Apesar de o gênero roguelite já ter sido explorado à exaustão nos últimos anos, ainda é impressionante como certas ideias mirabolantes conseguem gerar algumas das experiências mais viciantes. É o caso de BALL x PIT. Idealizado por Kenny Sun e distribuído pela Devolver Digital, o título combina mecânicas de quebra de blocos, bullet hell e até administração de cidades para entregar uma das produções independentes mais criativas e marcantes deste ano.
Antes uma cidade próspera, a imponente Bolalônia foi destruída por um estranho meteoro, cujo impacto resultou em um poço profundo repleto de tesouros e das criaturas mais desagradáveis. Na missão de tentar reconstruir a cidade — mas também de extrair todos os benefícios de seus tesouros perdidos —, um grupo de aventureiros desce às profundezas para desvendar seus segredos.
Ainda que a história esteja longe de ser o foco principal do jogo, a descrição acima funciona como um pano de fundo para partidas rápidas e intensamente caóticas. BALL x PIT oferece ao todo oito níveis distintos, cada um com cenários e inimigos próprios. A cada camada superada com um personagem diferente, o jogador encontra uma engrenagem que pode ser usada para aprimorar o elevador e alcançar profundezas ainda maiores.
Embora o sistema de combate pareça simples no início, ele ganha mais complexidade conforme novos dispositivos, habilidades passivas e personagens são liberados. Na prática, o jogo se estrutura em dois momentos distintos: as batalhas e o gerenciamento da base.
A principal estratégia para superar os confrontos é lançar as esferas contra os inimigos — ou contra as paredes — para criar combos e eliminá-los antes que tomem todo o cenário, abrindo caminho até o chefe final de cada nível. Cada fase conta com dois subchefes que precisam ser derrotados antes que o chefe principal se revele. O progresso dentro do nível pode ser acompanhado por meio de uma barra lateral que se enche conforme mais inimigos são derrotados.
As lutas contra os chefes não são difíceis e, de certa forma, chegam a destoar do desafio oferecido pela geração aleatória de inimigos nos mapas, principalmente porque, em alguns casos, a tela pode se encher de inimigos com múltiplas caixas a serem quebradas. A grande exceção é o último chefe do jogo, que se torna cansativo por exigir diversas vitórias para desbloquear o final da história, além de apresentar mecânicas que prolongam a luta mais do que o necessário.
Basicamente, existem duas categorias de esferas. As esferas bebês, como o próprio nome indica, são menores e causam menos dano, enquanto as esferas especiais possuem habilidades únicas, que vão desde efeitos elementais até ataques em área. Cada personagem começa com uma esfera especial própria. Além disso, habilidades passivas podem surgir aleatoriamente para aumentar o dano das esferas bebê, gerar mais esferas, favorecer um ângulo específico de ataque ou até invocar um minion para auxiliar no combate.
A cada inimigo derrotado, uma gema valiosa é deixada no chão para ser coletada para preencher sua barra de experiência durante aquela corrida. Esses níveis geram três recompensas aleatórias de esferas e habilidades passivas para serem escolhidas, que podem ser melhoradas durante aquela partida para o máximo de três níveis.
Outra forma de progressão durante as partidas são os reatores, que podem ser deixados por inimigos mais poderosos ou ao eliminar uma quantidade específica de monstros. Existem três tipos diferentes de reatores: os de fissão, que concedem melhorias de nível para itens aleatórios do seu arsenal; os de fusão, que permitem combinar duas esferas principais em uma única que mantém as características de ambas; e os de evolução, que unem duas esferas ou habilidades que possuem sinergia entre si para criar um item único e extremamente poderoso.
Essa escolha de upgrade pode ser determinante para definir sua build durante aquele cenário, já que os espaços para esferas especiais e habilidades passivas são limitados. Todas essas opções geram uma grande variedade de combinações possíveis, algo que se torna ainda mais evidente à medida que você avança para camadas mais profundas e descobre novas recompensas.
As partidas não passam de quinze minutos para serem concluídas, o que além de resultar em uma jogabilidade intensa, contribui para que você não se sinta desmotivado por ter que repetir o mesmo nível diversas vezes. E acredite, isso é algo que vai acontecer com frequência.
Falhar em BALL x PIT faz parte do processo de aprendizado e evolução. Sempre que uma fase é concluída, você pode optar por retornar à cidade para aplicar os planos encontrados durante a exploração dos mapas. Cada mapa oferece uma boa quantidade de diagramas que devem ser coletados para desbloquear novos personagens e construções, que funcionam como habilidades passivas tanto para a fase de combate quanto para a gestão de recursos necessários para continuar desenvolvendo sua base.
