Kong: Survivor Instinct – Review

Depois do fracasso retumbante e das críticas pesadíssimas recebidas por Skull Island: Rise of Kong, confesso que eu não imaginaria ver, ao menos tão rapidamente, um novo jogo tematizado com o macacão gigante. Para a minha surpresa (e, imagino, de muitos mais) eis que chega aos mercados Kong: Survivor Instinct, game que promete compor, canonicamente, o chamado Monsterverse, um universo compartilhado transmidiático que comporta também grandes filmes (pelo menos em escala de superproduções), e a série Monarch – Legado de Monstros, todos abordando a presença destes titãs colossais entre nós.

Levando-se um pouco mais a sério que seu malfadado antecessor, portanto, o jogo nos apresenta um ponto de vista bastante presente nas mais recentes produções deste universo, apontando para a jornada de pessoas comuns diante a catástrofe promovida por criaturas tão devastadoras. Aqui, conhecemos David, um operário da indústria petrolífera que busca encontrar a sua filha, Stacy, em meio ao caos de uma nova aparição destes monstros gigantes que, mais uma vez, andam se estranhando, em um momento após toda a destruição vista no primeiro Godzilla vs. Kong.

Kong: Survivor Instinct

Sua tarefa não será nada fácil, todavia. Não só por ter que se esgueiras pelos escombros dos distritos desta cidade agora em ruínas, evitando ser esmagado, devorado ou trucidado de formas inapeláveis, mas também por precisar enfrentar as Hyenas, um grupo ecoterrorista liderado Alan Jonah, antigo conhecido da franquia, além de outros inimigos inesperados. Esta jornada, portanto, nos coloca diante perigos em grande escala, mas também nos apresenta ao que há de pior nos seres humanos quando as coisas começam a desabar, em todos os sentidos.

Estamos, assim, diante um jogo de progressão lateral e exploração 2.5D, com elementos de plataforma, combate e solução de enigmas. Nosso herói improvável precisa reunir pontos de interesse espalhados pelos diferentes ambientes para potencializar um aparelho conhecido como ORCA Σ, baseado em tecnologias desenvolvidas pela Monarch, e assim conseguir aproveitar o poder de destruição dos titãs para abrir passagem e finalmente encontrar sua filha, desvendando, pelo caminho, os mistérios acerca dos projetos nos quais ela estava trabalhando.

Kong: Survivor Instinct

Visualmente, há algumas similaridades com outros projetos que abordam esta estética que mescla um pretenso realismo a traços marcantes, além de um bom uso de sistemas de contraste e iluminação soturna. Um bom exemplo referencial é o que se vê em This War Is Mine, tanto pelo modelo de corte lateral pelo qual acompanhamos nosso protagonista quanto pela textura da destruição urbana. Ainda que Kong: Survivor Instinct seja um pouco mais leve em tonalidade narrativa, é fácil entender suas aproximações. A modelagem do ambiente e a ocupação do espaço cênico são detalhados e coesos com a proposta do projeto, agregando-lhe valor de produção e verossimilhança.

Por outro lado, no aspecto da jogabilidade tudo é muito mais objetivo e voltado para uma progressão constante, com bom ritmo. A solução de enigmas envolve encontrar chaves, empurrar objetos e abrir passagens bloqueadas, estudando os acessos, na busca por interruptores escondidos ou geradores de energia. Nada disso, vale dizer, se prova tão complexo para quem já tem o costume de vasculhar cada cantinho em busca de recursos. Há um ou outro colecionável, normalmente vinculado a histórias complementares, mas o foco está bem direcionado na progressão e no abastecimento de recursos básicos de sobrevivência.

Kong: Survivor Instinct

A necessidade de se manter vivo, porém, expõe um dos principais aspectos questionáveis da obra, que é seu sistema de combate. Inicialmente, poder usar uma arma melee conjugada com armas de fogo parece trazer a combinação ideal para enfrentar o bando de desocupados que aparece de tempos em tempos para nos atazanar a vida, mas basta o primeiro encontro com grupos maiores de direções distintas para que a dinâmica amarrada mostre suas deficiências.

O enfrentamento corpo a corpo tem seus méritos, com ataque e defesa compondo uma estratégia simples de contra-ataque e reação, enquanto o uso de disparos a distância controla o perigo, mas se ver cercado por inimigos agressivos e bem armados traz a complicação de lidar com agressores de ambas as direções, cada qual com suas particularidades. Não são tão variados assim, e será fácil encontrar o brutamontes com um porrete, o malandro ágil com facões, além de variações destes usando armaduras e escudos. E há os que usam disparos, seja de pistolas, seja de espingardas.

Kong: Survivor Instinct

Mudar de direção rapidamente, como em jogos beat ‘em ups mais convencionais, ou mesmo considerando o modelo visto no recente Trek to Yomi, não é uma das tarefas mais confortáveis, e não serão poucas as vezes onde esta falta de dinamismo trará consequências bem desagradáveis. E se estar cercado é um problema, gastar as poucas balas que encontramos é pior ainda porque é uma péssima ideia ficar sem munição sobretudo ao levarmos em consideração que alguns puzzles dependem delas, como cadeados e caixas de energia distantes. Ser cadenciado é uma regra, que infelizmente não é acompanhada pela ação enfática dos agressores.

