Uma vila cercada por uma floresta sombria, onde desaparecimentos de seus moradores é algo comum e as pessoas vivem com um sentimento de medo constante. Essa descrição pode parecer familiar, e realmente Children of Silentown possui elementos que nos rementem a algumas histórias conhecidas. Mas o jogo desenvolvido pela Elf Games, em parceria com a Luna2 Studios, e publicado pela Daedalic Entertainment definitivamente possui uma identidade própria.
Neste jogo de aventura point-and-click você assumirá o papel de Lucy, ou Luzia na adaptação para o português brasileiro, uma criança de doze anos frequentemente assombrada por pesadelos com as criaturas que vivem na floresta ao redor da vila, a pequena Silentown. A vila pode até parecer um lugar pacato durante o dia, mas muda drasticamente ao cair da noite, quando é possível ouvir os rugidos dos monstros. Ao longo dos anos foram vários relatos de pessoas desaparecidas, supostamente levadas, que fizeram com que os habitantes adotassem algumas regras: não é permitido falar alto em Silentown e de forma alguma as pessoas devem circular pela vila durante a noite.
Em meio a este ambiente cheio de regras e envolto por pavor, Lucy tenta seguir uma rotina normal. Ela passa a maior parte do dia se divertindo com as outras crianças da vila, ajudando os pais em tarefas do lar, cuidando do seu gato de estimação e estudando música com sua mãe. Porém, quando uma nova série de desaparecimentos volta a assombrar a vila, Lucy começa a questionar o que fato acontece em Silentown e porque os adultos nunca se empenharam em encontrar os desaparecidos. Convencida de que já é crescida o bastante para investigar tudo sozinha, ela parte em buscas de respostas que podem até mesmo leva-la ao encontro de seus piores pesadelos.
O tema principal de Children of Silentown é o medo e como ele pode afetar a vida dos habitantes da vila. Nos primeiros capítulos do jogo você vai conhecer melhor Lucy e sua família, explorar o cotidiano de Silentown e de seus moradores, e também aprender um pouco mais sobre os mistérios que circundam o local. Conforme for avançando, a história vai tomando um rumo mais obscuro até chegar no momento em que Lucy sai para explorar a floresta e os mistérios começam a ser revelados.
A evolução da narrativa acontece de forma gradual, sempre intercalada com cutscenes que representam os pesadelos de Lucy e também outros momentos de suspense. Apesar de não ser um jogo dos mais assustadores, é elogiável como o enredo e a ambientação funcionam muito bem em te deixar o tempo todo apreensivo pela conclusão da história.
Completar Children of Silentown pode levar por volta de 6 horas, podendo variar dependendo de tempo investido para encontrar as pistas e as respectivas soluções para os quebra-cabeças. Ao longo da campanha você vai encontrar colecionáveis, minigames, possibilidades de diálogos opcionais e situações em que deverá tomar algumas decisões. Essas decisões, aliás, incluem a escolha dentre os quatro finais disponíveis. Vale salientar que alguns finais se encaixam melhor com a história do que outros, em especial um que considero ser o final secreto e que depende de algumas condições especiais para ser liberado. Mas se por um lado isso pode até ser visto com um bom fator replay, por outro lado, em se tratando de um jogo cujo ponto forte da jogabilidade está na solução dos quebra-cabeças, revisitar a campanha outras vezes já conhecendo essas soluções talvez não seja algo muito apelativo.
A ambientação é outro destaque positivo em Children of Silentown. Idealizado como um curta de animação, mas logo redirecionado para o meio interativo, o jogo foi sendo desenvolvido de forma lenta, muitas vezes apenas aos finais de semana e durante as horas vagas da pequena equipe de desenvolvimento. Mas isso de maneira alguma afetou sua qualidade. Pelo contrário, é nítido perceber a enorme dedicação e o apreço colocados no trabalho de desenvolvimento. O design de arte é todo feito à mão e inspirado na obra de Tim Burton e em animações como Coraline e o Mundo Secreto. Isso resultou em um jogo que não só é graficamente muito bonito, mas que também combina perfeitamente com sua proposta.
O mundo é rodeado por uma atmosfera soturna e passa uma sensação que, por mais tranquila que cada situação possa parecer, sempre há uma tensão de que algo terrível está por vir. Essa sensação é ainda melhor transmitida quando em conjunto com bela trilha sonora de Children of Silentown que, apesar de não ser muito vasta, traz um clima melancólico ao jogo e passa o exato sentimento de cada momento presenciado.
Na questão da jogabilidade Children of Silentown se inspira nos clássicos jogos point-and- click da década de 90, onde a maior parte das ações envolve investigar cenários, procurar por itens, conversar com NPC’s e encontrar soluções de interação para avançar pela história. Nesse caso, a maioria das soluções são criativas e sempre vão exigir que explore cada detalhe dos mapas. Alguns itens deverão ser combinados entre si para serem utilizados e isso aumenta ainda mais as possibilidades de resolução dos enigmas. Já os comandos de point-and-click foram muito bem adaptados para o console e funcionam sem problemas no controle DualSense.
Outra fato importante do gameplay é o sistema de canções. Ao longo da campanha Lucy vai aprendendo notas musicais que vão sendo agrupadas para formarem canções. Elas serão usadas durante a campanha de diversas maneiras, seja interagindo com personagens, objetos ou até mesmo com o ambiente. Por exemplo, um canção pode ser usada para revelar pensamentos dos personagens e servir como uma forma de coletar informações sobre eles. Além disso, sempre que uma interação com uma canção for bem sucedida resultará em um pequeno quebra-cabeças e, somente ao soluciona-lo, você terá acesso ao conteúdo da informação para avançar pela história.
Particularmente achei o sistema de canções um toque muito sútil, que contribuiu ainda mais para a construção da personalidade de Lucy e se encaixou perfeitamente na temática do jogo. Já os quebra-cabeças das canções na teoria seriam uma boa maneira de intercalar com a tradicional jogabilidade dos jogos point-and-click, mas na prática tendem a se tornar monótonos ao longo do tempo. Um desses quebra-cabeças se mostrou até um pouco confuso, ao ponto de me deixar frustrado em algumas situações. Isso foi se tornando ainda mais perceptível conforme estava próximo da conclusão do jogo e notei um uso excessivo dessa mecânica.
Em suma, Children of Silentown funciona como um bom jogo point-and-click. O sistema de canções traz algo único para o gênero, mas as diversas pausas na história para solucionar alguns quebra-cabeças pode atrapalhar a experiência de alguns jogadores. O design gráfico feito à mão é formidável e isso já seria um bom atrativo para o jogo. Mas além disso, Children of Silentown ainda conta com uma ótima ambientação e uma narrativa misteriosa, que é cativante o suficiente para te manter preso por algumas horas. Isso o torna uma boa opção para os apreciadores do gênero.
Jogo analisado no PS5 com o código fornecido pela Daedalic Entertainment.
Veredito
Com uma ambientação sombria e um design gráfico excelente, Children of Silentown traça seu próprio caminho para encontrar um lugar especial entre os jogos point-and-click.
Children of Silentown
Fabricante: Elf Games / Luna II Studios
Plataforma: PS4 / PS5
Gênero: Aventura Point-and-click
Distribuidora: Daedalic Entertainment
Lançamento: 11/01/2023
Dublado: Não
Legendado: Sim
Troféus: Sim (Inclusive Platina)
Veredict
With a dark setting and a great graphic design, Children of Silentown paves its own way to find a special place among the point-and-click games.