Toda a glória e a (pouca) adrenalina desta franquia que licencia e representa o maior evento do ciclismo mundial estão de volta em Tour de France 2025, edição anual do jogo que, desta vez, traz mudanças substanciais em sua essência técnica, mas não nas mecânicas que fazem dele muito mais um jogo de estratégia do que de corrida propriamente dito.
Migrando para o poderoso e ainda pouco explorado Unreal Engine 5, a ideia do jogo é finalmente dar um passo adiante naquilo que evidentemente, como bem destacado no review da edição passada, estava defasado na comparação com outras transposições esportivas para o mundo virtual. O resultado é um misto entre uma física revigorada e visuais ainda aquém do que se espera de um jogo desta geração.
Para ser mais específico, posso afirmar que é notável o trabalho na simulação entre efeitos climáticos, sobretudo na velocidade e na direção do vento, no desempenho de nosso ciclista, e na necessidade de se saber dosar onde aplicar o fôlego limitado que temos para não ficar para trás.
A lição preciosa que aprendi experimentando o game anterior é que se afobar é a forma mais dolorosa de se alcançar uma derrota acachapante. Tentar tomar a liderança logo de cara é a pior escolha possível, já que ser a ponta da lança significa encarar a resistência do ar de peito aberto, uma desvantagem quando a coisa aperta no final.
Seguir cautelosamente, alternando entre bons sprints e depois se escondendo atrás de outros adversários para evitar o arrasto, incluindo os da sua própria equipe, é aqui tal como na versão real o único jeito de se atingir um ponto de estar em condições para aquele gás final nos últimos 500 metros de uma disputa.
Isso significa, porém, que o jogo é pouco indicado para quem espera disputar corridas alucinantes, tomar posições em trechos apertados e se destacar pelo arrojo em curvas fechadas como em jogos de corrida mais convencionais. Claro que saber fazer uma curva é fundamental, aprender a tangenciar uma passagem mais acidentada é uma vantagem, mas está longe de ser o ponto central da jogabilidade.
Com três barras bem amarradas umas às outras nos dando o feedback das nossas condições de força a e fadiga, o segredo é, portanto, não correr para se vencer o tempo todo, mas sim se manter apto por horas a estar dentre os mais preparados para os poucos segundos finais. E é aí onde a potência da modalidade se torna também sua pior fraqueza.
Afinal, quando você precisa passar literalmente por centenas de quilômetros se preparando para poucos metros, a conta da diversão não fecha. Não é culpa do sistema competitivo adotado, já que ele funciona muito bem como espelho da versão de carne e osso, mas simplesmente porque ele é pensado muito mais para a visão do competidor tático, não do espectador que espera ação, reviravoltas e dinamismo constante.
Em outras palavras, todas as ações dentro da corrida devem ser planejadas e executadas com um certo rigor para o momento de definição, seja na cadência do uso da força contínua, na proteção das lideranças da equipe ou nas ações para incomodar os inimigos, algo que nos níveis mais intensos de desafio, pode ser um belo quebra-cabeças em tempo real.
Enquanto a grande parte da disputa está na construção de uma tensão contínua – o que por si só pode contribuir para a dispersão desta mesma tensão – o jogador acaba se tornando um passageiro de poucas ações significativas durante boa parte do tempo. Dependendo do nível de dificuldade, você pode literalmente segurar o botão de acompanhar um adversário e nem se preocupar em olhar para a tela por uma, duas horas.
Para os pacientes, claro, tudo pode compensar pelos instantes finais. Aquele momento onde todos estão segurando as forças antes de disparar com toda intensidade, calculando milimetricamente até onde dá pra ir economizando energias para não explodir cedo demais e ficar sem gás nos últimos metros.
Os adeptos, portanto, poderão sentir o vento bater no rosto e se imaginar passeando pelas charmosas ruas de Paris e de outras localidades europeias presentes no jogo, como a Bélgica ou a Itália. São várias etapas e eventos, incluindo um original para o game chamado Circuito Grand Est, onde podemos desfilar toda a nossa habilidade no comando das magrelas.
E se por um lado, esses locais, tais como a Champs-Elysées, a região montanhosa de Ardenas, o Bosque de Arenberg, a Mont Ventoux, e o Mur de Huy estão ainda mais fiéis às suas contrapartes aqui do mundo exterior, o game ainda parece um pouco grosseiro no acabamento fino, com texturas borradas e um sistema se sombras que se comportam bem no que se refere à dinâmica da iluminação, mas que parecem craqueladas e com recortes aparentes, principalmente nos efeitos da iluminação por entre folhagens.
O visual de competidores e outras construções também não se prova melhor, e muitas coisas parecem ainda recicladas da versão anterior, tal como a movimentação robótica dos ciclistas em vários momentos, seja porque é um padrão copiado de transmissões televisivas, seja porque são movimentos funcionais que evitam a reinvenção da roda. Mas de qualquer forma, é um jogo visualmente cru e esteticamente pouco agradável, mesmo dotado de belas paisagens.
Esta apresentação se vale dos licenciamentos tanto de atletas como de equipes reais, estatísticas detalhadas e uma interface que tem um enrosco aqui e outro ali mas que, no geral, funciona bem. Como nós, brasileiros, claramente não somos um público alvo prioritário, a falta da localização no nosso idioma pode atrapalhar o entendimento de orientações, termos técnicos e configurações mais sutis.
Elementos de customização ajudam na sensação de imersão proposta pelo jogo em realmente se apoderar deste universo para além de assumir este ou aquele competidor. Desafios sazonais e outras ações podem liberar itens cosméticos e ajudar nesta personificação. Mesmo que nada disso seja exatamente inédito, é um elemento praticamente obrigatório que não deixa de agregar valor ao conjunto.
Na soma de todos estes elementos, é fácil recomendar Tour de France 2025 para fãs do esporte em sua forma original, já que o esforço em retratá-lo em seus detalhes é cada vez mais evidente e louvável; ou para quem procura uma experiência muito diferente do que encontra em jogos de corrida tradicionais, principalmente quem já experimentou os jogos anteriores da franquia e se identificou com o estilo estratégico da disputa.
Para estes perfis, é fácil dizer que as novas configurações técnicas adicionam mais realismo aos trajetos e variáveis significativas para tomadas de decisão. Além disso, toda a representação audiovisual ganhou novos contornos, mesmo longe daquilo que sabemos ser os limites desta geração e do motor gráfico mais recente da Unreal.
Porém, se você não se enquadra em nenhuma destas duas parcelas muito específicas de jogadores, a recomendação é um pouco mais complicada. Não é um jogo intenso, tampouco cheio de pontos de adrenalina. Também não exige tantas habilidades de comando da magrela ou equilíbrio, e ainda não se preocupa com o quão rápido você pode ser por muito tempo.
As opções de edição de pistas e de eventos customizados podem dar uma dimensão menos formal para o jogo, permitindo que possamos, seja em multiplayer contra amigos ou estranhos ao redor do mundo, seja sozinho, nos aventurar pelas estradas bucólicas de uma Europa convidativa. Entretanto, não espere muito mais do que isso.
Tour de France 2025 está disponível para Playstation 5, Xbox Series e PC. Esta análise foi produzida jogando no PS5 e realizada com um código fornecido pela NACON.