Apollo Justice: Ace Attorney Trilogy – Review

Apollo Justice: Ace Attorney Trilogy é uma coletânea que contém o quarto, quinto e sexto jogos principais da série Ace Attorney que originalmente foram lançados para Nintendo DS e Nintendo 3DS. Os títulos foram adaptados para o formato de tela única para os hardwares atuais e, também, tiveram seus visuais refeitos e uma outra série de pequenas melhorias para a trilogia atual, além de conteúdo bônus para os fãs dos jogos.    

Para os que desconhecem a série, Ace Attorney são jogos no formato Visual Novel que colocam o jogador como um advogado que deve defender seu cliente de uma acusação falsa (usualmente assassinato). Para isso, é necessário investigar o local do crime, entrevistar as partes envolvidas e, eventualmente, apresentar para a corte e juiz, as evidências e fatos encontrados durante a investigação para que o cliente fique livre das acusações. É uma série com histórias particularmente engajantes, personagens interessantes e uma excelente trilha sonora, fazendo com que tenha um público de fãs considerável. Para novatos, no entanto, é recomendável que iniciem pela primeira trilogia, Phoenix Wright: Ace Attorney Trilogy, que contém os três primeiros jogos da série. 

Para essa análise, irei focar nas mudanças e evoluções que cada título trouxe individualmente e, também, no tema geral da trilogia em si e na minha perspectiva atual após jogá-los novamente depois de tantos anos e como um único conjunto. Não irei entrar em spoilers para também não retirar qualquer surpresa daqueles que ainda não jogaram os títulos. 

Apollo Justice: Ace Attorney foi originalmente lançado no Nintendo DS em 2007 e tentou dar um novo direcionamento para a série, tanto em termos de temática quanto de jogabilidade. O título acompanha um novo protagonista, Apollo Justice, advogado recém formado e que tem como seu primeiro cliente Phoenix Wright, protagonista da trilogia anterior e que se tornou uma espécie de renegado da atuação legal após um escândalo. A temática de Apollo Justice e que também permeia os demais títulos da trilogia é “A era sombria da lei”, período que causou uma desconfiança generalizada do público com a corte devido a escândalos de evidências e acusações falsas durante julgamentos. 

Essa temática em Apollo Justice faz com que a história do título seja muito mais sombria que seus predecessores. Ace Attorney sempre lidou com temas pesados, como assassinato, com a devida importância, mas títulos da trilogia original ainda mantinham uma certa positividade após todos os mistérios serem resolvidos. Apollo Justice tem seus momentos positivos, mas sempre dentro de algum contexto mais trágico. 

Em termos de jogabilidade, AJ é o primeiro título desenvolvido inteiramente para o Nintendo DS e utilizou de várias características que foram experimentadas no quinto caso do primeiro Ace Attorney e que utilizaram várias das características do portátil da Nintendo. As evidências podem ser investigadas em mais detalhes e, muitas delas, contém modelos 3D que revelam ainda mais detalhes. A tela de toque, principalmente, foi muito utilizada em micro sistemas de jogabilidade durante a investigação como coleta de impressão digital, mixer de música, entre vários outros aspectos que envolviam algum caso. Outra novidade é o poder de Apollo, capaz de observar uma pessoa e perceber tiques nervosos quando uma pessoa tenta esconder algo. 

Apesar de tentar ser um novo direcionamento da série, ironicamente, Apollo Justice se prende fortemente nas piores características da trilogia original. Os casos são excessivamente complexos, talvez em uma tentativa de surpreender jogadores já acostumados com a trilogia original, e cuja lógica é difícil de acompanhar desde o primeiro caso. A investigação tem muitos sistemas, uma ordem muitas vezes absurda de acontecimentos para descobrir as pistas e, também, o detalhe que o jogador deve buscar nas evidências faz com que seja muito fácil ter seu progresso interrompido e sem ideia de como prosseguir. O poder de observação de Apollo, também, faz que a busca pelo tique nervoso de uma testemunha seja, essencialmente, uma busca específica de pixels no momento certo e logo se torna uma experiência frustrante devido ao timing bastante fechado desses tiques. 

De muitas formas, tudo que foi introduzido em Apollo Justice não serviu como um novo direcionamento apropriado para a série e acabou por ampliar drasticamente problemas que estavam presentes na trilogia original. A coletânea atual ainda contém um modo que avança automaticamente pelas investigações e puzzles para os jogadores que querem somente acompanhar a história, mas ainda é fato que esse é o título menos convidativo da série, mesmo que teoricamente seja um novo início para a mesma. Mesmo na época, Apollo Justice foi considerado um fracasso comercial pela Capcom e também não tão bem recebido pelos fãs como os títulos anteriores e, consequentemente, colocou a série principal em hiato por 6 anos.

Phoenix Wright: Ace Attorney – Dual Destinies foi lançado originalmente para 3DS em 2013 e, novamente, serviu para dar um novo direcionamento para a série e de forma muito mais bem sucedida do que seu predecessor. O título continua com a temática da “Era sombria da lei” de seu predecessor, no entanto, com uma tonalidade de história muito mais próxima a trilogia original do que aos teores mais sombrios de Apollo Justice. Phoenix Wright retorna como protagonista principal, Apollo como um co-protagonista e Athena Cykes une-se a equipe como a nova advogada da firma de Phoenix. Assim como Phoenix e Apollo, Athena tem sua mecânica própria de analisar sentimentos das testemunhas para descobrir mais informações e contradições em seus testemunhos. 

