Nobunaga’s Ambition: Awakening – Review

Japão feudal: um dos maiores e mais profícuos cenários para estudiosos e aficcionados pela história oriental, mais especificamente a de conflitos e batalhas por conquistas, territórios, honra e glória, é cenário fértil também para a imaginação da cultura pop como um todo não só de hoje, quando temos acesso a obras espetaculares como o indispensável Ghost of Tsushima ou o surpreendente Trek to Yomi nos games, ou os incontáveis mangás no melhor estilo jidaigeki, aqueles dramas históricos pelos quais ficaram conhecidos gênios como Hiroshi Hirata, como também a coisas menos recentes, como o legado do inoxidável Akira Kurosawa nos cinemas. Não faltariam exemplos para que pudéssemos glorificar a extensa produção artística inspirada – com mais ou menos fidelidade e realismo aos eventos da vida real – nesse período histórico específico daquele país.

Nobunaga’s Ambition pode parecer um título desconhecido do grande público, mas traz consigo uma parcela importante de tudo isso, já que está completando 40 anos de história ao traduzir em diversos títulos todos os melindres não só de lutas campais e conquistas de territórios, mas também tudo aquilo que está envolvido no jogo político e na complexidade administrativa contidos dentre as responsabilidades de um grande líder feudal. Afinal, entre uma batalha e outra, há que se criar condições sociais e políticas que favoreçam a vitória e, mais que isso, a manutenção daquilo que foi conquistado. O mais recente título da franquia, Nobunaga’s Ambition: Awakening, celebra as quatro décadas de refinamento do modelo com vistas a sistematizar tudo o que já foi criado de forma equilibrada, sem abrir mão de suas características de vanguarda no gênero.

Para simplificar, o jogo é uma grande mistureba (no bom sentido) de sistemas de gerenciamento e administração de cidades e propriedades, como visto por exemplo no clássico SimCity ou no atual Cities Skyline, com mecânicas de estratégia em tempo real – naquele modelo RTS que tanto gostamos – no que se refere a um planejamento de expansão territorial que tem como grande objetivo o sonho, ou a ambição, desta figura japonesa da vida real, Nobunaga Oda, de unificar sua nação fragmentada em um grande e glorioso país. Localizado durante a efervescência do período Sengoku que se arrastou por entre os séculos XV e XVI, conhecido também como o Período dos Reinos Combatentes, o game nos coloca na pele de um poderoso daimyo, chefe do seu clã e detentor de um porção significativa de terras, que acompanhado por subalternos importantes, deverá tomar decisões que o levará à vitória total ou à insignificância eterna.

Logo de início, este é um jogo que parece não estar muito preocupado em simplificar para quem estiver chegando agora. Ainda que seja muito generoso em nos pegar pelas mãos com um longo e detalhado tutorial que trata das suas principais mecânicas, Awakening já nos coloca no centro das operações diversificadas do clã e logo de início temos que tomar decisões importantes, seja na área econômica, determinando por exemplo em que aspecto investir nossos escassos recursos e onde colocar mais força militar ou mais produção de mantimentos; seja na de políticas internas e externas, apontando para um estilo que mais tarde irá se desdobrar em uma mentalidade mais ou menos agressiva diante rivais e em relação até mesmo aos nossos servos (no sentido mais literal do conceito) que podem tanto nos respeitar quanto se sentirem pressionados e oprimidos – e não queremos pagar pra ver do que são capazes quando descontentes.

Olhando para a grama vizinha, há estratégias de abordagem diplomática, o que significa fazer diferentes combinados de cooperação ou de, no mínimo, não agressão mútua. Saber com quem e quando se aliar é uma das tarefas mais complicadas do jogo, já que quem se meter a Napoleão invadindo tudo o que estiver pela frente saberá rapidamente que esta é a forma mais efetiva de encontrar a derrota humilhante. Vai demorar para que tenhamos recursos e soldados suficientes para investidas mais ousadas, e qualquer passo em falso não só traz a vergonha de volta pra casa, como a deixa exposta a quem se preparou melhor. Sim, porque como um bom RTS, seus iguais tem planos tão ou mais nefastos que os seus, então uma postura antipática resulta em nenhum aliado e muitos inimigos prontos para acabar com suas pretensões antes mesmo que elas se solidifiquem.

