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Deus Ex: Human Revolution

Existe um Motivational Poster (aquelas imagens com fundo preto e duas frases) que diz “Deus Ex – cada vez que alguém menciona, outra pessoa reinstala”. Esta frase talvez seja perdida na geração mais nova que desconhece o que é Deus Ex (DX), então vou me desviar do caminho da análise por um instante.

DX foi lançado em 2000 pela Ion Storm, e é um dos “FPSs inteligentes” da época, juntamente com System Shock e Thief. Quando lançado, DX foi aclamado por apresentar várias escolhas de gameplay ao jogador, sem nunca apontar uma única opção correta – cada parte do jogo podia ser resolvida de várias maneiras, sem punir o jogador por suas escolhas de como atravessar os ambientes. Adicione a essa fórmula o enredo inteligente, a ambientação imersiva, os controles precisos e pronto: DX foi aclamado pela crítica e é figura carimbada em listas de “Melhores Jogos de Todos os Tempos”. Infelizmente, uma sequência fraca – Deus Ex: Invisible War(IW), que retirou diversos elementos que faziam DX único – fez com que a promissora franquia se tornasse algo mais obscuro – cultuado por muitos, mas sem o sucesso de atravessar gerações como Half-Life, por exemplo. Deus Ex: Human Revolution (HR) é fruto de toda essa história – a vontade de redimir IW, tornar DX relevante para a nova geração de gamers e mostrá-lo como algo único e fantástico, mantendo os moldes do DX original para agradar aos fãs de longa data. O resultado é, em uma palavra, superlativo.

Exitem dois temas constantes na série DX: a analogia bíblica de um messias para a humanidade(o próprio personagem principal de DX se chama JC Denton, uma alusão clara a Jesus Cristo) e a história de Dédalo (pai de Ícaro na mitologia grega), que nos jogos é indicativo dos perigos de se abusar do conhecimento ou da tecnologia em nossas mãos. HR é uma (de novo esse termo) “prequência” de DX, passando-se cerca de 25 anos antes da história do primeiro jogo. Mantendo-se fiel aos dois temas, seu personagem principal é Adam Jensen, chefe do deparamento de segurança da Sarif Industries, uma das empresas pioneiras no ramo das Augmentations (Augs) – uma descoberta revolucionária que destrava todo o potencial genético do ser humano, e que pode vir a mudar o próprio conceito de “humanidade” para sempre. Nem todos acham essas melhorias algo bom, porém. Aqueles que usam os Augs para melhorar seu desempenho ou substituir membros e funcionalidades perdidas de seu corpo veneram a tecnologia, enquanto os “puristas” possuem preconceito aberto contra os usuários de Augs, alegando que a manipulação genética que as corporações usam para criar os Augs é uma interferência direta na capacidade de evolução da espécie e que os usuários de Augs são “aberrações”, “ameaças”, “robôs” e outros termos pejorativos – pense nas comics dos X-Men para ter uma ideia de como funciona o mundo de Deus Ex.

Para acalorar ainda mais o debate, o corpo humano possui uma certa resistência contra os Augs, e as pessoas precisam usar uma droga chama Neuropozyne para evitar a rejeição aos implantes. A namorada de Jensen, Megan Reed, é uma das maiores autoridades no campo de pesquisa de Augs, e está para revolucionar o campo com uma descoberta sobre a rejeição dos implantes, quando a Sarif Industries é brutalmente atacada. Em uma ação rápida e precisa, os invasores destroem parte do complexo da empresa e eliminam os cientistas do projeto de Megan – incluindo a própria Dra. Reed. Jensen tenta deter os invasores, mas não é páreo para os soldados com Augmentations. Espancado, arremessado por um vidro e empalado vivo, Jensen praticamente morre, mas sobrevive ao receber grandes implantes de Augs (sem seu consentimento, diga-se de passagem), modificando seu corpo de forma severa. Seis meses depois e armado com as capacidades sobre-humanas conferidas por seus Augs, Jensen sai em busca da verdade sobre o ataque.

Se existe um ponto em que os fãs esperavam que HR se sobressaísse era seu enredo, e o jogo da Eidos Montréal não decepciona. A trama é fiel ao estilo de DX: madura, cheia de reviravoltas e conspirações, com personagens complexos e de personalidades bem definidas. Um ponto importante a se apontar é que embora a trama seja futurista e fictícia, ela não deixa de ressoar no mundo real, e não é difícil correlacionar com alguns assuntos polêmicos que dividem opiniões. HR é extremamente feliz em sua apresentação do conflito, condução e ritmo, mantendo o jogador desconfiado até o fim das intenções das várias partes que compõem o mundo de Deus Ex.

