Tentar homenagear JRPGs clássicos da quarta geração de consoles é uma tentativa sempre válida e que muitos desenvolvedores independentes têm almejado fazer ao longo desde que as lojas digitais facilitaram a distribuição de jogos pelas desenvolvedoras. Obviamente, se inspirar em títulos como Final Fantasy VI, Breath of Fire II ou Chrono Trigger é um bom ponto de partida, mas um que traz um imenso peso em termos de expectativas.
A pequena desenvolvedora americana Stegosoft Games tem criado seu próprio nicho desenvolvendo jogos nesse estilo, primeiro com o seu título de estréia em 2020, Ara Fell, e agora com o seu segundo título, o recém-lançado Rise of the Third Power. Enquanto seu título anterior era mais uma reinterpretação de clássicos RPGs de Estratégia, RotTP tenta reinventar o que um tradicional RPG por turnos pode ser em 2022.
Pra minha grata surpresa, RotTP consegue fazer aquilo que se propõe com um êxito considerável. A sensação que se tem é realmente de estar jogando um título fortemente inspirado em clássicos de eras passadas, mas retocado com sensibilidades modernas e as melhorias de qualidade de vida que se espera de um título desses hoje em dia.
Um dos pontos que mais contribui para o êxito do jogo é algo que se percebe desde os seus primeiros momentos: trata-se de um título que exala charme em cada pequeno detalhe. Da trilha sonora ao visual, da escrita de cada diálogo à ambientação, o cuidado em torná-lo único é refletido em todos os aspectos da experiência.
Esse tipo de detalhe é especialmente bem-vindo já que, em sua premissa, Rise of the Third Power não é exatamente revolucionário. Sua narrativa acontece em um mundo recém-saído de um estado de guerra, celebrando um aguardado período de paz após a assinatura de um tratado entre os diferentes reinos do mundo. É claro, a paz é só um estado temporário e forças sombrias planejam por trás dos panos para lançar o mundo novamente sob o caos.
Como uma última tentativa de salvar o mundo, um grupo rebelde rapta a princesa de Cirinthia às vésperas do seu casamento com o príncipe de Arkadya, um casamento que, supostamente, foi feito para reforçar a paz entre os reinos de Rin. No entanto,a união é meramente parte dos planos do imperador Noraskov para ganhar ainda mais força em sua jornada para fazer com que Arkadya volte a sua glória do passado.
Cabe ao jogador, então, assumir o controle dos bandidos, Rowan e Corrida encarregados de sequestrar a princesa Arielle no dia do seu casamento e levá-la ao encontro dos líderes das forças buscando evitar uma nova Grande Guerra no mundo. Arielle é parte importante do plano para salvar Rin, cabendo aos rebeldes convencê-la a ajudá-los, apesar dos seus métodos um tanto quanto… arrojados para tal.
É um plot relativamente simples, mas que funciona dentro do contexto do jogo, graças, principalmente, ao carisma dos personagens. Sua principal força fica por conta do quão bem escrito o jogo é, com os diálogos tendo o tempo de duração precisamente necessário, jamais se alongando mais do que deveria, e misturando bem pitadas de leveza mesmo em momentos mais tensos da narrativa.
O mundo parece vivo, os personagens têm suas próprias personalidades e as interações entre eles parecem naturais e vivas. Isso é um sucesso especialmente surpreendente pois, mantendo-se firmes as tradições de jogos 16-bits, Rise of the Third Power não possui dublagem ou algo que possa sustentar o carisma do texto, sendo fundamental que a escrita consiga fazer isso, o que ela faz com primor.
O jogo também não se vale de muito mais do que artes em 2D para apresentar os personagens, então não há qualquer tipo de animação para preencher certos vazios. Tudo é visto através desses retratos em 2D e da bela pixel art através do qual o jogo é retratado no console. Pixel art essa que merece todos os elogios do mundo e não deixa nada a desejar na comparação com qualquer outro título semelhante.
As coisas mudam um pouco durante o combate, mas ainda há a presença de sprites em pixel art, com a diferença ficando por conta da presença de mais animações para os golpes, que são um show visual à parte. E é aqui também onde Rise of the Third Power realmente traz coisas novas para o gênero, sem deixar de mostrar as suas influências com bastante clareza.
