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Persona 3 Reload – Review

Se alguém dissesse todo o caminho que a subsérie Persona iria percorrer ao longo dos últimos 18 anos, essa pessoa muito provavelmente ou estaria rica pela sua capacidade de previsão ou taxada como louca. De um pequeno spin-off de uma série de nicho a uma das mais influentes séries de JRPGs de todos os tempos, se desvencilhando totalmente do nome que costumava carregar, tudo ainda parece surreal para quem conheceu a série naquela época.

Ou, pelo menos, para quem teve contato com Shin Megami Tensei: Persona 3 lá em 2007, um ambicioso e criativo JRPG de PlayStation 2 lançado no Ocidente já após o lançamento do PlayStation 3, ver como as coisas se transformaram até a chegada de seu remake, Persona 3 Reload, é um tanto chocante. Mas é, também, uma prova de que, quando devidamente ajustados, títulos já excelentes conseguem se reinventar tantos anos depois e reacender o amor de antigos fãs quanto cativar um novo público.

Tendo jogado todas as versões do jogo até aqui e sabendo de alguns já polêmicos pontos antes do seu lançamento, analisar Persona 3 Reload parecia um desafio grande. Em parte por ser um dos jogos que estabeleceram muito do meu gosto por JRPGs (e ser o motivo de ser um pouco “duro” com os rumos que a série trilhou), mas em parte porque separar o peso das expectativas é fundamental para entender que, apesar dos desejos dos fãs, a intenção aqui foi reimaginar o título original de 2006/2007 e não suas sucessivas reimaginações em Persona 3: FES ou Persona 3 Portable.

Persona 3 Reload

E ao se deixar conhecer Persona 3 Reload pelos seus próprios méritos, você logo se verá preso por ele. E muito se deve pelo quão excepcional a narrativa segue sendo. Tudo gira em torno de um fenômeno conhecido como “Hora Sombria”, segundo o qual o dia é composto, na verdade, por 25 horas e apenas alguns poucos escolhidos conseguem desenvolver a habilidade para acordar, se mover e sobreviver durante esse período enquanto o resto da humanidade dorme em caixões.

É claro que o protagonista é uma dessas pessoas, algo que lhe é revelado pouco depois do seu retorno a Ilha Portuária de Tatsumi, local onde ele morava até a morte dos seus pais 10 anos antes. Ele então é recrutado pelo diretor da escola onde estuda, o Colégio Gekkoukan, para se juntar ao grupo de jovens excepcionais cuja missão é investigar o que é a Hora Sombria, o misterioso Tártaro, sua relação com a Síndrome da Apatia e, bem, meio que impedir o fim do mundo.

Para isso, todos os membros de campo desse grupo, chamado de S.E.E.S. (ou Setor Especializado em Execução Supracurricular), terão acesso a um poder especial que só pode ser despertado durante a Hora Sombria e em momentos de alto stress: o uso de Personas. Cada um dos membros da S.E.E.S. possui acesso a uma persona diferente, salvo pelo protagonista que, como viria a se tornar tradição na série, é um coringa capaz de usar múltiplas personas ao mesmo tempo.

Persona 3 Reload

Um dos principais méritos de P3R é o quão distinta sua história é dos jogos seguintes e o quão bem ele trabalha o mistério no centro da narrativa. Logo cedo ele estabelece esse mistério, qual objetivo dos personagens, o porquê ele é importante e o que eles precisam fazer para investigá-lo. É a partir daí que todas as próximas camadas vão sendo apresentadas ao longo das dezenas de horas do jogo, sendo dedicadas a expandir e evoluí-la, sem nunca perder esse fio narrativo principal que vai guiando todo o seu desenrolar.

Então por mais que outros elementos tradicionais da série também já estivessem presentes aqui, como o misticismo que envolve a exploração do Tártaro, tudo parece se desenrolar e se conectar muito melhor do que em alguns outros jogos. Todos os personagens têm suas próprias motivações para se envolverem com a S.E.E.S. e algumas delas são conflitantes, cabendo ao protagonista manter esse grupo de figuras peculiares junto o suficiente para alcançar seus objetivos.

