Uma boa propaganda para Danganronpa é uma mescla entre a história de Zero Escape e Ace Attorney. Dizer que a série é apenas isso é desmerecê-la bastante, mas é o suficiente para atrair fãs de visual novels a um novo universo com familiaridades. Another Episode faz parte da história principal de Danganronpa, mas, para todos os outros efeitos, é um spin-off, e tal propaganda não funciona aqui. Fãs de Zero Escape e Ace Attorney não vão encontrar quase nada familiar e mesmo os que já acompanham Danganronpa podem não se sentir confortáveis.
O motivo é simples: Another Episode é um third-person shooter. Embora ele tenha um foco grande em quebra-cabeças, no fim das contas você controla uma personagem segurando uma arma, e se quiser (ou se errar os desafios), a solução é partir para o tiroteio mesmo. É uma diferença e tanto do que se fazia antes, isto é, ler textos e fazer conexões lógicas. Apesar disso, o jogo só é recomendado para aqueles que já jogaram, no mínimo, o primeiro Danganronpa, e idealmente os dois, já que cronologicamente ele se encontra entre eles e deixa algumas pontas abertas para uma sequência.
Se passando após o término do primeiro jogo, a maior revelação de Danganronpa é apenas a porta de entrada – o mundo está em ruínas. Você controla Komaru Naegi, irmã do protagonista do primeiro jogo, que esteve trancada em um quarto desde o início da destruição do planeta. Um bom truque que Danganronpa e Danganronpa 2 usam é deixar que o evento trágico que deixou o mundo nesse estado se passe mais na imaginação do jogador do que em palavras na tela. Another Episode, por se passar fora da clausura de uma escola ou ilha, tem que mostrar esse mundo. E isso está intrínseco ao maior problema do jogo: exposição.
Exposição é a palavra-chave, porque todos os problemas de Another Episode são por conta disso, de uma forma ou de outra. Pode ser irônico reclamar de exposição num derivado de visual novel, mas a verdade é que Ultra Despair Girls é isso: um derivado, não uma visual novel. A quantidade de exposição em Danganronpa e Danganronpa 2 é necessária porque ela serve para construir o mundo, os personagens, o mistério, e por conta disso é elemento fundamental do jogo, sendo cobrada do jogador nos julgamentos no final de cada capítulo. Em Another Episode, não existem julgamentos. Em nenhum momento a informação que lhe é passada vai ser necessária e ela raramente constrói personagens, à exceção das duas protagonistas. Existe uma quantidade absurda de texto e cutscene que não tem importância alguma, e que serve apenas para interromper mais ainda o jogo. Existem momentos em que você passa de cena em cena, cada qual com duração de 5 minutos ou mais, sem nem dar 10 passos ou mirar a arma.
Outro problema relacionado à exposição é que a história tem várias falhas e, ultimamente, é mal contada, sendo a pior dos três jogos. Tendo que construir o mundo após o evento trágico, Another Episode faz isso colocando crianças como vilões. E embora a vilã principal seja fantástica, ela é a única que realmente tem tempo de cena e é desenvolvida, e mesmo ela ainda se encontra numa situação absurda demais para se dar crédito. Por mais insanos que os assassinatos dos jogos anteriores fossem, a explicação final os tornava críveis (dentro do universo do jogo, claro), enquanto que uma cidade dominada por crianças que comandam um exército de robôs beira o ridículo.
Quando o jogador tem controle, o jogo faz coisas bem interessantes. Existe uma miríade de salas no jogo que contêm quebra-cabeças cujo objetivo geralmente é destruir todos os robôs adversários em um único ataque. Para isso, é necessário organizar os inimigos em uma posição que propicie tal destruição, fazendo uso do arsenal de munições criativas da arma da protagonista, contando com tiros que fazem os robôs dançarem (dependendo do inimigo afetado, isso atrai outros para o mesmo local), tiros que movem objetos como carros, e tiros que dão controle temporário sobre um inimigo. Existe toda uma estratégia sobre qual tiro utilizar, em que inimigo utilizar, e que ordem utilizar, e tais desafios só vão ficando mais complexos conforme o jogo avança. Um problema é a distribuição desses desafios, assim como o ritmo do jogo no geral. Another Episode começa lento e arrastado, e só vai melhorar perto do final. O início, por conta disso, fica com poucas salas de desafio e o final é recheado delas em sequência (intercaladas com as sempre presentes cenas de corte, é claro).
Além de Komaru, é possível jogar com Toko Fukawa, do primeiro jogo, em seu alter-ego assassino, Genocider Jack. Controlá-la muda o jogo para um hack 'n slash, mas sem opções de combos, já que apenas um botão realiza ataques (e outro utiliza um especial quando está carregado). A variação é bem vinda, mas o modo só serve para tirar o jogador de situações perigosas e deixa tudo bem fácil. Além dos desafios e tiroteios, Another Episode conta com um pouco de exploração e algumas charadas que envolvem o cenário. Nada muito elaborado, mas o suficiente para quebrar o ritmo. Uma das charadas é particularmente insana, mas o jogo fornece dicas para aqueles que estiverem travados.
Veredito
Por ser diferente dos demais, Another Episode não funciona como propaganda para a franquia. É difícil recomendá-lo a novatos, não só por isso, mas pela história que entrega muito do Danganronpa original. Já fãs da franquia provavelmente terão opiniões mistas. Apesar de pontos negativos bem evidentes, Ultra Despair Girls tem pontos positivos, e o principal deles é o charme – e isso só funciona porque ele carrega o nome da série nas costas. Do design dos robôs Monokuma às músicas bizarras, do estilo de arte único da franquia aos personagens insanos e descrição explícita de violência, o passeio pelo mundo se torna melhor só por ser um Danganronpa. É irônico porque é justamente por ser um Danganronpa que ele acaba sofrendo tanto. E em um paradoxo maior ainda, provavelmente não funcionaria se não fosse.
Jogo analisado com cópia digital fornecida pela NIS America.