Resident Evil: Revelations

"Abandonai toda a esperança vós que aqui entrais". Uma citação referente à obra de Dante Alighieri ou uma advertência? Ou os dois? Se remontarmos o contexto da série Resident Evil em seus últimos anos, estas famosas palavras poderiam servir de aviso para alguém que vá se aventurar em uma nova jornada da série mais famosa da história da Capcom, devido aos insucessos da mesma. Não acreditar que um Resident Evil possa novamente nos dar a sensação de terror, de sobrevivência, de ao menos o vislumbre do que a série já fora e o porquê de ter ficado tão conhecida. Contudo, se você ainda é esperançoso e entrar no universo de Revelations, não vai se arrepender.
 
Quem jogou Resident Evil 2 já perceberá, via menu, antes de apertar Start,  o que uma simples imagem de um olho, tão familiar outrora, tão perdida, em seu cerne, nos tempos atuais, pode representar. Não se trata apenas de um olhar amedrontador encerrado dentro de uma escotilha. Diante do mal que assolara Terragrigia, uma cidade-modelo, flutuante e mantida exemplarmente por energia solar, passando por sua destruição tão necessária quanto à de Raccoon City devido a um ataque terrorista anterior, arquitetado por uma organização denominada II Veltro e a disseminação de um novo tipo de vírus, o enredo de REvelations toma a sua forma.



Organizações de combate ao bioterrorismo como a FBC e a já recorrente na série BSAA protagonizam as investigações, investidas em combates e boa parte dos conflitos vistos no jogo. Os rostos conhecidos de Chris Redfield e Jill Valentine participam ativamente das investigações. Boa parte da trama é jogável por meio de Jill. Entretanto, tais protagonistas, se mostram, com o desenrolar dos fatos, meros coadjuvantes em meio a novos personagens como os agentes Parker Luciani e Jessica Sherawat, assim como O'Brian, um dos comandantes da BSAA, Morgan Landsdale, chefe da FBC e Jack Norman, líder dos II Veltro, assim como outros personagens. Torna-se até compreensível tal decisão em termos de construção de trama, afinal, Chris e Jill já são amplamente conhecidos pelo público e servirem basicamente de porta de entrada para a trama e os novos rostos que há nela, sejam protagonistas ou antagonistas, apenas faz com que a história seja privilegiada.
 
A estrutura de REvelations já nos evidencia uma valorização do roteiro. Uma valorização que nos faz pensar que, apesar de se situar como spin-off, num recorte entre RE4 e RE5, podemos considerá-lo também como parte da franquia principal. Fatos como o desaparecimento de Chris e Jessica numa investigação acerca dos II Veltro e a ordem de O'Brian para que Jill e Parker, a fim de encontrar a dupla sumida, se adentrem ao Queen Zenobia, um luxuoso e decadente navio que guardara segredos até então pouco imagináveis, vão se encaixando por meio de episódios, retrospectiva ao iniciar um novo destes, bem similar a séries televisivas, e recursos narrativos como cliffhanger (recortes em seu clímax que acentuam o suspense) e in media res (iniciar acontecimento no meio de uma trama para depois retomá-lo).
 
Por mais que alguns poucos eventos superficializem a ação, tudo é bem controlado, e isso se estende aos diálogos, que conseguem cadenciar entre o drama, a comédia, a tragédia e a redenção. Vasculhando os diversos arquivos espalhados pelos cenários e que relatam diferenciadas situações, saudosistas ainda se encherão de ânimo e perceberão que mesmo os fatos superficializados conseguem o seu complemento satisfatório por meio desses documentos. Trata-se de um quebra-cabeça a ser encaixado por meio de uma trama unificada.



Boa parte da trama se passa no Queen Zenobia, além de outras localidades como montanhas em neve e na própria Terragrigia, na qual sentimos, por alguns episódios, um pouco do caos que assolara a cidade. Mas é no Queen Zenobia, neste navio que, junto ao enredo, Resident Evil Revelations brilha como um autêntico jogo da série pós fórmula clássica que balacencia o que há de novo e o que havia sido esquecido. Você ainda se deparará, durante o enredo, com momentos de ação por meio da jogabilidade, mas, ao contrário de Resident Evil 6, REvelations segue ordeiramente o que se propõe do começo ao fim.
 
O Queen Zenobia é enorme em suas diversas localidades. E tudo pode ser explorado por meio de uma liberdade proporcionada pelo jogo, mesmo que, em alguns momentos o enredo dite o caminhar das investidas ("não é por aí, Jill"). Diferentemente de Resident Evil 4, por exemplo, onde há um espécie de backtracking mentiroso, que empurra o jogador de volta para determinado cenário mediante a uma progressão quase em trilhos, em Revelations você sente cada ida e vinda necessária para cada cenário. Nos primeiros minutos no navio, já encontramos diversas portas trancadas e a sensação do necessário retorno à determinada área fica mais intensa a cada nova descoberta dentro deste lugar. Infelzimente há os objetivos descritos na tela a cada momento novo, o que impossibilita, de certa forma, que o jogador fique perdido no cenário. Entretanto, isto não tira de forma alguma o brilho de uma característica singular em Resident Evil.
 
