Rivalia: Dungeon Raiders – Review

De um lado, monstros, criaturas sombrias, feiticeiros e dinossauros. Do outro, guerreiros, espadas místicas, magia, honra e heroísmo. Tudo isso em uma grande aventura imersa na mais clássica fantasia medieval. Tem como isso dar errado? Infelizmente, tem. Rivalia: Dungeon Raiders tem alguns dos ingredientes que eu mais aprecio em jogos, sobretudo os de ação com pitadas de roguelite e doses generosas do bom e velho RPG, mas infelizmente a soma de tudo isso não é suficiente quando não é sustentada por uma base de jogabilidade sólida, uma história minimamente coerente ou um visual especial.

No jogo, encarnamos um grupo de quatro personagens: Yhorm, um guerreiro brutamontes; Evanya, uma maga de suporte; Halmor, um típico ladino; e Ashelin, uma habilidosa espadachim líder do grupo. Não é necessário deixar evidente que os desenvolvedores investiram no que há de mais tradicional e trabalharam os arquétipos históricos do gênero sem quaisquer nuances ou invencionices. O grandão é o tank lento mas parrudo, o ladrão e a feiticeira são vulneráveis, mas ágeis, e a protagonista é um ponto de equilíbrio entre um extremo e outro. Não espere qualquer traço de personalidade que divirja de qualquer história que você já tenha visto antes.

O mesmo vale para um fiapo narrativo que mal se sustenta e, sinceramente, importa tão pouco que eu só prestei atenção para poder falar dela nesta análise. Estamos em Rivalia, um castelo que está sob o julgo de uma distorção de realidade que infestou seus corredores com um exército de inimigos impiedosos. São reunidos quatro valorosos heróis cujo objetivo é, claro, varrer os adversários, descobrir a fonte do desequilíbrio e trazer a paz novamente ao reino. Ouso afirmar que esta sinopse, aliás, me traz um esforço maior do que aquele que foi destinado para a redação do texto sonolento que explica esta mesma trama dentro do game.

O tom épico sugerido não esconde a falta de envolvimento ou de qualquer esforço na promoção da imersão neste mundo genérico e pouco preocupado em construir uma mitologia própria minimamente convincente, se mostrando muito mais uma colagem de coisas individualmente legais (e outras nem tanto) do que algo coeso, um universo verossímil. A impressão aqui é similar aquele momento da infância onde temos alguns brinquedos aleatórios e tentamos juntar todos em uma historinha boba só pra justificar um boneco lutando contra o outro no melhor estilo Toy Story, só que em Rivalia, isso funciona de um modo desajeitado e tedioso. Então no mesmo corredor vamos enfrentar algumas caveiras, velociraptors, bolhas amorfas e olhos gigantes com asas de morcego, que as vezes nem parecem ter sido feitos pela mesma equipe. O motivo deles serem parte do mesmo exército eu não sei, e parece que nem mesmo quem os colocou lá sabe.

Uma história insuficiente, porém, não precisa ser um problema necessariamente, porque em certas experiências vale a pena sair enfrentando ameaças absurdas em uma jornada com batalhas incríveis do bem contra o mal, só porque sim. É aí que Rivalia: Dungeon Raiders perde a mão de vez, porque são suas mecânicas que pior se saem no conjunto. Há uma série de boas ideias aqui, como personagens realmente únicos com habilidades distintas e diversificadas, sem complicações ou burocracias indesejadas. Cada um deles, inclusive, já tem desde o princípio um arsenal de ataque básico e esquiva, além de habilidades individuais com buff de tempo muito úteis e graficamente interessantes, mesmo que já as tenhamos visto centenas de vezes em qualquer outro jogo do tipo. Evanya tem o poder de cura em área, Halmor pode alternar entre adagas e arco, Ashelin pode emitir ondas de fogo e assim por diante.

Contudo, tudo isso funciona pouco não pela efetividade em si, porque um pouco de prática e dedicação serão suficientes para que se chegue ao final do sexto nível e se vença o chefe final, mas porque a jogabilidade é lenta, tem pouco peso, é imprecisa e mesmo quando funciona, é chata. Os primeiros segundos do jogo denunciam vários desses sentimentos, como a obrigação de segurar um botão não para correr, mas simplesmente para se mover com uma velocidade minimamente aceitável, porque a caminhada padrão é absurdamente lenta. Isso garante que se gaste estamina para qualquer locomoção, não que isso seja um problema já que pouco se precisa percorrer de espaço entre um bolsão e outro para encontrar algum agrupamento de monstros. Dito isso, andar já é um martírio, e parece muito esforço proposital do jogo em ser modorrento.

