A imensidão de possibilidades para o universo de Star Wars é algo que talvez jamais poderemos mensurar. De todas as histórias já contadas nas mais diversas mídias, nem mesmo George Lucas poderia imaginar o quão aberto a novidades sua criação poderia estar. Apesar das décadas de conteúdo e uma vastidão de períodos e personagens já usados, sempre parece haver espaço para mais.
Conhecida primariamente pelo seu trabalho na franquia The Division e mais recente por Avatar: Frontiers of Pandora, a Massive Entertainment assume a responsabilidade de entregar o primeiro jogo de mundo aberto para a franquia tão famosa. Indo além disso e até como oportunidade de resposta às críticas que os diversos jogos da Ubisoft vem recebendo, Star Wars Outlaws é a promessa de uma inovação no estilo de mundo aberto junto de uma aventura esperada por diversos fãs.
Star Wars Outlaws conta a jornada de Kay Vess, de uma ladra comum em Canto Bight (a cidade cassino de Os Últimos Jedi) e sua ambição de ser algo muito maior na galáxia, como vários outros heróis de suas próprias histórias nesse universo. De um roubo mal sucedido e eventos desencadeados sem muito controle, Kay e seu fiel parceiro Nix, um pequeno e astuto merqaal, a dupla se vê lançada pela galáxia numa verdadeira odisseia nada planejada.
Ainda que muitos detalhes sobre a história não daremos aqui por motivos de spoilers, os eventos iniciais do jogo se desenrolam ao ponto de Kay se tornar quase uma mercenária independente, o que chama a atenção de aliados interessados em realizar o maior roubo de toda história da galáxia. Sendo assim, parte da aventura circula na criação da equipe perfeita para o trabalho, juntando as peças e recursos necessários em diversos locais e planetas, coletando tanto parceiros quanto ativos únicos para a missão lendária.
Acredite, como toda e boa história que deseja se afastar da tradicional e consolidada narrativa de jedis contra sith e todo o embate entre repúblicas, ordens, rebeldes e mais em diversas épocas, Outlaws apresenta como novidade para Star Wars algo similar a produções que tendem a arriscar fora do trivial aqui, como algumas obras em HQ e, principalmente, a série Andor. Inclusive, fica aqui o alerta e recomendação para acompanhar a série de algo que, a princípio, não deveria adicionar tanto ao material geral já que muitos de nós sabemos o destino final de muito dessa história. Entretanto, e já me estendendo nisso, Andor mostra com uma ótima narrativa e desenvolvimento consegue prender fãs de um universo que quase sempre foi comprado por muitos como blasters e sabres de luz.
Outlaws entrega uma história envolvente e que cativa muito pela originalidade de sua protagonista e diversos personagens que surgem pelo caminho, sem se esquecer do excelente Nix, enquanto uma trama maior vai sendo construída. Enquanto Kay se desenvolve à medida que o trabalho em si cresce e novos integrantes vão se juntando para a tarefa, suas aspirações pessoais vão surgindo, mesmo que de forma leve, criando a personagem cativante e durona que o jogo entrega. Além disso, sua parceria com Nix é algo simplesmente sensacional, mesmo que a ferinha seja usada para as mais diversas ações, acaba contribuindo para mostrar o laço de afetividade familiar pouco visto na franquia.
O mesmo não pode ser dito para todos os personagens que aparecem por toda a jornada. Por exemplo, o droid ND-5 tem suas aparições e falas sempre certeiras em diversos momentos, mesmo não estando presente diretamente em boa parte do jogo. Entretanto, outros personagens que poderiam ter o mesmo destaque só surgem em sua cadeia de missões e não parecem tão bem utilizados após isso, com alguns apenas aparecendo para dizer que ainda estão presentes na trama. Falta um certo equilíbrio para que mais personagens secundários tivessem um destaque maior por toda a história.
Em resumo, a história pode não ser das mais mirabolantes quando vemos o escopo geral do grande roubo apenas, sem entrar em mais detalhes, mas possui tudo aquilo que se espera de uma aventura Star Wars. Aliados e companheiros únicos, histórias divertidas e trágicas, traições e reviravoltas, assim como eventos inesperados e surpresas extremamente positivas. É uma aventura digna do que esse universo já apresentou ao longo de décadas, sendo mais uma das que precisam se destacar acima até de grandes produções recentes da franquia.
Quanto à jogabilidade, Outlaws se fundamenta em alguns pilares que sustentam o que seria a vida do mercenário galáctico. De posse de um blaster modificado para várias ocasiões e perita na arte da furtividade, Kay usa diversos artifícios para lidar com seus inimigos e alcançar seus objetivos, principalmente Nix e suas ações. Roube inimigos, desative painéis e portas, recolha itens e armas ou sabote alarmes, Nix é um dos melhores parceiros já vistos nos jogos. Além disso, o carisma que exala do pequeno alien é algo único e, reforçado por uma parte da história focada nele, deixa claro que não é apenas um realizador de tarefas ali.