As mencionadas idas e vindas ajudam a dar uma espécie de identificação com a ambientação, algo perdido na série há algum tempo. Certamente o Queen Zenobia será lembrado pelos fãs da série, assim como é a mansão do primeiro Resident Evil, a delegacia de Resident Evil 2, a ilha de Rockfort em Code Veronica, dentre outros, guardadas as suas devidas proporções. Isto era uma falta sentida nos REs pós-fórmula antiga. Resident Evil 4 ainda conseguia contornar isto por causa de seus inimigos e personagens secundários carismáticos, que davam uma identidade única a cada área, mas Resident Evil 5 e Resident Evil 6 nem isso contêm. Seja em caminhadas por novos velhos corredores claustrofóbicos, sem saber o que há do outro lado, passando por puzzles não tão complexos, mas maravilhosamente presentes,unindo-se a novidades, como partes aquáticas que estão longe de serem frustantes, dando ainda mais emoção e angústia no decorrer da trama, tudo isto faz de cada nova área descoberta dentro do Queen Zenobia uma experiência singular.



Em meio à exploração dentro do Queen Zenobia, inimigos sedentos por sangue estarão no encalço dos protagonistas. Desta feita, os oponentes são mutações decorrentes do T-Abyss, o danoso vírus presente no jogo. Conhecidos como Oozes, seu caminhar é idêntico ao dos clássicos zumbis e a variação deles é até salutar. Alguns podem se explodir na sua frente, outros poderão atirar projéteis em confrontos mais cadenciados (que nada lembram os tiroteios nonsenses de RE5 e RE6), outros poderão se partir em diversas partes, dentre outras surpresas. Sente saudades de inimigos antigos? O pior e um dos mais celebrados dos antigos está aqui nas partes em que há mais ação. O design dos inimigos é bastante simples, porém convincente, e os chefes do jogo são poucos, mas darão um bom trabalho ao longo da jornada, exigindo estratégias únicas para serem derrotados, em especial o chefe final, uma verdadeira ode à franquia.
 
Em meio a isso, REvelations transita em conservar a perspectiva de câmera e mira dos mais novos jogos da série, golpes físicos, mas controlados, e um sistema de esquiva que retorna revigorado de Resident Evil 3: Nemesis. A exemplo de Resident Evil 6, o personagem pode andar enquanto atira, contudo, diferentemente da versão para o 3DS, não há aqui a opção de perspectiva de tiro em primeira pessoa ao mirar. Além disto, no portátil da Nintendo havia uma rica customização de sensibilidade de mira, dentre outras opções, as quais estão ausentes aqui. O mapeamento dos itens e outras opções de menu atendem satisfatoriamente, com uma HUD muito idêntica ao Resident Evil 6. Originalmente REvelations fora lançado antes de RE6,  mas essa adaptação para consoles caseiros, ao menos quanto à disposição de menus, toma para si características idênticas ao último título numerado da série lançado. 
 
Há três itens, particularmente, que sofreram um pouco com a transição do 3DS para o PlayStation 3: manipulação de granadas, facas e ervas. Nada que atrapalhe totalmente no percorrer do jogo, mas incomoda um pouco a simplicidade de atirar granadas com um botão, por exemplo, resultando em um ataque, por vezes, pouco eficaz em termos de posicionamento. O mesmo vale para a faca, não podendo mais travá-la no intuito de uma melhor investida com a arma branca. Quanto às ervas, sentimos falta das ervas roxas para fins de combinação, tanto que uma erva verde recupera totalmente a energia, independemente da situação do personagem, não mais representada pelos sinais "Fine", "Caution" e "Danger", sendo apenas reflexo da mostra de sangue preenchendo a tela.



Dentre armas clássicas da franquia, um objeto novo em si se destaca: o Genesis, uma espécie de bio-scanner. Sua utilidade se dá basicamente na busca por itens escondidos (munições ou peças para fins de personalização) e mapear inimigos. Mapear oponentes pode ser de utilidade ímpar em momentos de sufoco. Cada inimigo mapeado, no pressionar de um botão, ao estar com o Genesis ativo, dá uma certa porcentagem de dados coletados. Ao completar 100%, em cada varredura, o jogador é premiado com uma erva verde. Todavia sentimos falta de outras utilizações do Genesis. Durante o jogo, há momentos em que ele é utilizado com uma boa criatividade, além dos usos recorrentes, porém, ao final do jogo, fica aquele gosto de que ele poderia ser mais aproveitado. Contudo, se torna uma ferramenta a ser utilizada futuramente na série por apresentar, em si, uma versatilidade em potencial.
 