Esta sensação se mantém em estado de batalha, onde os movimentos são repetitivos com combos mínimos, precisão pífia e loopings intermináveis de soco-soco, bate-bate onde estamos sempre brigando com os controles para estar na zona de alcance de nossos inimigos, o que só comprovamos pela barra de vida baixando porque impacto mesmo, não causamos nenhum. Mas como nem tudo é ruim, poder alternar a qualquer momento entre os quatro bravos heróis minimiza a sensação de repetitividade e oferece um pouco mais de variação de luta. Como não é possível dar qualquer comando para os seus companheiros, por vezes é necessário assumir um deles para usar suas habilidades em prol do grupo, mas quase sempre eles abusam do mana e de seus especiais, com uma inteligência artificial que, por ser pouco exigida por inimigos tapados, não compromete o conjunto.

Em termos de estrutura de jogo, temos aqui a aula inicial de uma cartilha de como fazer um roguelite: depois de um tutorial básico que introduz conceitos de jogo, somos jogados no hub principal, uma área aberta para comércio, preparação e produção de itens e consumíveis. Poderia ser um lugar tranquilo para conversar com NPCs e até companheiros para conhecê-los melhor? Sim, mas talvez eu esteja esperando demais do jogo, culpa minha. Feitos os ajustes, há um portal que nos leva para qualquer um dos seis níveis disponíveis, que ficam acessíveis depois se se vencer o anterior. Um modelo linear, mas que permite revisitar aquilo que já foi superado para um necessário e esperado loot de itens, dinheiro e recursos primários.

Uma vez que escolhamos a fase, ela é gerada proceduralmente, garantindo um certo frescor a cada visita. Mas, de novo, nem tanto. Elas basicamente só mudam modelos fechados de salas e instalações de lugar, em um pretenso sistema labiríntico protocolar. Cada bloco tem um grupo de inimigos específicos daquele lugar e a meta é vencer todos, seguir para o próximo ponto e assim por diante até chegar na sala do chefe de fase. Cada um dos seis é interessante por si (se desconsiderarmos a aleatoriedade de cada um deles que não faz nenhum sentido com os demais), que mantém o modus operandi, com um padrão de ataques e uma barra de vida bem longa. Aprenda movimentos e bata até que a vida dele acabe. E quando estiver mais forte, repita isso exaustivamente para conseguir mais matéria-prima.

Ao superar um nível, voltamos automaticamente para o hub e o ciclo recomeça. Aliás, já que estamos no ponto de encontro novamente, explico melhor o que pode ser ajustado aqui. Habilidades, golpes e movimentos são fixos do começo ao fim. A personalização de cada protagonista se resume ao uso de runas em cinco slots para cada. Essas runas podem ser conquistadas em combate, encontradas em baús espalhados pelos níveis ou produzidas com os ingredientes certos e dinheiro. Há uma lista bastante extensa de categorias, cada qual com seus benefícios em certos atributos, e algumas delas tem efeitos negativos também. Uma pode, por exemplo, aumentar pontos na barra de vida, uma porcentagem na barra de mana, mas diminuir a resistência. Outra pode melhorar a sorte e a defesa, mas retirar pontos de força.

Como são cinco slots, é possível equipar cinco peças da mesma categoria (o que dá um efeito extra e específico) ou runas de diferentes origens, o que dá a chance de que realmente cada personagem seja bastante único e adequado ao estilo do jogador. Eu preferi fortalecer aquilo que já é nato de cada um deles, por exemplo, o que significa aumentar ainda mais a resistência do grandalhão e favorecer magia e mana da minha feiticeira. Também experimentei compensar fraquezas invertendo isso, e funciona relativamente bem de uma outra forma. Esse estudo de como compor o kit rúnico de cada um deles demanda tempo e realmente oferece uma camada de profundidade que agrega valor à preparação, fugindo de ficar só no óbvio (e também presente) quanto mais nível, mas forte.

Outro ponto importante é a fabricação de poções consumíveis que não vão divergir do que já conhecemos também. Há aquela que recupera parte ou a integralidade da barra de vida, ou da barra de mana; as de ressuscitar aliados caídos, a de aumentar temporariamente alguma característica em batalha, e assim por diante. Tanto poções quanto runas precisam de certos ingredientes que são despejados aos litros ao derrubar inimigos, então na falta de algum, basta voltar ao nível onde eles são encontrados em abundância e repeti-lo, sempre tomando o cuidado de que se perdermos os quatro heróis em uma run, todo o loot nos é tomado. Ate é possível comprar um ou outro com o mercador, mas ele tem tão poucas coisas que raramente encontraremos com ele os itens dos quais precisamos.