Algo a se apontar é que claramente Kay e Nix ficam muito fundamentados ao estilo de jogo furtivo (stealth). Há inúmeras partes de ação por combate direto no jogo, eventos em missões mais focadas nisso e mais, mas nada sobressai ao investimento do jogo na questão furtiva. Em partes, principalmente para alguém como eu que nunca foi fã de jogos que se baseiam quase exclusivamente nisso, o jogo tende a se estender demais em tais ações e só equilibra isso com uma outra quantidade tão grande de exploração, com o combate sendo um evento terciário. Isso não quer dizer que não aconteça, como já dito, mas que nem de perto o combate direto se iguala à furtividade e exploração de mundo.
E já falando em mundo, aqui é preciso parabenizar a Massive por tentar mudar o padrão Ubisoft para jogos de mundo aberto. Sem muitas indicações no mapa, interface principal poluída ou o famoso ato de pegar na mão do jogador e o levar na direção necessária, Outlaws deixa muito a cargo da curiosidade e investigação o ato de popular e apresentar as atividades possíveis. Ouça uma conversa aleatória para descobrir uma carga escondida ou leia um documento para saber que algum personagem possui itens importantes e vá atrás disso por conta própria. Esbarre em informações aqui e ali sem precisar de nenhum direcionamento por parte do jogo que não seja para a linha principal de missões. A sensação é de uma renovação necessária para um lado mais interessante, ainda que não reinvente o estilo ou faça grandes mudanças.
Kay vai explorar planetas famosos e novos, andar por eles com seu speeder em busca de tudo o que for necessário para sua tarefa, assim como navegar com a Trailblazer pelo espaço, órbitas planetárias e mais pela Orla Exterior. A junção de combate e furtividade com os pés no chão, ação e exploração sob o speeder e os combates e buscas espaciais dentro de sua nave são os grandes fundamentos da jogabilidade apresentada, com todos funcionando de forma excelente.
Mesmo a evolução desses três fundamentos acontecem de forma bastante interessante, com Kay buscando aliados especialistas que vão ajudar em áreas críticas para cada vertente da jogabilidade. Melhorias para a Trailblazer virão de um aliado único e com habilidade exclusivas para isso, assim como Kay se tornando cada vez melhor no uso do blaster pela ajuda de um parceiro perito nisso. Sai de cenas as árvores de habilidade e inúmeros nodos para entrar ações mais direcionadas e que dependem que o jogador realize tarefas condizentes para a liberação das mesmas.
Uma parte importante é como Kay se relaciona com os diversos sindicatos, clãs e cartéis da Orla Exterior enquanto busca seus objetivos. Dos quatro presentes, sendo os Pykes, Aurora Escarlate, os Hutts e os Ashigas, as ações do jogador podem ter impacto em mais de um deles ao mesmo tempo. Feche um contrato para espionar os Hutts para os Pykes e, caso seja descoberta, veja sua relação com ambos despencaram. Traia um dos clãs durante uma missão para favorecer outro enquanto muda os termos iniciais para outros mais vantajosos e aguarde alguma represália. Enquanto todos sempre ficarão abertos para negócios com Kay independente do seu nível de confiança, a colaboração total dos mesmos pode não ser tão valiosa como em outras missões.
Há escolhas que o jogador toma que impactam na balança do equilíbrio para essas relações, mas também é possível dedicar um grande investimento de tempo e recursos para, tanto se tornar completamente amada ou odiada por todos ao mesmo tempo. Itens exclusivos, contratos, missões e recursos estarão ou não disponíveis mediante isso, fazendo com que o jogador sempre possa mudar sua direção conforme sua necessidade ou desejo particular de criar um caos controlável.
Além das facções apresentadas, como o jogo se passa entre os filmes O Império Contra-Ataca e O Retorno de Jedi, o Império Galáctico também estará presente. Agindo muito mais como uma facção à parte e no papel da “polícia local”, os stormtroopers e suas variações serão um desafio constante em diversas missões e atividades em cada local que o jogo apresenta.
Aqui também é possível reforçar algo que pode ter faltado um desenvolvimento extra para criar uma variação maior ainda para as atividades do jogo. Enquanto o combate contra o Império sempre vai ser mais trabalhoso do que o restante, muitas das suas missões vão se basear na mesma estrutura de todas as demais. Como o foco do jogo é maior em ações de furtividade, pense em atividades de forma geral que vão seguir isso. Plante uma escuta, acesse um local sem ser descoberto, extraia um item sem alarmar ninguém, roube e entregue em certo tempo algum recurso e muito mais. Se você parar para analisar as diversas atividades relacionadas ao estilo furtivo, todas estarão presentes aqui e sem muita variação daquilo que já foi visto em outros jogos. Não é algo ruim, mas após umas 20 horas de jogo, o que vai ser pouco mais da metade na campanha principal, é possível perceber o padrão usado e não esperar muito mais além disso.