Parte central desse mistério também é quem realmente é o protagonista. Os mistérios por trás dos seus poderes, a conexão do seu passado com a cidade, o misterioso garoto que o recebe no dormitório de Iwatodai e a Sala de Veludo são todos pontos que o jogo vai explorando muito bem pouco a pouco. O jogo como um todo tem um ritmo bem diferente do que se veria nos jogos seguintes, sendo um pouco mais lento e se valendo disso, em conjunto com sua temática mais sombria, para tornar o clima do jogo mais denso e pesado do que o que os jogadores viram em Persona 4 e Persona 5.

Persona 3 Reload

Por mais fácil que seja passar horas e horas aqui falando sobre o quão boa a narrativa é e, de fato, ela é excepcional dado o quão bem ela trabalha os temas centrais do jogo, como morte, sacrifício e o sentido da vida, explora o mistério por trás dele e entrega um final marcante e emocionante, tudo isso só é realmente possível graças ao quanto a mecânica de Vínculos Sociais (os famosos Social Links da série) ajuda a expandir a relação do jogador com os personagens secundários e se apegar ao mundo e aqueles que vivem nele.

O lançamento original de Persona 3 foi o primeiro jogo da franquia a trazê-los e Persona 3 Reload não mexe muito em sua estrutura, apenas melhorando pontos que precisavam ser aparados. Isso significa que, questões específicas desse jogo, como a possibilidade de reverter um Vínculo Social, ainda existem aqui, exigindo maior cuidado e atenção do que como o sistema viria a ser implantado no futuro. Dito isso, o remake torna mais fácil reverter essas situações, então é possível tirar bastante proveito dele.

Um dos pontos polêmicos é que Persona 3 só permitia ao jogador ter Vínculos Sociais com as garotas da S.E.E.S. e outros personagens secundários espalhados pela cidade. Embora Persona 3 Portable tenha introduzido Vínculos Sociais para Junpei, Akihiko, Ken, Koromaru e Shinjiro para a protagonista feminina, ele sacrificava algumas das relações mais interessantes e fundamentais do protagonista masculino e como o jogo só te dá a opção de jogar com ele, não havia muito como trazer esses Vínculos Sociais para o jogo.

Persona 3 Reload

Dito isso, a inclusão dos Episódios de Vínculo meio que supre essa necessidade, visto que eles se dedicam bastante a expandir a relação entre o protagonista e os outros membros da S.E.E.S. São cenas totalmente inéditas e não relacionadas a um Vínculo Social que ficam disponíveis durante um curto período de tempo e dão alguns bônus, como melhorias nas estatísticas de um personagem ou destravam o acesso a certas receitas especiais de Personas.

Cabe dizer ainda aqui que todas as cenas envolvendo os Vínculos Sociais do jogo foram dubladas, com exceção (óbvia) das cenas com a Maya, trazendo todo um novo elenco de dubladores e todo o texto foi devidamente revisado. Isso faz com que as cenas sejam ainda mais interessantes.

Outro ponto importante sobre esses elementos e o dia-a-dia do protagonista no geral é que várias novas atividades estão disponíveis. É possível agora estudar, usar o computador, cozinhar, assistir filmes e jardinar com seus aliados no dormitório, tornando Iwatodai um lugar muito mais vivo e interessante do que ele jamais foi nas encarnações anteriores do jogo. São pequenas melhorias muito bem-vindas e que se juntam à quantidade expandida de lugares para visitar na cidade tornando a experiência mais interessante e variada.

Persona 3 Reload

Entrando agora nos pontos que mais precisavam de ajustes e um que recebeu quase que uma completa reinvenção foi o próprio Tártaro. A exploração da dungeon do jogo sempre foi um dos pontos de maior reclamação dada a sua natureza. Cada novo andar era gerado proceduralmente, algo bastante incomum 18 anos atrás mas que os jogadores já estão mais acostumados hoje em dia.

