Foram necessários mais de sete anos para que a sequência de um dos melhores RPGs roguelike chegasse às plataformas Playstation. Lançado em 2016 para PS4 e Vita, Darkest Dungeon deixou seu marco por estabelecer um casamento sublime entre RPG de turno e roguelike. O jogo da Red Hook Studios cativou não só pela sua experiência profunda e brutal, mas por conter uma narrativa muito peculiar – quem não se lembra do trabalho de voz de Wayne June?
Por muitos anos, até a chegada da sequência, trilhar as masmorras de Darkest Dungeon se tornou um rito anual meu. Joguei diversas campanhas e me espantava positivamente com o mar de possibilidades que o jogo oferecia. Em virtude da minha paixão pelo jogo, obviamente recebi com muito entusiasmo o anúncio da segunda edição. Mas logo, o ceticismo imperou – ao ler as impressões do Early Access no PC, me dei conta de que a Red Hook tomou um caminho bastante distinto do estabelecido no primeiro game. E os relatos da comunidade, por um tempo, foram bastante negativos.
Darkest Dungeon II chega ao Playstation 4 e 5 com todas as melhorias e conteúdos adicionais lançados para o PC, o que obviamente a torna uma versão bem mais satisfatória do que a de seu lançamento via Early Access. Nem tudo está incluso na versão base, no entanto. Para desfrutar da experiência completa, é preciso adquirir a “Edição Esquecimento” (Oblivion Edition), que traz o DLC do personagem Crusader.
Como mencionado acima, a sequência destoa substancialmente do primeiro jogo. Há coisas que mudaram para a melhor, outras nem tanto. Começando pelos pontos positivos; Darkest Dungeon II traz uma maior variedade no combate, tendo em vista que cada personagem possui mais de dez habilidades. Além disso, agora há a possibilidade de alterar “caminhos” de um personagem – uma especialização que muda as propriedades de um personagem durante o combate. Tomando como exemplo a Vestal, um de seus caminhos alternativos permite que a mesma foque no combate melee, enquanto diminui seu poder de assistência.
Para mudar a especialização de um personagem é preciso gastar dinheiro, mas antes disso, é necessário liberar tal proficiência no início da campanha, gastando uma das principais moedas do jogo; as velas.
O componente de Darkest Dungeon II que mais mudou foi a forma como a jornada é feita. Neste jogo, uma carruagem vai conduzir quatro guerreiros de sua escolha e passar por diversas regiões, até chegar a montanha final, onde um chefe final lhe aguarda. Ao terminar cada região, o jogador chega a uma taverna onde poderá descansar, comprar itens, consertar a carruagem, entre outras coisas. Funciona como o hub do jogo, da mesma forma que o vilarejo servia para o primeiro game.
Ocorre que em Darkest Dungeon II, ao terminar uma jornada (morrendo, desistindo ou derrotando o boss final na montanha), o jogo reseta e praticamente tudo que foi coletado é perdido, com uma única exceção – as supramencionadas velas. Este item serve para adquirir upgrades permanentes para esse sistema roguelite. Podem ser a liberação de novos itens para combate, novos equipamentos (trinkets), equipamentos para a carruagem, habilitar novos personagens, entre outras melhorias.
Cada jornada desta edição dura algumas poucas horas. Depois disso, o jogador é forçado a recomeçar com alguns upgrades incrementais. Isso pode ser bastante desestimulante para um jogo de RPG. Além disso, questiono recorrentemente a decisão de travar novos itens e equipamentos por meio deste sistema de destravamentos de um roguelite. É frustrante ter a ciência de que no início do jogo estaremos jogando, por um bom tempo, uma versão limitada e com pouca variedade. Infelizmente é preciso persistir por dezenas de horas, até que Darkest Dungeon II apresente todo seu potencial. Neste quesito, o design do primeiro jogo era mais interessante.