Essa busca de Jensen pela verdade, aliás, possui duração variável, dada a enorme quantidade de conteúdo (tanto obrigatório quanto opcional) do jogo, e particularmente, demorei cerca de 45 horas em minha primeira vez – completando todas as sidequests e com uma quantidade razoável de exploração, na dificuldade Normal. Fazer apenas a história deve demorar cerca de metade desse tempo, o que ainda é impressionante para o padrão atual de jogos com cerca de 10 horas quando muito. As sidequests, por sinal, são ótimas por se integrarem de forma convincente ao mundo do jogo, e são todas relevantes ao enredo – algumas, como Motherly Ties, são tão ligadas à história principal que é difícil crer que se tratam de buscas opcionais. Quem procura conteúdo e exploração certamente não vai se decepcionar com HR.

E já que falamos em exploração, esta é uma das melhores partes de HR. Os ambientes são amplos, variados e possuem sempre pelo menos duas formas diferentes de se atravessar. Em uma geração que os “shooters-corredores” são cada vez mais populares, a grandeza dos ambientes de HR chega a ser desconcertante – o que, entretanto, não é surpresa alguma para que esperava algo nos moldes de DX. As cidades de Detroit e Heng Sha funcionam como “Hubs”, lugares maiores de onde você acessa outros para completar suas missões – ambas são grandes tanto horizontal quanto verticalmente, e possuem segredos e easter eggs espalhados em seus menores detalhes. A diversidade de caminhos é fruto direto do tipo de gameplay baseado em “escolhas”. Completar missões, objetivos secundários e eliminar os inimigos (de forma letal ou não) rende XP, e com XP você consegue Praxis Points (PP). Os PPs são utilizados para se destravar os upgrades de Jensen, e você pode utilizá-los da forma que bem entender. O menu de upgrades é intuitivo e bem montado, separando os Augs por partes do corpo de Jensen.

A grande beleza de HR está no fato de que não existe “upgrade errado”. Se você quiser se focar apenas nos upgrades de hackeamento, o jogo não irá se tornar mais difícil por causa disso, e você terá sempre um caminho para cumprir seu objetivo. Se quiser aumentar a força dos braços e a altura do pulo, ótimo. Se quiser aumentar apenas stealth, você não será punido. Idem para combate, conversação e todos os outros upgrades – independentemente do que você escolha aumentar, HR sempre possui algo para você. Se você não possui o código de uma porta, pode tentar hackeá-la. Se não conseguir hackear, pode quebrar uma parede. Se não tiver o upgrade de destruir paredes, pode pular o muro com o upgrade de pulo e entrar na sala. Se não tiver nenhum dos dois, pode procurar por perto que você vai achar um ducto de ventilação, outra porta ou o que quer que seja. As fases possuem caminhos redundantes justamente para que o jogador nunca fique preso porque deixou de comprar o upgrade A ou B, e o cuidado dispensado a essa parte do design é nada menos que fenomenal.

Outro ponto relativo à escolha é a moralidade. Eu sou um frequente crítico do sistema de moralidade nos games recentes, que se resumem basciamente a “aperte X para salvar órfãos ou O para queimar o orfanato” (vide inFAMOUS, por exemplo). É raro ver um jogo que apresenta múltiplas decisões igualmente aceitáveis para a resolução do conflito como HR o faz. Apenas para citar um evento “simples”, em uma sidequest você encontra um personagem que foi baleado e está morrendo. Ele sabe que não terá tempo de chegar ao Hospital e que invariavelmente morrerá. Ele está sentindo muita dor, e é um dos “puristas” da população do jogo – ou seja, ele não tem absolutamente nada a favor de Jensen. Ainda assim, ele pede para que você lhe aplique um anestésico para diminuir sua dor, e eventualmente pede uma dose suficiente da droga para poder morrer em paz e sem sofrimento. Fica aí sua dúvida: você se compadece do sofrimento dele e atende a seu pedido, fazendo uma eutanásia e ganhando a simpatia dele em seus momentos finais de vida, provando que seus Augs não tiraram sua capacidade de empatia? Ou você se recusaria a matá-lo por misericórdia, deixando-o vivo mas com seu ódio por pessoas com Augs maior que nunca? Esse tipo de decisão moral está presente a todo tempo em HR, e não possui um medidor para dizer se você está “certo” ou “errado”. O fato de que estas decisões pouco influenciam no andamento do jogo (os eventos gerais são os mesmos, com algumas pequenas mudanças no decorrer das missões), mas ainda assim conseguem levar o jogador a pensar, é mais uma prova de quão bom o roteiro de HR é.