Há um sistema rico de personalização em REvelations. Por meio de baús nostálgicos, tecnicamente postos em variados pontos do cenários, o jogador poderá, além de guardar armas que vão sendo encontradas ao longo da jornada, definir, as caracterítiscas delas. Para atribuir tais características, são necessárias as peças de personalização, podendo ser encontradas em diversas áreas ou por meio de salas outrora trancadas e acessíveis por meio de alguma chave ou de algum cartão. Cada arma tem uma coluna formada por no mínimo duas "linhas, podendo chegar a mais delas a serem preenchidas com as supracitadas peças. Elas atribuem otimização no dano, recuo, capacidade de armazenamento de munição e outros diversos tipos de customização.
 
Muito provavelmente, para quem é veterano na série, só perceberá a verdadeira dificuldade e sensação de sobrevivência por meio da dificuldade Infernal. Nela, oponentes são mais resistentes, causam maior dano, estão localizados em maior número nas áreas e o Genesis não encontrará munições com tanta facilidade assim. Em situações normais, REvelations pode ser considerado um jogo fácil e de curta duração em sua campanha (leva cerca de sete horas, em média, para finalizá-lo).



Contudo, além de um New Game+ e prêmios por zerar a campanha, há um modo multiplayer que prolonga por um certo tempo a diversão. O Raid Mode trabalha em sintonia com o que é o modo Mercenaries nos outros jogos da série. Todavia, ao mesmo tempo que ele mostra as suas virtudes em relação ao primeiro, evidencia as suas fraquezas.
 
O Raid Mode está disponível para jogar tanto no modo Solo, quanto no modo online. Para ambos os modos, a finalidade é uma só: passar por diversas fases presentes no jogo, divididos em suas respectivas partes, as quais pedem para que o jogador chegue vivo de um ponto a outro dos cenários, devendo passar por diversos inimigos que atrapalharão na tarefa. Conforme o jogador vai completando tais fases, pontos de experiência para subir de nível são dados e pontos de batalha são dados para gastar na loja com armamentos e peças de personalização que aqui tomam uma riqueza maior que no modo Campanha.
 
Cada fase do Raid Mode contém uma advertência quanto ao nível recomendado, o qual reflete nos inimigos presentes. Inimigos em nível alto demorarão mais para serem aniquilados. Existem barras de energia alocadas acima da cabeça dos oponentes e há variações de tamanho dos mesmos. Oozes gigantes e oozes anões estarão no caminho dos personagens a serem selecionados pelo jogador. Ao completar a fase, alguns bônus são dados ao jogador, totalizando três deles, o mesmo consegue um bônus especial. Há diversos níveis de dificuldades nas fases, além de um estágio bônus que desafiará os mais entusiastas.



Infelizmente há alguns problemas no Raid Mode. As fases não têm uma duração satisfatória em sua plenitude e cenários pequenos pouco contribuem para uma jogatina em cooperação de fato. No modo online, o jogador só poderá, de fato, desfrutá-lo com jogadores aleatórios quando estiver em um nível alto. Apesar de existirem as opções de customização das partidas por região e por nível, fica difícil encontrar jogadores com níveis baixos e participar de partidas com jogadores com nível muito acima do seu personagem se torna frustrante, porque o seu companheiro matará adversários de forma mais rápida que você devido ao nível das criaturas. Recomenda-se desfrutá-lo no modo offline ou então combinar com um amigo que esteja no mesmo nível que você para trilharem juntos na empreitada fases adentro. 
 
Resident Evil: Revelations se sobressai em seu clima proposto, seu equilíbrio e mostrando que há jeito de conseguir manter o clima clássico e contentar os que ainda se admiram pelas mudanças que foram iniciadas em Resident Evil 4. Sua beleza gráfica, apesar de tecnicamente sentir a portabilidade para um console caseiro, ainda impressiona, mesmo com algumas texturas estouradas devido à alta resolução e que eram basicamente imperceptíveis no 3DS. Alguns modelos quadrados de personagens e partes do cenário, no entanto, evideciam ainda mais o port com raras melhorias. Porém a ambientação escura, mesmo que não tenha efeitos de luz e sombra convincentes, reforça a sensação de receio ao atravessar cada parte do cenário e ter a necessidade do retorno ao mesmo, podendo ser surpreendido por um inimigo à espreita.
 
Sangue por todos lados, sons de criaturas agonizantes, trilha sonora estupenda com momentos pertubadores e épicos complementam a jornada, além de um suporte a legendas em português do Brasil que, apesar de alguns erros primários de concordância, se torna uma boa opção para jogadores que não dominam a língua inglesa, afinal, além das cenas de corte, durante o gameplay os personagens conversam bastante entre si.



Altamente recomendado para quem não pode jogar a versão de 3DS (quem a jogou, não existem grandes motivos para tê-lo novamente), Resident Evil: Revelations é a prova de que a Capcom ainda sabe como fazer e os que não abandonarem a esperança ao entrar nessa jornada certamente não se arrependerão.

— Resumo —

+ Melhor Resident Evil pós-fórmula clássica
+ Clima de survival horror de volta
+ Genesis
+ Boa trama
+ Queen Zenobia

Curto
Por vezes limitado, devido à simples portabilidade
Problemas no Raid Mode


Jogo analisado com código fornecido pela Capcom.

 

Veredito

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