Mas Darkest Dungeon II traz outras melhorias que compensam estas limitações. Um upgrade muito interessante é o sistema de afinidades entre os personagens. Dependendo das escolhas do jogador, da performance no combate e ao usar determinados itens, os quatro personagens que embarcaram na carruagem podem desenvolver sentimentos uns pelos outros – desde profundo desgosto, a um sentimento de companheirismo que traz reflexos significativos no combate.
Se dois personagens estão em bons termos, ao utilizar uma habilidade, o jogador poderá ser recompensado com um buff de status ou até mesmo diminuir o stress. Já nas ocasiões em que há uma desavença, o efeito oposto poderá ser observado. Essa mecânica é fundamental para se obter sucesso nas jornadas mais difíceis e todos devem se atentar a isso. Vale ressaltar que a relação das personagens estão em constante alteração e os bônus ou prejuízos advindos deste elo são determinados no início de cada região do jogo.
O sistema de stress está de volta e pouco mudou. Além de se preocupar com o HP das personagens, é preciso estar atento ao medidor de stress de cada um. Ao preencher os dez pontos de stress de um guerreiro, a sorte determinará se o mesmo terá um colapso ou se terá uma atitude positiva e radiante. As consequências disso podem ser drásticas para uma luta, a ponto de culminar em uma “bola de neve” que levará à morte de todos os integrantes.
Mas se para o sistema de stress houve poucas mudanças, o mesmo não se pode dizer da narrativa e história de Darkest Dungeon II. No primeiro Darkest Dungeon, a narrativa era muito centrada na história do antepassado, dando pouca importância para os combatentes. Felizmente o segundo corrige tal aspecto.
Ao percorrer as perigosas estradas com a carruagem, existem diversos pontos de interação no mapa. Um deles é um santuário de reflexão que permite revisitar o passado de um dos personagens da party. Em alguns casos, há apenas um relato dos fatos. Em outros, o jogador rememora os episódios mais traumáticos da personagem, por meio de um gameplay que mistura combate e puzzle. Ao terminar cada episódio do passado, o jogador é também agraciado com novas habilidades permanentes para o combate.
Tecnicamente, o segundo jogo da Red Hook Studios é bem competente. Embora exista um charme na utilização das artworks 2D do primeiro jogo, a transição para modelos poligonais em Darkest Dungeon II resultam em melhores animações no combate. Os cenários trazem um misto de elementos em 3D com assets em 2D, tudo feito de forma bastante simplória e com baixa contagem poligonal, mas o que realmente importa é que toda a identidade visual do artista Chris Bourassa foi transportada de forma fiel para esse novo formato. Um outro bônus é o fato da versão PS5 trazer a nítida resolução de 4k nativa, além dos 60 quadros por segundo.
Quanto ao áudio do game, a trilha sonora lembra bastante a do original. Wayne June também volta para narrar os eventos do jogos, mas sem monólogos tão emblemáticos como no primeiro. Vale apontar que em sua versão inicial, Darkest Dungeon II apresenta muitos bugs, especialmente nos menus. Alguns destes defeitos, forçam o jogador a resetar o game para resolver o problema, o que é um pouco incômodo.
Jogo analisado no PS5 com código fornecido pela Red Hook Studios.
Veredito
Darkest Dungeon II é bastante distinto do primeiro e é fundamental que os jogadores tenham ciência disso. É um jogo que traz boas novas ideias, apesar de possuir uma “limitação artificial” muito frustrante. O sistema de afinidades, o brutal e complexo sistema de combate, além do melhor desenvolvimento da narrativa são aspectos positivos que justificam o investimento nesse universo. Todavia, é uma pena que seja preciso dedicar muito tempo destravando novidades para que o jogo demonstre todo seu potencial.
Veredict
Darkest Dungeon II is quite different from the first and everyone should be aware of this. It’s a game that brings great new ideas, although followed by a very frustrating “artificial limitation”. The affinity system, the brutal and complex combat system, in addition to the better development of the narrative are positive aspects that justify the investment in this universe. However, it’s a shame that you have to spend a lot of time unlocking new features to see its full potential.