Com tantas escolhas e possibilidades de gameplay, fica apenas a questão de como se aproximar dos inimigos: letal/não letal e conflito aberto/stealth, lembrando em muito o funcionamento de Metal Gear Solid, em especial Guns of The Patriots, no sentido de que o jogo estimula o stealth, mas tem mecânicas de tiroteio bem polidas para satisfazer quem quer uma aproximação mais direta. De forma resumida, digamos que stealth e não-letal sejam mais difíceis, mas rendem mais XP, enquanto conflito aberto e letal oferecem soluções mais rápidas e permanentes ao custo de menor XP ganha. O jogo funciona basicamente em primeira pessoa, mas adquire uma perspectiva em terceira pessoa quando Jensen entra em cover, sobe uma escada, faz um takedown ou usa algumas Augmentations específicas, garantindo que sua visão não seja obstruída. Os controles funcionam muito bem, há uma boa variedade de armas e upgrades para as mesmas e existem Augs voltados tanto para o combate (proteção contra gases venenosos, eletricidade, diminuição do recoil e da retícula das armas, entre outros) quanto para o stealth (diminuir o som de seus passos, corrida mais longa, camuflagem etc.), então você estará bem servido de qualquer forma que optar.

Graficamente, HR é um colírio. Os ambientes são, além de enormes, detalhados e com ótimas texturas. Os personagens são bem modelados, com um destaque especial para as partes robóticas como os braços de Jensen, por exemplo, que são extremamente bem animados. A paleta de cores tem predomínio forte de dourado, o que garante ao jogo o visual futurista a que se propõe e funciona muito bem para criar a ambientação de Detroit e Heng Sha. O jogo ainda conta com CGs belíssimas, e embora estas sejam cada vez menos relevantes, dada a beleza dos gráficos in-game, ainda assim são uma bela adição ao jogo. Minha única crítica aos gráficos fica por conta das expressões corporais, que embora não sejam mal-feitas, são exageradas e muitas vezes não combinam com o que o personagem está falando – algo que é mais característico da Square-Enix e alguns jogos japoneses do que de uma softhouse canadense com a Eidos Montréal.

A trilha sonora de HR é excelente. Composta por Michael McCann (mais conhecido por seu trabalho em Splinter Cell: Double Agent), ela em muitos momentos lembra Half-Life 2, e casa perfeitamente com a ambientação do jogo. As vozes, num geral, são ótimas, embora contem com dubladores relativamente pouco conhecidos. Elias Toufexis dá vida a Adam Jensen e é certamente o destaque da dublagem, falando sempre em um tom monótono e grave que lembra em muito o Batman de Christian Bale no recentes filmes do Homem-Morcego. Algumas vozes, porém, sofrem com falta de entonação (especialmente David Sarif, embora apenas em alguns poucos momentos), enquanto outras são simplesmente horríveis (Letitia, a informante de Jensen). No geral, porém, o áudio de HR é ótimo.

Se existe algo em que HR peca, são nos chefes. Existem 4 chefes no jogo, e você é obrigado a enfrentar e matar todos. A palavra “obrigação” é muito deslocada em um jogo que privilegia e se gaba tanto das escolhas que dá ao seu jogador, e essas batalhas contra chefes fogem bastante do padrão do jogo. Ainda assim, não é como se você não tivesse opções de como enfrentar cada um desses encontros, mas comparado a DX, em que você podia de fato evitar o conflito com os chefes de alguma forma, é um ponto um tanto quanto decepcionante.

Esse detalhe, porém, não é suficiente para desmerecer Human Revolution. Deus Ex é um marco da indústria, e Human Revolution é o sucessor à altura que os fãs tanto esperavam. Mais do que uma homenagem ao primeiro DX, HR é quase um ode ao mundo dos videogames. Obrigatório, sem mais.

— Resumo —

+ Stealth executado de forma espetacular
+ Moralidade excelente
+ Enredo maduro e ambientação fantástica
+ Design de fases soberbo
+ Trilha sonora sensacional
+ Excelente duração de jogo
+ Sidequests bem executadas e segredos a perder de vista

Atuação de voz inconsistente e movimentos corporais exagerados
Batalhas contra chefes parecem deslocadas do contexto do jogo

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98

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