil descobrir uma parede destrutível, por exemplo, que esconde um item raro porque dá pra ver tudo o que tem do outro lado sem esforço. Há como escolher o enquadramento original no menu de opções, escolha que está ao lado de um filtro que deixa o jogo com aspecto mais lavado típico dos monitores da época, mas além de deixar as coisas só mais borradas, o recurso parece deslocado e é quase que só um fan service feito para agradar puristas mais rígidos.
Dinâmico e cheio de caminhos possíveis, o jogo é um grande acerto no que diz respeito à precisão. Pular em plataformas estreitas pode parecer complicado á primeira vista, mas em dois ou três minutos já estamos nos equilibrando na ponta se agulhas sem qualquer complicação. Na pior das hipóteses, como é fácil escalar quase todas as paredes, tentar duas ou três vezes, no máximo, não é nenhum incômodo. Além disso, o jogo se apropria muito pouco de armadilhas como buracos ou coisas assim, então tirando uma ou outra superfície com água e alguns pisos de espinhos aqui e ali, cair nunca chega a ser um problema real. As vezes, aliás, é a solução pra encontrar um caminho melhor, itens novos, vidas e power-ups, daqueles que nos tornam invulneráveis por algum tempo (com direito a um efeito com um monte de estrelinhas que envolvem o personagem) ou nos permitem pular mais alto por alguns segundos. Mesmo que desajeitado, o design de níveis do jogo é caótico de um jeito divertido e inesperado.
A escalada, porém, é tão prática que chega a incomodar. Não foram raras as vezes onde eu, quase que instintivamente, pulava entre o inimigo e a parede atrás dele para surpreende-lo com um ataque pelas costas e, ao invés disso, se caísse um pouquinho que fosse deslizando pela superfície vertical, ficava grudado por uma fração de tempo geralmente suficiente para errar o golpe e, quiçá, tomar um contra-ataque vergonhoso. Questão de adaptação e expectativa, eu sei, mas ficar grudado na parede quando a intenção é uma queda livre pode ser frustrante. Já deslizar quase que como um mini-dash – o que pode ser feito tanto apertando pra baixo como o círculo enquanto se está correndo – é muito pouco explorado quando procuramos por caminhos diversificados e acaba funcionando muito mais pra fazer um belo combo em ladeiras íngremes.
A falta de profundidade de campo também contribui para algumas escapadas bobas, erros inocentes ou mesmo apanhar por simplesmente não ver o inimigo chegando. O estilo artístico pixel art de Zool Redimensioned não economiza no uso de cores e de saturação para representar os mundos malucos pelos quais passamos, desde aquele feito de doces e guloseimas onde o perigo está em um pirulito à espreita, passando pelo musical com discos (de vinil) voadores e violinos assassinos, indo desembocar, depois de outros lugares estranhos, na clássica floresta que, claro, tem bananas gigantes disparando bananinhas contra nós. É tudo vibrante, intenso e até psicodélico em alguns momentos, mas tudo parece estar chapado no mesmo plano, e as coisas se misturam de forma incômoda principalmente quando tem muita ação acontecendo em tela. Sem querer querendo, as coisas se embaralharem compensa, em um ou outro momento, a amplitude do campo de visão. Mas de uma forma ruim.
A trilha sonora é outro elemento que merecia uma leve atualização, já que não é ruim e, por vezes, até empolga e adiciona um tempero leve e dinâmico ao game, mas parece curta demais, o que consequentemente a torna repetitiva ao extremo em fases um pouco mais alongadas ou que nos prendemos mais à exploração dos cantinhos escondidos. Sem um trabalho de vozes, óbvio, e com efeitos e ruídos apenas cumprindo seus papéis, não há muito o que celebrar, mesmo que as composições sejam assinadas pelo veterano da indústria Patrick Phelan, também creditado em jogos como Top Gear 2 e Alone in the Dark, dentre muitos outros. Esteticamente, portanto, há um nível de ousadia non sense tanto na parte visual como na sonora, mas que oferece um resultado instável e mediano.
Para os mais empolgados, o jogo ainda tem toda uma sessão de mini games casuais para se jogar com mais uma pessoa localmente, com tarefas bobas como arremessar uma bola no alvo mais vezes que o adversário, e acabei passando muito mais tempo do que imaginaria neste complemento, o que se configura como um bom valor intrínseco da vida útil do jogo que pouco vi em propostas do tipo. Colecionáveis, mini-games competitivos, uma galeria bem feita, tudo mostra bastante capricho e uma certa paixão que certamente guiaram os desenvolvedores a retomar a marca tanto tempo depois. Se a nostalgia é um agente transformador que dispara a ignição de projetos assim, é o verdadeiro apreço que faz com que o resultado seja mais do que só um port oportunista que aposta nas memórias afetivas do público. Aqui, mais do que em jogos de maior sucesso popular, só o apelo ao fã não seria suficiente. Ainda assim, é possível que Zool Redimensioned e suas tradicionalices esquisitas não seja o suficiente, na comparação com tantas outras opções modernas, para alcançar novos adeptos.
Jogo (versão de PS4) analisado no PS5 com código fornecido pela Secret Mode.
Veredito
Zool Redimensioned traz de volta uma marca esquecida no tempo 30 anos após seu lançamento original, destacando-se por uma jogabilidade ainda afiada, um estilo gráfico intenso, e algumas adaptações pontuais para modernizar a experiência. No entanto, algumas adições que mexem com a dinâmica do jogo e a falta de outros ajustes necessários desfavorecem o game sobretudo na comparação com os seus rivais de outrora e com exemplos mais recentes do gênero.
Veredict
Zool Redimensioned brings back a brand forgotten in time 30 years after its original release, standing out for its still sharp gameplay, an intense graphic style, and some adaptations to modernize the experience. However, some additions that interfere with the game’s dynamics and the lack of other necessary adjustments put the game at a disadvantage, especially in comparison with its rivals of yesteryear and with more recent examples of the genre.