Ao mesmo tempo, não é só com sorrisos, acenos e apertos de mão que se faz uma conquista territorial de tamanha proporção, então a guerra é iminente. Para tal, não basta fazer como quando jogamos War no tabuleiro, apontar para um alvo e competir no velho “quem pode mais chora menos”. É necessário elevar as lideranças certas aos postos adequados, mover suas tropas de modo inteligente e estruturar todos os recursos necessários antes mesmo de ensaiar uma investida pesada. Se o castelo pretendido estiver desestruturado, tanto melhor, e é possível, por exemplo, agir nas sombras, criando revoltas, incitando a população a se virar contra o seu senhor, mover os palitos por traz das cortinas para que uma invasão seja mais do que bem-sucedida, seja desejada pelo povo local. Uma forma difícil, mas muito eficiente de se vencer um conflito sem derramar uma gota de sangue é aprender a fazer um bom cerco, aumentar a probabilidade de vitória e negociar a rendição inimiga. Ninguém perde soldados, a coisa se resolve rápido e a região é anexada, quem sabe até agregando o líder local ao seu clã, lhe propondo benefícios em troca de fidelidade.

Estudar os detalhes, considerando todas estas variáveis, é fundamental. Promover seus oficiais de acordo com suas características e boas ações é importante, garante a mobilidade vertical de uma comunidade satisfeita, mas ao atribuir tarefas para eles, é necessário estar atento para que eles saibam avaliar bem as situações. Um conselho mal dado, afinal, é muito mais culpa de quem pediu do que de quem deu, porque mais do que ouvir, é essencial saber de quem ouvir e como interpretar. O mesmo vale para a avaliação minuciosa do terreno inimigo, cujas características de fraqueza e força são muito mais do que efeitos de contextualização. Como não poderia deixar de ser, como bem diria Sun Tsu em A Arte da Guerra, é importante conhecer seu inimigo tanto quanto a ti mesmo para não subestimar as forças alheias ou, pior ainda, superestimar as próprias.

O grande trunfo de Nobunaga’s Ambition: Awakening é valorizar o bom planejamento em detrimento de outros fatores, principalmente da sorte. Claro que há imprevistos, e quando um dos seus generais te faz uma proposta, ele pode alertá-lo sobre as chances de sucesso serem mínimas, 50/50 ou favoráveis, e o resultado pode ser surpreendente pelo lado positivo ou pelo lado negativo, mas dentro do grande plano, é muito mais provável que se tenha sucesso em uma campanha buscando conquistas quando se faz a preparação administrativa – melhorando suas instalações, coletando benesses, movimentando a economia e fortalecendo sua estrutura militar – e estratégica – até mesmo a geografia deve ser considerada quando se movimenta as tropas, já que chegar no tempo correto ao local do conflito faz uma diferença enorme no resultado final. A aleatoriedade, quando preponderante em jogos assim, acaba frustrando o bom jogador ainda que traga atrativos para aquele mais descuidado ou mesmo quem está querendo se divertir mais casualmente. Aqui, ou se leva a carga de ser um líder a sério, ou dificilmente se vai durar muito tempo na função.

O que não ajuda muito nesse controle total das situações é uma interface confusa e evidentemente pensada para se jogar no computador, e não no controle. Ainda que o acesso aos diferentes níveis de menu sejam adequados ao timing da ação – que pode ser pausada ou acelerada na pior das hipóteses – a roda de opções principais é estranhamente pequena e espremida, com escolhas úteis, mas formuladas claramente para o uso do mouse. Ainda tenho problemas com a tipografia e até o tamanho de fonte, idealizados para quem vê no monitor e não na TV da sala, mas isso em partes da gestão de recursos, porque nos diálogos, sobretudo no relato de conflitos, a coisa muda de figura e fica mais estilizado e também mais confortável. Mas a pior parte está em um mapa que consegue ser ao mesmo tempo fraco de informações significativas e de iconografia e, ainda assim, poluído e difícil de se ler naquilo que importa. Por vezes, há tanta coisa acontecendo na tela que obviamente não se pode acompanhar tudo, o que significa que ou nem tudo é importante, ou nem tudo o que é importante é percebido pelo jogador, ambas opções ruins de usabilidade.

Visualmente, aliás, o jogo consegue transitar bem entre o modo estratégico com a grande visão do mapa do Japão, e o modo narrativo, se assim posso chamar, que funciona muito bem como uma Visual Novel que narra alguns dos eventos mais significativos do jogo, alguns deles com referência na realidade, resgatando personagens reais que, ao lado de outros narrativamente funcionais, dão substância para esse universo, o tornando altamente rico em detalhes e absolutamente cativante para os amantes de boas histórias. Com ilustrações muito bem trabalhadas e textos bem produzidos, é um dos maiores atrativos para manter-nos atentos a cada movimentação no mapa. O ponto de menor impacto nesse caso são os cenários de fundo repetitivos e muitas vezes genéricos, com acampamentos, castelos e descampados que acabam tornando algumas histórias muito particulares em algo comum e com menos identidade. Ainda que relevemos a questão do valor de produção e do foco do jogo, eu gostaria de ver mais reproduções detalhadas de locais reais nestas passagens.