Há ainda diversas atividades secundárias e mais que podem preencher o tempo do jogador e o fazer “dar um tempo” na sua jornada principal. O jogo de cartas de Sabaac e minigames estarão espalhados pelos vários locais do jogo. Negociação e equipamentos de Kay também serão um dos atrativos e podem representar muito mais do que itens de construção e visual, servindo para aprimorar ferramentas diversas ou entregar bônus e perks úteis.
Algo para que todo fã de Star Wars possa presenciar e aproveitar aqui é o tamanho cuidado da Massive ao trazer diversos detalhes do universo para o jogo. Da construção de mundos aos planetas e órbitas, NPC’s, raças, itens, locais, cidades e mais, Star Wars Outlaws é impecável ao representar de forma fiel tudo o que já vimos antes. Reforçado pelo estilo visual e efeitos sonoros, da trilha sonora expandida da original de John Williams para a trilogia original e da qualidade técnica entregue pela Massive, o jogo é uma das melhores representações jogáveis do universo. Confesso que ao aterrissar em Tatooine pela primeira vez e explorar o deserto, assim como andar por Mos Eisley, foi de uma sensação nostálgica ímpar.
Se quisermos olhar agora um pouco para a parte técnica, temos que analisar principalmente o uso da engine Snowdrop em outros jogos. Principalmente em The Division 2, a engine entregava bom visual e com qualidade, mas possuía problemas em efeitos de fogo, fumaça e mais. O mesmo é presente aqui e, no que parece ser um sacrifício maior para os enormes mapas do jogo, diversos efeitos assim podem apresentar uma qualidade baixa. Splashs de água, principalmente, são bastante pixelados no mundo aberto. Há também uma boa quantidade de artefatos visuais quando o jogador movimenta a câmera enquanto anda de speeder em velocidades maiores.
Possuindo de ter três modos visuais disponíveis e após testar todos, decidi pelo que parecia ser a melhor opção ao entregar visual de qualidade e desempenho satisfatório, sendo o que entrega o modo Qualidade com foco nos 40 quadros por segundo. O uso de VRR por parte da TV melhora a experiência de forma geral sem comprometer a qualidade, sendo a mesma opção que usei para Marvel’s Spider-Man 2. Enquanto o Qualidade padrão trava os 30fps para uma imagem melhor, o Desempenho me pareceu o que cria a maior quantidade de artefatos e efeitos de baixa qualidade.
Vale ressaltar também o ótimo trabalho de dublagem para o português brasileiro. Com vozes que combinam bem com os personagens e até mesmo estilos e ajustes para diversas raças terem seus próprios sotaques e idiomas, o trabalho é excepcional. A tradução de textos tem alguns tropeços no que seria uma falta de revisão ou apenas deslizes na tradução de alguns termos, com alguns até mesmo podendo jurar que foi somente feito o trabalho de adaptação via inteligência artificial.
Star Wars Outlaws é de uma qualidade excelente em praticamente todos seus aspectos, mesmo que alguns precisassem de uns ajustes e polimentos a mais. Personagens principais cativantes, uma história que combina com o universo e uma jogabilidade bem executa ditam o ritmo de uma aventura que representa Star Wars da melhor maneira possível e que ainda revigora a fórmula de mundo aberto de uma empresa já bombardeada por pouco melhorar isso. Fã ou não, Outlaws é um dos melhores jogos do ano e um dos melhores para um universo tão rico da indústria do entretenimento.
Jogo analisado no PS5 com código fornecido pela Ubisoft.
Veredito
Outlaws é uma aventura fantástica digna do universo de Star Wars. Competente em várias áreas e chacoalhando a fórmula Ubisoft de mundo aberto para seus jogos, a aventura de Kay Vess é divertida e interessante do início ao fim, recheada de detalhes únicos de um universo incrível.
Star Wars Outlaws
Fabricante: Massive Entertainment
Plataforma: PS5
Gênero: Ação
Distribuidora: Ubisoft
Lançamento: 30/08/2024
Dublado: Sim
Legendado: Sim
Troféus: Sim (inclusive Platina)
Veredict
Outlaws is a fantastic adventure worthy of the Star Wars universe. Competent in several areas and shaking up Ubisoft’s open-world formula for its games, Kay Vess’s adventure is fun and interesting from start to finish, filled with unique details from an incredible universe.