Have a Nice Death – Review

Com os roguelites cada vez mais populares, classificar um bom jogo desse gênero nem sempre é uma tarefa simples. Eles são jogos que se caracterizam principalmente por sua repetição, portanto devem oferecer alternativas de jogabilidade suficientes para manter o jogador motivado para investir muitas horas no mesmo conteúdo. Isso parte da necessidade de um sistema de combate envolvente, mas que também contemple um nível de desafio bem equilibrado. E se o jogo em questão ainda tiver uma boa ambientação, isso contribui ainda mais para aumentar suas chances de sucesso.

Com isso chegamos a Have a Nice Death. O jogo desenvolvido pela Magic Design Studios segue a história da própria Morte, diretora da empresa Death Inc., em um momento onde ela sofre com um processo de burnout, causado por uma disputa interna entre seus subordinados para encherem os departamentos da empresa com mais almas. Decidida a sair em merecidas férias, a Morte agora precisa pegar sua foice e visitar todos os setores da Death Inc. na intenção de colocar os funcionários em seus devidos lugares e restaurar a ordem na companhia.

Have a Nice Death se caracteriza por uma temática mais sombria, onde é praticamente impossível olhar para sua excelente direção de arte e não se lembrar de alguns clássicos da obra de Tim Burton. O game constantemente faz uso de um humor sarcástico para abordar assuntos comuns ao dia a dia de muitos trabalhadores, como estafa, estresse, vícios e ansiedade. Muitas informações são obtidas através de diálogos entre a Morte e os demais funcionários da Death Inc., que além de proporcionarem momentos engraçados também podem levar a algumas missões secundárias.

Em termos de design dos mapas, o jogo conta com um bom sistema de geração aleatória onde cada nível representará uma sessão da Death Inc. Dentre eles podemos destacar o departamento das doenças físicas, dos vícios, das comidas tóxicas, da poluição industrial, dentre outros. Cada um desses departamentos possui seus próprios inimigos e chefe final. Só que por mais que o jogo ofereça boas alternativas na geração do layout dos departamentos, o fato de predominar na maioria dos cenários uma paleta de cores mais acinzentada acaba os tornando bastante similares. De certa forma, isso é amenizado pelo contraste colorido dos efeitos de explosões causados pelos inimigos e pelas habilidades na tela, mas ainda é algo que pode causar uma sensação exagerada de repetição para alguns jogadores.

No meu caso, no entanto, essa semelhança jamais foi um empecilho ao longo das muitas runs que foram necessárias para concluir a campanha pela primeira vez. O motivo maior disso é que Have a Nice Death possui um combate frenético e bastante responsivo, repleto de alternativas de customização que vão tornar cada run única. Para enfrentar seus inimigos, a Morte conta com um bom arsenal de armas e habilidades. Ao início de cada run você terá a opção de escolher uma das armas principais disponíveis. Essas armas são foices que apresentam características diferentes de ataque, variando desde uma versão equilibrada para até uma foice retrátil que pode atingir inimigos em médias distâncias.

O combate é o típico de um jogo de ação hack ‘n’ slash 2D, com destaque para os ataques básicos de foice que percorrem uma boa distância, tanto na horizontal quanto na vertical, e de forma muito rápida. Há também um dash que vai garantir alguns frames de invencibilidade para desviar de golpes inimigos. A movimentação da Morte é bem ágil e os comandos respondem de maneira bastante satisfatória e sem apresentarem qualquer tipo de atraso.

Para adicionar mais variedade ao combate, a Morte conta com algumas habilidades. Essas habilidades são divididas entre a Capa e Feitiços. Os ataques de capa normalmente são armas de dano físico que possuem as mais variadas formas e padrões. Dentre elas estão os martelos, espadas, arco e flechas, lanças e muitas outras. Já os feitiços são habilidades que consomem mana e se caracterizam, na maior parte, por causarem dano em área ou até elemental. Tanto as foices quanto as habilidades possuem um golpe especial que quando carregado libera um poder em área capaz de limpar uma sala em questão de segundos ou causar um dano considerável aos chefes. As habilidades também têm níveis diferentes de raridade e são encontradas de forma aleatória em áreas do mapa e em andares específicos.

As foices e as habilidades podem ser melhoradas na sala de controle, um andar que comumente aparece antes das lutas contra chefes. O jogo conta com três tipos diferentes de moeda, sendo o almário o item básico para comprar diversos benefícios que perduram até o final daquela run. Já os lingotes de ouro são usados para comprar itens permanentes na sala da Morte. Um outro tipo de moeda, mais raro, é o prísmio. Ele apenas é obtido em andares específicos e serve para comprar melhorias únicas para as armas ou para melhorar os itens da Loja para aquela run. 

