Análises

Music Drive: Chase the Beat – Review

Ela é uma habilidosa motorista de fuga; ele é um atirador que causaria a inveja de qualquer policial durão dos filmes policiais dos anos 1980. Tina & Tunner são os protagonistas que até podem fazer uma referência óbvia a uma grande artista estadunidense, mas são a força narrativa por trás de Music Drive: Chase the Beat, game com bastante (ou nem tanta) brasilidade até no nome da sua desenvolvedora, a Salve! Games.

De um modo bastante direto, este é um jogo de perseguição em veículos que remete levemente a alguns clássicos de um passado mais simples e direto, como os primeiros Driver, e que ao mesmo tempo abusa da nossa memória afetiva ao se apoiar em uma versão saturada da estética de GTA 3 e seus muitos similares daquele início de século XXI.

Music Drive: Chase the beat

A proposta não poderia ser mais simples: alguns haters criminosos muito bem organizados em gangues altamente armadas estão roubando fitas com as maiores e melhores gravações da música da quebrada e a missão dos nossos heróis é resgatar esse material para depois entregá-lo em locais seguros, garantindo assim que estas músicas cheguem às pessoas certas do jeito que deve ser.

Esta curiosa disputa por direitos autorais se dá por diferentes cenários, sendo dez fases ao todo que devem ser repetidas, no mínimo, duas vezes cada, uma para o resgate e outra para a entrega. Este mínimo é praticamente irreal, já que é virtualmente impossível seguir a receita linearmente, dado o aumento exponencial da dificuldade no miolo da campanha, quando os adversários claramente se tornam mais fortes do que nossas capacidades.

Na primeira passagem do nível, precisamos encontrar e destruir os veículos que estão carregando os itens roubados, sendo que o número de fitas aumenta em cada cenário. No primeiro, que funciona quase que como um tutorial, tem uma só gravação em jogo. Na última, caminhões enormes levam várias delas.

A prática é o mais objetivo possível: nós estamos no controle da direção do nosso veículo e, portanto, assumimos o papel de Tina. Precisamos nos aproximar do adversário para que Tunner atire neles até destruí-los, ou até dar uma forcinha jogando nosso possante contra o deles. Há capangas espalhados pela estrada tanto a pé quanto em carros padronizados por modelo e cor, e a meta é acabar com eles, pegar o pacote e chegar até o ponto final antes do nosso carro ser destruído.

A segunda iteração pelo mesmo cenário é o contrário, onde nós somos o alvo e precisamos alcançar pontos de interesse no mapa que são os locais de entrega, antes de sermos massacrados. Tudo isso em movimento, de um jeito bastante simplificado, onde não é necessário parar, estacionar em um lugar exato, nada disso. Passou pelo checkpoint, missão cumprida.

Se formos destruídos durante a entrega das fitas, as perdemos, bem como toda a recompensa pela entrega. Aí se faz necessário recolher outras fitas no mesmo cenário ou nos que já foram vencidos para tentar novamente. Se formos derrotados no momento do resgate, também perdemos tudo o que coletamos naquela fase e é necessário reiniciá-la do princípio.

É um ciclo bastante rápido de se compreender, e que depende de uma certa resiliência para compreender os limites das nossas capacidades e como repetir níveis iniciais para acumular riquezas, melhorar nossos recursos e voltar mais preparados para o que vem pela frente.

Há ainda uma gradação na dificuldade que vai de um a cinco, onde cada fase vencida aumenta um ponto. Ao alcançar o máximo, algo que acontece rapidamente, este desafio permanece inalterado a menos que usemos um recurso de suborno (gastando cinco mil dinheiros in-game) que reinicia esse contador, uma pequena trapaça que custa uma grana considerável dado que ganhar tudo isso, no início, é penoso.

Mais proveitoso é gastar esse rico dinheirinho melhorando nossos recursos em definitivo, comprando carros mais fortes e velozes ou uma arma mais potente. É uma pena o jogo ser curto e contar com pouquíssima variedade desses itens. São uns cinco veículos e apenas três armas, cada qual com cinco níveis de evolução.

Trocando em miúdos, a ideia é conseguir grana com as primeiras entregas, comprar um carro melhor e investir na sua melhoria, comprar a shotgun que é a arma mais potente do arsenal, e dar tudo para elevá-los ao nível máximo. Fazendo isso, as batalhas no asfalto ficam mais tranquilas e alcançar os créditos finais, mesmo sem diminuir a dificuldade nenhuma vez, é quase natural.

O problema é que o nível de dificuldade do jogo é instável. Ele se torna complicado na metade, e vencer a quinta fase demanda repetir bastante as anteriores. Mas uma vez que se consiga chegar em um ponto crucial, depois tudo fica muito tranquilo. Quando liberei a possante kombi preta e deixei ela no máximo de seu potencial com entregas mais recompensadoras, não falhei mais e os últimos níveis foram triturados sem nenhum susto.

