Todos os sábados, tenho o costume de conferir aqui no PSX Brasil a lista de lançamentos da semana seguinte. São muitos títulos, geralmente com uma grande proporção de produtos de qualidade duvidosa, clonagem recorrente e capinha com cara de I.A., mas existe uma certa satisfação em garimpar e, com sorte, encontrar algo de valor. Às vezes, uma imagem basta para animar a intuição de que o item pode ser um digno espécime de algum dos meus gêneros favoritos.
Meu mais recente caso de garimpagem frutífera foi Petit Island. A imagem mostra uma gata se divertindo nas costas de uma tartaruga marinha, uma ilustração que indica personalidade aconchegante e lúdica. O nome, por sua vez, significa “pequena ilha”, definindo um local de jogo, o que me sugeriu uma aventura de exploração. Foi o bastante para me fazer conferir o trailer.
Dito e feito: Petit Island é uma aventura de pequeno mundo aberto em uma charmosa ilha tropical povoada por animais antropomórficos fofos, mas muito humanos, com foco na exploração e na narrativa acolhedora.
É um jogo que quer contar uma história de memórias e relações geracionais. O centro de tudo é o gato Felix, agora idoso, debilitado e abatido pelo esquecimento que começou a enevoar sua mente. Sua neta Lily resolve viajar para a Ilha Petit, onde o avô viveu na juventude. Após customizarmos seu visual (pelagem, vestido e mochila), a menina seguirá os rastros do diário do velhinho e das histórias que ele sempre contou, atualizando o caderno de lembranças como um presente para animar seu querido parente.
Petit Island valoriza sua narrativa, criando uma ilha bem-feita e detalhada, contando com vilas, lojas, prédios públicos e comidas típicas, tudo feito com muita fofura e um colorido vibrante e agradável. As personagens centrais conversam bastante, estabelecendo contato natural com Lily e preenchendo as peças do quebra-cabeças do passado de Felix, que foi muito relevante na vida de várias delas. Assim, Petit Island consegue cumprir seu objetivo de criar uma história acolhedora do cotidiano e das relações entre gerações.
As caixas de texto são expressivas e engraçadas pelo uso de emojis de gato e o jogo é traduzido para português brasileiro, mas essa parte ficou mal-feita e carece de revisão. O principal erro está nas muitas vezes em que a gata Lily é referida no masculino. Algumas falas ainda ficaram em inglês e há balões que indicam o falante errado, mas esses problemas são raros.
Para além disso, Petit Island não consegue conciliar muito bem a narrativa com seu mundo aberto. Esse tipo de estrutura combina muito bem com a proposta de visitar um local de lembranças, mas a campanha acaba sendo guiada por uma sequência de capítulos dedicados a personagens específicos. O problema é que eles sequer aparecem para nós se não for a vez do capítulo deles.
Assim, se decidimos explorar o mapa e chegamos à base dos escoteiros, por exemplo, nada acontecerá se a história não tiver chegado a esse ponto, restando apenas um lugar vazio (na verdade, lá podemos comprar mobília para decorar um certo local que ainda não podemos encontrar). Isso prejudica o senso de descoberta e faz a narrativa guiada entrar em descompasso com a ideia de liberdade que o mundo aberto deveria proporcionar.
Seria mais interessante que as missões de alguns capítulos ficassem disponíveis para nos envolvermos nelas de acordo com nossa curiosidade, refletindo a forma como a própria Lily está lá às cegas, sem conhecer a ilha nem seus habitantes, levada apenas pelo diário e as lembranças. Da mesma maneira, a pessoa que joga poderia usar o diário para localizar os velhos conhecidos do vovô.
Aparentemente, a tal da liberdade de exploração de que falo não faz parte da visão de Petit Island, que faz questão de nos conduzir pela mão com marcadores no mapa e nos objetivos das missões. De certa forma, vejo isso como um desperdício do bom design da ilha em si, que é bem capaz de nos guiar de forma orgânica.