Junte a isso o quão o jogo trabalhava para tornar a exploração cansativa, com os seus personagens cansados e sofrendo quedas de estatísticas ao longo da exploração (algo que foi totalmente removido) e nem todo mundo se adaptava bem a ele.Embora vários desses elementos ainda estejam presentes e o clima da exploração do Tártaro, sua natureza e sua imponência, ainda sejam respeitadas, andar por ele se tornou um pouco mais fácil.

Agora é possível salvar nos andares, correr ao andar pela dungeon, o Shuffle Time foi melhorado… Nada que acabe com a sensação de se explorar o Tártaro mas que torna a experiência bem melhor dadas as chamadas “melhorias de qualidade de vida”. Um dos novos lugares que você pode visitar de dia, a cartomante do clube Escapade, agora pode te ajudar a mudar um pouco o design do Tártaro, caso deseje, facilitando um pouco a exploração.

Persona 3 Reload

Algumas novidades também foram adicionadas, como novos baús que podem ser encontrados e precisam de um novo item-chave, as Lascas do Crepúsculo, para serem abertos (esse mesmo item agora é necessário para curar sua party no relógio na entrada do Tártaro). A antiga “Monad Depths” foi repensada, sendo substituída por dois elementos: as Portas Monad que aparecem aleatoriamente e te permitem lutar contra Sombras poderosas e dão acesso a itens raros e as Passagens Monad que tem ainda mais inimigos e ainda mais recompensas de alto nível.

E aí entramos no ponto mais revisto e revigorado nesse remake: o combate. A lista de reclamações que podiam ser (merecidamente) feitas em relação ao sistema de combate de Persona 3 é longa e, felizmente, também é bastante longa a lista de melhorias que podemos encontrar em Persona 3 Reload. Ele segue sendo o tradicional e esperado sistema de batalha por turnos típico de um JRPG e que a série segue mantendo, mas com várias questões estratégicas que o tornam bem dinâmico e variado.

A primeira e mais importante é que, dessa vez, é possível controlar toda a sua party, então sem riscos da IA simplesmente surtar e acabar com toda e qualquer chance de sucesso que você possa ter. A Atlus trouxe também pequenas melhorias de qualidade de vida ao combate, tornando tudo muito mais próximo do que os jogadores estão acostumados em Persona 5, incluindo magias de Luz e Trevas que não existiam, a possibilidade de escolher quais habilidades seus aliados vão ter, a adição de roupas, a adição de habilidades de navegação para a Fuuka que podem ser ativadas usando a barra de SP dela e vários outros pequenos detalhes.

Persona 3 Reload

Dito isso, as duas grandes adições ficam por conta dos sistemas de Troca e Teurgia. Troca é o equivalente aqui ao Batton Pass visto em Persona 5, no qual, após explorar a fraqueza de um inimigo e ganhar um turno extra (o “1-More” da subsérie, sua própria variação do Press Turn de SMT), você pode passar a vez para um dos seus aliados na reserva. A novidade fica por conta de um essencial ajuste: o personagem que entrar não terá bônus nas suas estatísticas, algo que basicamente quebrava o sistema de Persona 5 e tornava o sistema bem fácil de se explorar. Ele ainda é essencial e muito eficiente, só não tão quebrado.

A outra novidade fica por conta da Teurgia. Trata-se de um novo sistema no qual cada personagem tem habilidades especiais únicas que podem ser usadas ao completar uma barra. Cada personagem tem um requisito diferente para preenchimento, algo que influencia bastante as estratégias adotadas pelo jogador visto que, por basicamente substituírem as habilidades únicas de cada membro da equipe, elas são extremamente poderosas e importantes em batalhas mais difíceis.