A grande novidade de Dual Destinies é na utilização do 3D, sendo esse o primeiro título principal que efetivamente abandonou os sprites 2D que vinham sendo utilizados na série até então. A transição dos personagens e suas animações foram feitas de maneira excelente para o 3D, os cenários agora também podem ser investigados em três dimensões e o “drama do tribunal”, pelo qual a série é conhecida, tornou-se mais dinâmico com as movimentações de câmera que agora são possíveis com um jogo inteiramente tridimensional. A nova apresentação também contém animações breves em alguns momentos e com um voice acting absolutamente terrível em inglês. 

A grande conquista de Dual Destinies, no entanto, não está só na apresentação, mas também em uma experiência geral de jogo absolutamente excelente devido a uma grande simplificação das mecânicas de jogo e em criar mistérios verdadeiramente interessantes, lógicos e que, também, não são completamente absurdos. A simplificação das mecânicas torna Dual Destinies o título mais fácil da trilogia, mas, também, o mais agradável. Há anotações que servem como dicas sobre o que deve ser feito nas investigações, impedindo que o jogador se perca em algum momento. Os casos perante a corte também se tornam mais simples de serem seguidos, devido a construção lógica, gradual e intuitiva das argumentações e conclusões que acontecem em vários momentos. 

Isso é potencializado pela presença do promotor Blackquill que, francamente, é um dos melhores promotores da série. A razão disso é que Blackquill faz questionamentos inteligentes a tudo que está sendo discutido pela corte e faz com que a construção lógica dos acontecimentos de um caso aconteça de maneira natural para o jogador. Também ajuda que a história de Dual Destinies também seja, em grande parte, excelente e com reviravoltas extremamente impressionantes para uma série que é conhecida justamente por isso. 

O último título da coletânea, Phoenix Wright: Ace Attorney – Spirit of Justice, foi lançado também para o Nintendo 3DS em 2016 e, de certa forma, também continua a ideia de uma “era sombria da lei” presente nos dois títulos anteriores. Dessa vez, Phoenix viaja para o país de Khura’in, uma nação extremamente religiosa, para encontrar-se com Maya, assistente de Phoenix na trilogia original. Após se envolver em mais um incidente, Phoenix descobre que advogados são odiados em Khura’in e não há o conceito de uma defesa justa no sistema legislativo do país, fazendo com que os suspeitos sejam sempre culpados pelos crimes. 

Spirit of Justice é algo que considero como um meio termo entre Dual Destinies e Apollo Justice em termos de tonalidade e complexidade. Os julgamentos em SoJ tem consequências muito mais graves e abrangentes do que demais jogos da série e a tonalidade da história também se torna bastante sombria em certos momentos. Alguns dos sistemas filtrados em Dual Destinies retornam em Spirit of Justice e com uma complexidade maior e que, novamente, podem se tornar frustrações para o jogador. Coletar impressões digitais, por exemplo, agora permite que se analise o objeto em um modelo tridimensional completo, o que significa que há mais locais a se procurar e mais tempo a se perder na atividade. 

A novidade de Spirit of Justice está na mecânica de divinação, onde uma sacerdotisa realiza uma cerimônia para a corte e que demonstra os últimos momentos em vida da vítima. Em Khura’in, a religião é intrinsecamente ligada com a fé em espíritos e a divinação é tomada como prova absoluta da culpa do suspeito. Nesse sistema, Phoenix observa os últimos momentos da vítima e suas sensações são descritas como palavras e, a partir dessa informação, Phoenix procura encontrar inconsistências e contradições para defender seu cliente. É um sistema interessante e que também adiciona uma perspectiva diferente a todos os demais sistemas feitos até então. 

Os casos tem uma complexidade que também ficam num meio termo entre Dual Destinies e Apollo Justice. Não tão fáceis como DD, mas, também, não tão obtusos como AJ. O promotor desse título, Nahyuta, é um monge de Khura’in e que traz suas crenças também aos julgamentos. Apesar do contexto único e diferenciado, não fui um grande fã da atuação de Nahyuta, pois muitos de seus questionamentos não ajudam a construir uma linha lógica de acontecimentos, apenas minar as argumentações da defesa para que explicações que já são longas, se tornem ainda mais desnecessariamente longas e complexas. A história em SoJ, assim como é padrão da série, é muito boa, mas também muito cansativa de se chegar aos finalmentes devido a essa necessidade da história de colocar tudo e todos contra os advogados. SoJ, efetivamente, fechou o arco da “Era sombria da lei” e também amarrou muitos mistérios que já vinham de Apollo Justice. Aproveitar os títulos em um único pacote também fez com que eu percebesse pequenas referências entre um título e outro, tornando a experiência geral mais interessante e concisa. 

Os jogos da trilogia Apollo Justice se mantêm como Visual Novels com histórias incríveis e é um título absolutamente recomendado para fãs da série ou para qualquer pessoa que goste de histórias intrigantes do gênero policial e investigação. A trilogia trouxe melhorias como o avanço automático que mitigam alguns dos problemas dos títulos originais e os tornam mais receptivos para um novo público, além de diversos bônus como artes e música. Para iniciantes, eu recomendo buscarem a trilogia anterior antes de se aprofundarem nessa, pois terão uma experiência muito mais completa dessa forma. 

Jogo (versão de PS4) analisado no PS5 com código fornecido pela Capcom.