Em outras palavras, para quem gosta dos ciclos comuns de repetição, o jogo está totalmente baseado neles, e ganha algum valor ao permitir que se jogue em rede com outras pessoas em cada uma dessas incursões, ainda que eu não tenha encontrado partidas nesse período em que estive o avaliando. Repetição aumenta monstruosamente a vida útil do jogo, mas com ambientes, mesmo com o fator aleatório, pouco inspirados; uma galeria de inimigos relativamente vasta mas pouco atrativa; e um combate bem mequetrefe, ser incentivado a retornar várias vezes não significa qualidade de vida. Ao contrário, fiquei forçando seguir para níveis mais avançados e difíceis várias vezes sabendo que não estava preparado para eles só pela pouca paciência em garimpar nos anteriores, um sentimento fatal para um jogo que preza pelo modelo roguelite.

Não ajuda o fato de que cada cenário tem aquele efeito de ser bonitinho, mas ordinário. Em um primeiro momento, cores e formas se destacam, reluzem, tornam uma biblioteca ou um cemitério lugares que nos seduzem a visitá-los. O jogo é cheio de pontos brilhantes, efeitos de partículas como fumaça e névoa, e tem alguns elementos curiosos, como pombos gigantes dormindo em currais ou corredores em ruínas. Mas basta se aproximar um pouco e o encantamento se esvai pela pouquíssima interação com ambientes (resumida a baús e a quebra de poucas caixas e vasos) e principalmente texturas pobres e bem econômicas. Uma pilha de moedas douradas, de perto, se mostra um grande borrão amarelo; enquanto pedras, livros e arbustos são basicamente blocos coloridos. Tanto faz um lago tranquilo ou uma corredeira de lava, nada tem movimento ou fluidez, salvando-se só um sistema de iluminação que ao menos oferece boas sensações de temperatura de cor.

Salvam-se alguns designs de personagens, e o bom uso de um cel shading que emula uma estética anime, mas que quando coloca heróis diante inimigos tão pouco trabalhados (sério, a bolha de geleca que estica e encolhe é uma ode à preguiça), só evidencia o pouco investimento técnico, mas principalmente criativo em construir um mundo que seja minimamente encantador como demanda o gênero. Simplória também é a trilha sonora, com basicamente duas canções se intercalando quando tem e quando não tem inimigos na tela, que seguem aquele padrão bardo medieval, mas que pouco oferece em termos de complexidade musical. Efeitos sonoros, ruídos e outros artifícios, quando muito, cumprem a burocracia que se espera deles, mas nada que se destaque de verdade.

Mesmo que tenha algumas boas intenções, Rivalia: Dungeon Raiders infelizmente pouco faz para se realizar enquanto jogo em qualquer dos seus aspectos principais. Falta-lhe originalidade, falta-lhe solidez mecânica, falta-lhe uma identidade artística que ao menos valorize suas generalidades, mas sobretudo falta-lhe coração. Desenvolvido dentro da ótima iniciativa Playstation Talents provavelmente por demonstrar um certo potencial no papel, este é daqueles games que parecem reunir alguns bons ingredientes de uma receita quase infalível, mas que sem qualquer tempero mais ousado, se torna só mais um produto medíocre em um concorrido mercado que oferece soluções muito mais instigantes.

Jogo (versão de PS4) analisado no PS5 com código fornecido pela Gammera Nest.

Veredito

Rivalia: Dungeon Raiders reúne ideias já sedimentadas no mercado, mas pouco faz com qualquer uma delas. Sem se destacar em qualquer aspecto, é funcional, cumpre o protocolo, mas jamais passa disso, e isso é pouco, muito pouco.

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Rivalia: Dungeon Raiders

Fabricante: Fsix Games

Plataforma: PS4

Gênero: RPG / Ação / Roguelite

Distribuidora: Gammera Nest

Lançamento: 05/10/2022

Dublado: Não

Legendado: Não

Troféus: Sim (inclusive Platina)

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Veredict

Rivalia: Dungeon Raiders gathers ideas already established in the market, but does little with any of them. Without standing out in any aspect, it is functional, it does the basic, but it never goes beyond that, and that is little, very little.