A administração da cidade não é muito complicada, mas oferece alternativas interessantes que garantem um sistema de progressão permanente eficiente. Há uma boa variedade de construções, incluindo casas para desbloquear novos personagens, sítios de coleta de materiais, prédios que concedem bônus de estatísticas e habilidades que oferecem vantagens significativas no combate, como, por exemplo, uma segunda chance ao morrer.
Conforme você avança para camadas mais profundas do poço e encontra planos de edificações mais avançados, a demanda por materiais necessários para a construção e evolução também aumenta. Esses recursos estão divididos entre trigo, madeira, pedra e ouro, e podem ser obtidos de diversas maneiras, mas principalmente durante o que é conhecido como fase da colheita.
Nessa etapa, você pode enviar os personagens para explorar a cidade e coletar os materiais que você mesmo espalhou pelo terreno. O processo exige cálculo e planejamento, já que é preciso traçar o caminho dos trabalhadores e organizá-los para que passem pelos locais desejados antes que o tempo de colheita se esgote. A mesma lógica se aplica à construção das edificações, cujo número de acertos necessários varia de acordo com os bônus dos personagens e o posicionamento das demais estruturas.
A maioria das construções possui benefícios passivos que são ativados ao realizar certas ações ou ao posicioná-las próximas de edificações específicas. Por exemplo, a casa do Portador do Escudo concede um ponto de construção aos prédios vizinhos sempre que um herói a acerta. Da mesma forma, fazendas, pedreiras e madeireiras fornecem materiais extras quando estão dentro do seu raio de alcance.
Todo esse planejamento é um diferencial importante para avançar de forma mais eficiente pelos cenários de batalha. Seu valor cresce ainda mais nos níveis avançados, que exigem que as fases sejam concluídas por mais de um personagem.
Aliás, BALL x PIT conta com uma boa variedade de heróis jogáveis. Além de cada um possuir sua própria esfera especial desde o início e algumas habilidades únicas, alguns personagens podem alterar o jogo de maneiras bastante inesperadas, tornando o avanço mais desafiador. Um exemplo é o Radical, que praticamente transforma o jogo em modo automático, controlando os disparos e escolhendo melhorias por conta própria. Já o Estrategista é outro personagem peculiar, capaz de modificar completamente o ritmo das partidas ao introduzir um sistema de combate por turnos.
Outros personagens estão mais alinhados com a proposta central do jogo e devem ser escolhidos por quem deseja avançar de forma mais eficiente até o final. Além disso, um diagrama permite adicionar uma construção à cidade que libera a habilidade de levar dois personagens por arena. Isso possibilita aumentar o número de esferas especiais disponíveis e coletar engrenagens com maior rapidez.
O fator de replay de BALL x PIT é ótimo, oferecendo a possibilidade de concluir níveis em tempos menores e comparar seus resultados com outros jogadores. Além disso, o modo Novo Jogo+ adiciona mais inimigos e aumenta a vida deles, elevando consideravelmente a curva de desafio.
Os gráficos em estilo pixelado são satisfatórios, e o jogo apresenta uma boa variedade de cenários de fantasia com uma paleta de cores vibrante, explorando efeitos luminosos e até psicodélicos que podem incomodar em determinados momentos, mas que, felizmente, podem ser desativados no menu de opções.
Outro aspecto importante neste tipo de jogo é a trilha sonora, que alterna entre bons e maus momentos, dependendo do cenário e do tempo necessário para superá-lo. Em mapas como o Pátio Ósseo e as Margens Nevadas, houve ocasiões em que a trilha se mostrou cansativa, ao passo que em cenários como a Floresta Fungíca e os Portões Celestiais ela se destaca por ser mais relaxante.
O grande mérito de BALL x PIT é oferecer uma jogabilidade viciante sem exigir um grind muito cansativo, ainda que tropece um pouco no confronto contra o último boss. A constante sensação de progresso, aliada às pausas estratégicas para planejar sua base e aos cenários de combate intensos, resulta em um dos roguelites mais divertidos lançados recentemente.
BALL x PIT está disponível para PS5, Xbox Series, Nintendo Switch e PC com legendas em português do Brasil. Esta análise é da versão PS5 (no PS5 Pro) e foi realizada com um código fornecido pela Devolver Digital.