Assim, logo no primeiro capítulo temos que saber do paradeiro de um artista e somos aconselhado a perguntar aos pintores das redondezas. A dica do primeiro deles foi boa, procurar por uma casa de telhado azul, então parti para encontrar o endereço. O diário tem um esboço do local, o que facilitou a procura, mas, ao encontrar a casa, não havia qualquer possibilidade de interação nem vestígio do NPC que eu precisava conhecer. Foi depois disso que descobri que eu precisava ouvir as dicas de outros dois artistas para só então seguir para o ateliê, mesmo que eu não precisasse mais dessas indicações. Elas não apenas foram inúteis, mas, na verdade, atrapalharam.
É para encontrar lírios no parque da cidade? Deixe-me descobrir onde fica! Afinal, Lily é uma turista, com câmera fotográfica, mapa e guia de viagem (o diário). Nesse aspecto, penso que as marcações poderiam ser opcionais, apenas para quem precisasse delas. Os locais de interesse são bem claros, há placas e caminhos, o mapa é eficiente e os personagens dão boas direções, mas Petit Island ofusca todo esse trabalho pela redundância de insistir em marcar com exclamações até os locais devidamente nomeados no mapa de Lily, como a delegacia.
Outro ponto que precisa de melhoria é o sistema de ferramentas. É preciso abrir o menu e equipar o item adequado, como a pá, por exemplo, a cada vez que quisermos usá-lo. Seria muito mais prático se pudéssemos navegar entre esses equipamentos com um botão, ou que tivéssemos uma roda de seleção rápida. Pior: o chapéu que Lily ganha é considerado um equipamento e precisamos desequipá-lo antes de empunhar outro material. O que deveria ser apenas um cosmético se torna burocracia de menus.
Cavalgar a montaria também afeta os equipamentos e, ao desmontar, as mãos da gatinha estão vazias; abra o menu e equipe novamente.
Ah, ainda não falei das montarias? A Ilha Petit tem uns bichos esquisitos e fofos, que parecem diretamente saídos de Bugsnax: são llamas e búfalos misturados com frutas! Eles tornam as viagens pela ilha muito mais práticas, mas, estranhamente, não sabem pular. Para conseguir subir nos locais precisamos desmontar, fazer Lily saltar e chamar a montaria novamente. Não chega a ser um problema, mas não há como não considerar uma má escolha de design.
Além da campanha, há algumas poucas atividades de mecânicas bem simples, como pescar, caçar insetos e uma pista de obstáculos. No fim das contas, apesar do mundo aberto, Petit Island não pretende ser um jogo longo de sandbox. Ele só quer que vivamos a história de Lily em busca do passado do avô enquanto aproveitamos um passeio relaxante por uma ilha adorável, sem se estender além do necessário — levei seis horas para concluir, ainda faltando algumas missões secundárias. Mesmo com as limitações de design (que ainda podem ser melhoradas; fica a dica, Xelo Games), é um game que conseguiu me cativar.
Jogo analisado no PS5 com código fornecido pela SOEDESCO.
Veredito
Petit Island é a agradável aventura de uma neta leal visitando a terra da juventude de seu avô, em uma história de memórias, relação familiar entre diferentes gerações e acolhimento aos idosos. O visual é adorável e a ilha é bem projetada, mas os capítulos sequenciais e os insistentes marcadores de objetivos atrapalham a sensação de liberdade e descoberta que o aconchegante mundo aberto poderia oferecer.
Petit Island
Fabricante: Xelo Games
Plataforma: PS5
Gênero: Aventura / Mundo Aberto
Distribuidora: SOEDESCO
Lançamento: 14/11/2024
Dublado: Não
Legendado: Sim
Troféus: Sim (inclusive Platina)
Veredict
Petit Island is the delightful adventure of a loyal granddaughter visiting the land of her grandfather’s youth, in a story of memories, family relationships, and caring for the elderly. The visuals are lovely and the island is well-designed, but the sequential missions and persistent goal markers detract from the sense of freedom and discovery that the cozy open world could have offered.