O sistema de mira com o gatilho direito também não é dos melhores em termos de precisão, e há que se pensar bem antes de perder munição à toa contra bichos rápidos ou pessoas menos perigosas. Mas tudo isso é ainda menos atrativo quando o modelo dá sinais claros de repetitividade já nos primeiros instantes de uma campanha que dura não mais que oito horas em uma primeira run. Este enfrentamento, portanto, é muito mais um martírio que só não é mais tedioso porque traz perigos constantes graças a falta de agilidade na troca de direção e ao escalonamento rápido do poder de fogo adversário.

Kong: Survivor Instinct

Os encontros contra os titãs, por outro lado, são mais interessantes por serem bem dosados, dinâmicos e criativos ao utilizar a arquitetura e as características dos nossos agressores em boas perseguições desequilibradas. Não que sejam passagens inovadoras ou originais, e você terá a sensação de já ter visto em algum lugar trechos como aquele onde precisamos evitar ser vistos pelo bichão olhando pela janela ou pelo buraco na parede, ou ainda sair correndo evitando a demolição promovida logo atrás de nós em um exercício coreografado de parkour. Mas no que falta de originalidade, sobra em design.

Aliás, outro ponto positivo aqui é a própria organização do ambiente, com cômodos, corredores, elevadores e uma infinidade de constructos reconhecíveis e bem engendrados. Há um backtracking esperando os mais distraídos, mas via de regra, há uma boa sensação de sempre se estar andando adiante, com poucos pontos para se perder ou ficar zanzando sem saber o que fazer. Armadilhas são constantes, algumas já manjadas como buracos profundos ou piso eletrificado, mas tudo é bem eficiente em transpor uma sensação de perigo presente.

Kong: Survivor Instinct

O gerenciamento de recursos também é bastante simples e dotado de todas as praticidades automáticas para evitar parar a ação o tempo todo. O inventário funciona ao vivo, na parte de baixo do HUD, sem exigir uma manipulação especializada. Coletar balas enche suas cargas extras, a recarga é automática, e o mesmo vale para o uso de engrenagens para se consertar dispositivos avariados. Toda a interação com o mundo do jogo se dá pelo toque de um botão.

Encontrar garrafas extras de água, a cada duas descobertas, aumenta naturalmente as barras de vida, assim como pentes extras para carga da arma de fogo nos dá um acréscimo permanente na capacidade de armazenar munição. O uso de marretas pesadas é aprendido com um rápido exemplo, e a maior intervenção voluntária do jogador está no uso de itens de cura, estes sim de acionamento manual. A interface, portanto, é desenhada para a praticidade, o que por muitas vezes simplifica tudo para que a atenção esteja em outros pontos cruciais, como o entendimento do ambiente e a sobrevivência. Resta ao menu complementar detalhes sobre a missão, um bom mapa, o bestiário e informações secundárias.

Kong: Survivor Instinct

Tudo isso, entretanto, não encobre o fato de que o jogo que leva o nome de um dos personagens mais celebrados da história do cinema tem pouquíssima participação dele. Mesmo na abertura, quando o caos gira em torno da sua ação, suas aparições são limitadas em tela, e isso se esvai ainda mais com o desenvolvimento da jornada. Ou seja, há muito pouco Kong em Kong: Survivor Instinct.

Não que eu estivesse esperando sair destruindo cidades inteiras na pele desse gorila crescido ou algo perto disso, primeiro porque a divulgação sempre foi transparente sobre quem seria o nosso avatar aqui, e segundo porque essa foi a ideia que afundou com o jogo do ano passado e obviamente precisávamos de uma outra abordagem. Mas é fato que se espera um pouco mais de imposição e imponência do rei em um título que leva seu nome. Até mesmo a excelente Abaddon tem mais presença em tela, nem tanto pela quantidade, mas principalmente pela qualidade.

Kong: Survivor Instinct

Dito isso, Kong: Survivor Instinct é sim um jogo bastante interessante de ação e exploração com algumas pitadas de metroidvania, mesmo que o seu sistema de combate seja muito mais enfadonho do que divertido. A perspectiva da insignificância humana é uma constante nesta nova fase deste universo, e aqui ganha mais um capítulo que mantém a média, mesmo que as pessoas sejam necessariamente menos interessantes que as criaturas que dominam o planeta. Se no cinema o equilíbrio no foco em personagens parecidos conosco por vezes cambaleia, aqui a sensação é de que é um acerto, mesmo que sacrifique aquilo que mais queremos ver no final das contas, que é monstro derrubando prédio. Infelizmente, isso fica pra depois.

Jogo analisado no PS5 com código fornecido pela 7Levels.

Veredito

Mesmo com um combate aquém do esperado e pouca presença de sua maior estrela, Kong: Survivor Instinct consegue capturar bem os conceitos do chamado Monsterverse e oferecer uma boa jornada humana diante a destruição promovida por estes grandes titãs, aproveitando-se de uma narrativa universal de busca e mecânicas típicas de exploração e solução de puzzles.

75

Kong: Survivor Instinct

Fabricante: 7Levels

Plataforma: PS5

Gênero: Ação / Aventura

Distribuidora: Legendary Entertainment

Lançamento: 22/10/2024

Dublado: Não

Legendado: Sim

Troféus: Sim (inclusive Platina)

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Veredict

Even with combat that falls short of expectations and little presence of its biggest star, Kong: Survivor Instinct manages to capture the concepts of the so-called Monsterverse well and offer a good human journey in the face of the destruction caused by these great titans, taking advantage of a universal quest narrative and typical exploration and puzzle-solving mechanics.