A aleatoriedade é o ponto principal que vai ditar os rumos do jogo. A começar pela disposição das salas de cada departamento. Todos os departamentos serão divididos por sete andares. Esses andares podem ser focados em desafios, itens de cura, moedas do jogo, loja de itens, salas de armas, subchefes, dentre muitos outros. Ao final de cada andar você deverá decidir seu próximo destino através das opções oferecidas aleatoriamente. Saber identificar as melhores opções de andares aumenta sua chance de encontrar itens mais relevantes para montar sua build para aquela run. Andares que apresentam um risco maior terão recompensas melhores, mas também podem significar um fim precoce para sua corrida.

Por sinal, Have a Nice Death é um jogo bastante desafiador. Até mesmo inimigos básicos são capazes de arruinar sua run por um mero descuido. Muitos dos inimigos elite e dos chefes causam um dano considerável, então por mais que o game se caracterize por seu ritmo mais acelerado ainda será necessário avançar com cautela. O último andar de cada departamento sempre será marcado por uma luta contra um chefe. Os chefes possuem um nível de desafio alto e serão necessárias algumas tentativas até que você consiga entender cada padrão de ataque e de movimentação deles.

Como na maioria dos jogos roguelite a recuperação de vida é limitada. Só que Have a Nice Death possui um mecanismo que adiciona um pouco mais de risco ao combate. Sua barra de vida, de certa forma, por muitas vezes ficará dividida. Uma parte dela, representada pela cor cinza, corresponde ao que pode ser recuperado com itens de cura padrão do jogo, chamados de Anima. No entanto, alguns ferimentos mais profundos deixarão uma porção de sua vida na cor preta. Essa fração somente será recuperada com itens específicos encontrados nos cenários e em lojas.

Outro conceito importante para o desenvolvimento de sua run é o das maldições. Em alguns cenários ou após as lutas principais você será obrigado a escolher uma carta contendo uma maldição. Por mais que o nome sugira algo ruim, muitas dessas maldições trazem apenas benefícios. Porém, isso muda um pouco conforme você avança de nível, até chegar ao momento onde as maldições também causarão penalidades. As maldições são divididas em três grupos de cores. As vermelhas influenciam nas foices e ataques de capa. As azuis controlam a defesa, a cura, a movimentação e também concedem benefícios passivos. Já as verdes são referentes às habilidades de feitiços e consumo de mana. No caso das penalidades, elas podem afetar sua capacidade de causar dano, sua reserva de mana, o preço dos itens nas lojas, aumentar o dano dos inimigos ou até adicionar novos ataques para eles. Compreender como tirar o melhor proveito dessas maldições em conjunto com os itens e habilidades que forem obtidos ao longo da run será fundamental para aumentar suas chances de progresso.

Lógico que,  como um roguelite, Have a Nice Death também conta com um sistema de progressão permanente. Para cada nível de personagem alcançado, algumas melhorias serão liberadas. Essas melhorias incluem uma cura extra no início da run, novas possibilidades de maldições e atalhos para salas dos chefes.

Além disso, você também poderá comprar habilidades e comidas com lingotes de ouro conforme progride de nível e cumpre algumas tarefas. Esses itens, no entanto, apenas serão garantidos uma única vez ao início da próxima run. Depois disso, deverão ser encontrados de forma aleatória ao assinar um contrato ao início de cada nova corrida. Por isso, parte da progressão permanente fica limitada por esse elemento de aleatoriedade tão marcante no jogo. Isso é algo que tende a desagradar alguns jogadores, pois a sensação de progresso permanente é pequena. No caso dos atalhos para os andares dos chefes, por exemplo, isso sequer chega a ser uma opção viável, pois o jogo é muito dependente da build que você montará ao longo de toda a run.

O game ainda conta com alguns modos de dificuldade, inclusive oferecendo um nível mais fácil em que o dano causado pelos inimigos e a barra de vida deles são reduzidos. Nesse modo, você também terá acesso a mais itens de cura e sua vida voltará em maior quantidade ao final de cada departamento. Isso pode ser uma boa alternativa para quem estiver frustrado com o jogo ou para os que forem novatos no gênero. Já para quem quiser um desafio ainda maior, também há níveis de dificuldade que aumentam conforme você progride, deixando o jogo mais punitivo a cada run concluída com sucesso.

Particularmente, penso que no modo normal o jogo ficou bem no limiar entre o que considero ser um bom balanceamento de dificuldade e um combate recompensador. Claro que isso é algo bastante subjetivo, ainda mais quando o fator aleatório exerce um papel tão importante como no caso de Have a Nice Death. Mas como o sistema combate e a ambientação do jogo são extremamente divertidos, repetir diversas corridas em busca da melhor build me manteve sempre motivado. Houve casos em que a aleatoriedade me deixou decepcionado, mas em outros também consegui montar builds bastante poderosas. Tudo isso é fruto das muitas variáveis que o jogo proporciona, fazendo de Have a Nice Death um dos melhores roguelites que tive a oportunidade de jogar.

Jogo analisado no PS5 com código enviado pela Gearbox Publishing.