O combate, à primeira vista, é bem simples e fácil de se entender. Cada personagem atua no seu próprio turno, com uma barra na parte superior da tela de combate mostrando exatamente qual a ordem, sendo possível alterá-la com ataques que reduzem a velocidade, paralisam os inimigos e outros tipos de efeitos de status comuns em jogos do gênero.
Cada um dos personagens possui um papel distinto a executar em combate, com suas próprias habilidades e mecânicas distintas entre si. Cada personagem possui uma barra de energia que é usada para ataques mais fortes, mas funciona de forma distinta para cada membro do seu grupo, exigindo que você saiba exatamente como moldar a forma de agir de cada um deles para sobreviver a batalhas mais desafiadoras.
Por exemplo, Rowan começa com a barra de energia zerada e a recupera a cada ataque ou a cada vez que sofre dano. Quanto mais energia ele tem, mais poderosos são os ataques dele e, como tank, ele também tem habilidades de cura, mas elas vão reduzindo a defesa dele se usadas múltiplas vezes em sequência. Já Corrina começa com a barra de energia cheia, mas os ataques consomem bastante e há uma demora para que ela recupere essa barra (10 pts a cada turno ou cada ataque).
Cada personagem possui sua própria especificidade e conhecê-los é tão ou mais importante quanto conhecer os seus inimigos. Saber identificar quais adversários derrotar primeiro para não deixar sua equipe vulnerável é essencial, já que, mesmo que as batalhas contra inimigos comuns sejam simples e levemente desafiadoras, as batalhas com chefes tomam proporções bem distintas e realmente exigirão que você pense bastante.
Essas mecânicas são simples e nada que não tenha sido visto de uma forma ou outra em outros jogos, mas são suficientes para manter o combate de Rise of the Third Power divertido durante toda a experiência. Por fim, existem habilidades em conjunto realizadas por dois membros da sua equipe após preencher uma barra e que são fundamentais para mudar o rumo do combate.
Há, ainda, um interessante sistema de evolução de personagens através de talentos. Ao subir de nível, você ganha uma certa quantidade de pontos que podem ser usados para desbloquear “talentos” para os seus personagens. Esses pontos são compartilhados entre todos eles (já que só há uma barra de nível para a equipe) e você precisará planejar bem como evoluí-los de forma a melhor atender o seu estilo de jogo.
Por fim, existe um sistema de crafting através do qual você poderá criar armas, armaduras e acessórios melhorados para os seus personagens. Não existe muita customização nisso, já que é tudo bem estruturado e bem linear, bastando só encontrar os materiais específicos para ir desbloqueando os itens na ordem certa, mas é algo importante e que te ajudará a sobreviver aos combates.
No geral, esses elementos se combinam para tornar Rise of the Third Power uma experiência bem divertida, mesmo que ela seja consideravelmente linear. Existem algumas missões secundárias espalhadas pelo jogo, mas nada muito complexo ou que fuja muito do caminho que você já iria percorrer ao longo da história principal.
Ainda assim, estamos falando de uma experiência que dura, facilmente, de 40 a 50 horas, gastando um considerável tempo para apresentar bem o mundo do jogo, ainda que você não tenha grandes chances de explorá-lo como talvez deseje. No entanto, cada nova área te permite rodar bastante, procurar novos caminhos e encontrar itens escondidos, algo bem valioso para a experiência.
Dito tudo isso, Rise of the Third Power é o tipo de RPG retrô inspirado por clássicos JRPGs que deve aguardar aos mais saudosistas ou fãs do gênero curiosos por experiências únicas inspiradas por jogos marcantes do passado. Se você é fã desse tipo de jogo, esse é um título que merece e precisa estar no seu radar.
Jogo analisado no PS5 com código fornecido pela Dangen Entertainment.
Veredito
Rise of the Third Power é um divertido RPG inspirado em clássicos do gênero que peca apenas por sua excessiva linearidade. Apresenta um excelente sistema de combate e uma história que, apesar de cair em certos clichês, se sustenta na força de um texto bastante divertido e conciso que entrega exatamente aquilo que deseja sem se exceder.
Veredict
Rise of the Third Power is a fun RPG inspired by classics of the genre that only suffers from its excessive linearity. It features an excellent combat system and a story that, despite falling into certain clichés, is supported by the strength of a very entertaining and concise text that delivers exactly what you want without going overboard.