Mesmo que esses ajustes tenham trazido um avanço e melhoria consideráveis de qualidade de vida ao jogador, Persona 3 Reload ainda conta com algumas batalhas bem desafiadoras e interessantes. É um jogo que não é mais injusto, mas também não é exageradamente fácil, encontrando um equilíbrio muito bem-vindo e que faz com que a exploração do Tártaro seja tão boa quanto o restante do jogo já era.

Persona 3 Reload

Por último, cabe dizer aqui que as melhorias técnicas trazidas pelo jogo são muito boas. Persona 3 Reload é um avanço considerável usando a mesma engine de Persona 5 e, consequentemente, usando os visuais vistos nele. Não é o RPG mais bonito que você verá por aí, mas ele consegue manter seu estilo visual único e sua identidade sem tentar adotar coisas demais do jogo mais famoso da série (apesar de trazer várias das melhorias de interface de usuário vistas nele, como as finalizações de combate, por exemplo).

Felizmente o jogo roda a 60 quadros por segundo no PS5 sem problema nenhum e o fato de várias cenas antes em anime agora serem em in-engine ajuda bastante a enriquecer a experiência. Dito isso, existem algumas novas cenas em animação também e várias novas linhas de diálogo foram gravadas. A trilha sonora foi toda rearranjada e conta com músicas novas e eu, pessoalmente, gostei bastante da escolha da nova vocalista.
Por fim e mais importante, não só vários dos diálogos foram reescritos e melhorados, mas, principalmente, pela primeira vez na série o jogo conta com legendas em PT-BR. Isso é excelente e pra um jogo com dezenas e até centenas de horas para ser totalmente concluído, é algo que merece aplausos da Atlus/Sega por pensar no público brasileiro e trazer uma localização de alta qualidade.

Persona 3 Reload

No geral, Persona 3 Reload é um remake imperfeito para uma obra-prima imperfeita. A ausência do The Answer talvez seja o que mais me incomoda por ser um excelente epílogo, mas todos os outros pontos do jogo são tão bons que quase te fazem esquecer e, para quem não jogou FES, dificilmente fará falta.

Essa talvez não seja a versão definitiva em termos de englobar todo o conteúdo já feito nos sucessivos relançamentos do jogo, mas definitivamente é a melhor, mais completa e mais divertida forma de jogá-lo. De várias formas, seus temas parecem ainda mais atuais sendo vistos hoje em dia, as reflexões que ele traz consigo são excepcionais e a forma como ele o faz é excepcional.

É estranho que um jogo sobre atirar com uma arma falsa na própria cabeça para invocar versões estilizadas de criaturas mitológicas seja tão impactante e traga tantas reflexões importantes sobre a modernidade (enquanto se um MP3 Player), mas essa é a beleza de Persona 3 Reload. É um jogo que merece sua atenção se você é fã do gênero como um todo, sendo um dos mais importantes e influentes jogos já lançados e uma experiência ainda melhor depois desse remake, facilmente recarregando o seu lugar na minha lista de jogos favoritos de todos os tempos.

Jogo analisado no PS5 com código fornecido pela Atlus.

Veredito

Persona 3 Reload é um imperfeito remake no qual, embora a falta do conteúdo de versões expandidas anteriores incomode, suas novidades e a necessária (e muito bem executada) reformulação de combate fazem com que esta seja a melhor forma de jogar a melhor narrativa que a série já teve em um pacote com uma ótima localização em PT-BR.

90

Persona 3 Reload

Fabricante: Atlus

Plataforma: PS4 / PS5

Gênero: RPG

Distribuidora: SEGA

Lançamento: 02/02/2024

Dublado: Não

Legendado: Sim

Troféus: Sim (inclusive Platina)

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Veredict

Persona 3 Reload is an imperfect remake in which, although the lack of content from previous expanded versions is annoying, its new features and the necessary (and very well executed) reformulation of combat make this the best way to play the best narrative that series already had in a package with a great localization to PT-BR.