Como um jogo de tiro curto (com trocadilho intencional), Music Drive: Chase the Beat funciona exatamente como deveria, durando algo em torno de duas ou três horas, dependendo da vontade de repetir ou de arriscar na primeira metade, já que ao oferecer um modelo de gameplay único, poderia se tornar maçante e desinteressante se tentasse se alongar para além do que faz.

Ao mesmo tempo, o jogo se aprofunda muito pouco em todas as suas características. As perseguições são exatamente as mesmas, os traçados são bastante burocráticos e o combate não tem muito o que fazer para ser diferente do padrão de se aproximar e esperar que nosso poder de fogo seja maior que o dos inimigos. Você até pode tentar se esconder atrás dos carros aleatórios, passar por atalhos ou variar na aceleração, mas o resultado, via de regra, não muda praticamente nada e não valoriza qualquer estratégia que não a de ficar mais forte.

Outro ponto que acaba se perdendo é a identidade visual do projeto, que por um lado, como citado lá no começo da análise, bebe da nossa nostalgia com GTA, inclusive dando uma opção de deixar os gráficos pixelados em um filtro bastante deficitário e quase intragável e abrindo espaço para alternar entre a primeira e a terceira pessoa, mas por outro, perde completamente a ideia de ser um jogo pensado para se passar pelas quebradas brasileiras.

A grande maioria dos cenários se localiza em campos, plantações e áreas semi desérticas que pouco ou nada lembram qualquer centro urbano daqui ou lá de fora. São pouquíssimas as construções prediais, como barracões e postos de gasolina que surgem em ambientes que são basicamente estradas e rodovias vazias e genéricas, onde laranjais e fazendas são uma série repetida de imagens unidimensionais sem volume.

O visual retrô não deixa de ser um charme de Music Drive: Chase the Beat e, claro, de refletir o escopo do tamanho de uma produção independente brasileira, então este estilo não é um problema propriamente dito. O que mais faltou é uma identidade mais marcante, com vielas, ambientes urbanos, cachorro caramelo, postes com fios pendurados, rua esburacada, barrancos mais acidentados, enfim… locais que nós reconheçamos pela nossa vivência.

Outro ponto bastante questionável é a interface de usuário que flerta com esboços pouco desenvolvidos. Tipografia, design de menus e de navegação, e cores chapadas são até aceitáveis, mas sem qualquer cuidado de diagramação ou composição. As setas que marcam os destinos na pista são horrorosas e devem muito até para jogos que utilizam desse recurso lá da geração 32 bits. É desleixado e desagradável.

Por outro lado, a trilha sonora é arrasadora, um mérito tanto dos idealizadores do jogo quanto do Rapper NP Vocal que assina (ao lado de outros nomes importantes da cena da street music no Brasil) as gravações disponíveis para serem resgatadas e tocadas durante a jornada. Claro que há um elemento de gosto e preferência pessoal do jogador, mas para a ambientação temática do game, são todas músicas incríveis. Se o tema principal cola como chiclete na cabeça, o conjunto das composições do jogo é o grande protagonista da projeto.

Sem tantos atrativos em termos de jogabilidade e com visuais no máximo adequados, mas sem a personalidade que poderia ter, Music Drive: Chase the Beat é divertido em sua essência, mas oferece pouco para se manter para além das primeiras horas, tempo que se leva para não só zerar, comprar os itens mais caros e fazer tudo o que é possível, como também platinar.

Como um conjunto, é um jogo com ideia inicial bem delineada, mas sem qualquer desdobramento ou desenvolvimento mais profundo. Esta essência é sim divertida e não deixa de ser relativamente diferenciada na comparação com o que o mercado oferece, mas tudo em torno dela, exceto pela trilha matadora, carece de um pouco mais de cuidado, de elaboração e de carinho, algo que quero muito ver em uma sequência se isso for possível um dia. Tal como está, é um jogo cru, rápido e que pode acabar caindo no esquecimento.

Music Drive: Chase the Beat está disponível para PS4, PS5, Xbox One, Xbox Series, Switch e PC com legendas em português do Brasil. Esta análise é da versão PS5 e foi realizada com um código fornecido pela QUByte Interactive.

Veredito

Music Drive: Chase the Beat é um jogo brasileiro cheio de boas intenções, traz uma ótima trilha musical, e bebe de referências imponentes para dar corpo a uma ideia simples, mas interessante e criativa. Porém, mesmo curto, é um jogo que traz pouquíssima variação de jogabilidade, tem problemas em encontrar uma personalidade coerente com a temática e carece de um esmero maior para alcançar todo o seu potencial.

50

Artigos relacionados

Botão Voltar ao topo