No que se refere ao som do jogo, há poucas passagens faladas em voz e muitos diálogos somente escritos. Na versão em inglês, que foi a que joguei, mesmo que alguns comandos e palavras de ordem sejam exagerados e carreguem em uma interpretação arquetípica, a coisa funciona para conferir alguns pontos de emoção. O mesmo vale para a trilha musical que se estabelece por temas militares, mas sabe se apropriar de trechos mais emocionais nos momentos certos. A se lamentar, a ausência completa (já esperada pela origem do jogo) de localização para o nosso português brasileiro, uma vez que tanto as histórias quanto toda a interface dependem de um absoluto entendimento do idioma. Não há nenhuma forma de se jogar Nobunaga’s Ambition: Awakening sem entender bem o inglês, mesmo que o jogador se furte de querer compreender a história. É como jogar um RPG lá nos anos 1990, em japonês: você até pode conseguir progredir na base da tentativa e erro, mas jamais poderá se apropriar daquilo que está fazendo.

O game, aliás, está chegando no ocidente um ano após sem lançado em seu país de origem, algo que nem sempre foi o normal em um mercado que muitas vezes mantinha coisas específicas longe de algumas praças. O problema é que parece haver pouca preocupação com os estrangeiros, já que muitas vezes figuras históricas são jogadas na trama sem qualquer preparo ou ambientação, e quem não estiver atento a aprender esses nomes na marra poderá se perder quando o relato começar a dizer quem fez o que, quando e onde. Não há qualquer glossário ou apresentação introdutória, o que pode nos afastar do engajamento com aquilo que está sendo contado. O ápice desta falta de carinho, contudo, está no extra-game, mais especificamente nos troféus e conquistas, todos com nome e descrição originais japoneses. Eu ganhei vários ao longo da campanha e não faço a mínima ideia do que fiz para merecê-los e, pior, não tenho nenhuma noção do que falta fazer para ganhar os demais. Talvez uma atualização no lançamento já corrija isso, mas para quem se importa com esse elemento, uma mancada enorme.

Nobunaga’s Ambition: Awakening é, sem sombra de dúvidas, um título completo e que aprimora muitas das principais mecânicas deste nicho que ajudou a criar e a alimentar desde 1983. Algumas pessoas podem se lembrar dos títulos de PS2, outros das versões para computadores, mas esta nunca foi uma marca para as massas, o que se deve não só à temática, que mesmo específica atrai as atenções de muita gente, mas principalmente porque é um jogo que não esconde suas pretensões de retroalimentar aqueles que já o esperam. Mesmo os níveis de dificuldade mais baixos esperam um certo conhecimento do modelo RTS de gerenciamento de propriedades e de táticas de guerra em tempo real, e tudo o que faz para explicar o jogo didaticamente só mostra o quão complexo ele pode ser à primeira vista. Aos insistentes ou já introduzidos ao gênero, todos os benefícios de um jogo que sabe criar um mosaico de possibilidades e bonificar quem consegue lidar com todas elas de forma equilibrada. Nesta jornada, tal como na guerra, não há espaço para principiantes.

Jogo (versão de PS4) analisado no PS5 com código fornecido pela Koei Tecmo.

Veredito

Ainda que exija muito do jogador logo de início e que não tenha a interface mais gentil principalmente para quem joga nos consoles, Nobunaga’s Ambition: Awakening é um legítimo representante do gênero. O título se apropria de tudo o que melhor fez nas últimas décadas, premiando os dedicados e estudiosos com histórias fascinantes, sistemas complexos de gerenciamento e ótimas opções para se atingir a glória.

70

Nobunaga's Ambition: Awakening

Fabricante: Koei Tecmo Games

Plataforma: PS4

Gênero: RTS

Distribuidora: Koei Tecmo Games

Lançamento: 20/07/2023

Dublado: Não

Legendado: Não

Troféus: Sim (inclusive Platina)

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Veredict

Even though it demands a lot from the player right from the start and it doesn’t have the nicest interface, especially for console players, Nobunaga’s Ambition: Awakening is a legitimate representative of the genre. The title appropriates everything that has done best in the past decades, rewarding the dedicated and studious with fascinating stories, complex management systems and great options for achieving glory.

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