Já “jogou” Black Mirror: Bandersnatch na Netflix?

Black Mirror é uma série da Netflix, lançada pela emissora Channel 4 em 2011, e comprada pela própria Netflix em 2015, com algumas temporadas. Cada episódio diferente, mas há teorias que tudo se passa no mesmo futuro próximo. Aborda as consequências da tecnologia em nosso dia a dia, de uma maneira bem metalinguística e intensa. Esta matéria não terá spoilers para não afetar seu ‘gameplay’.

Bandersnatch é um filme dentro deste universo, mas em 1984, e com a possibilidade de interação do usuário, que pode decidir as ações a serem tomadas pelo personagem principal escolhendo entre duas opções de maneira similar a Heavy Rain, por exemplo. Se você assiste Netflix pelo PS4, seu controle vibra notificando a interação a seguir e é necessário escolher uma ação com o direcional em até 10 segundos, ou ela será feita aleatoriamente. O filme conta com vários finais e o tempo de gravação é de 5h20, ou seja, você tem muito mais do que 90min de filme para assistir todas as possibilidades. O filme interativo funciona em diversos dispositivos, exceto Chromecast e Apple TV, por questões de compatibilidade com a múltipla escolha.

No filme, você decide por Stefan Butler, um programador de 19 anos na década de 80 e com problemas traumáticos na família. Ele deseja terminar seu jogo chamado Bandersnatch (de mesmo nome de um livro interativo), no console ZX Spectrum, e torná-lo um sucesso, junto da produtora Tuckersoft. O jogo tem cara de ser o maior sucesso, pois dá ao usuário a possibilidade de escolher seu destino, uma novidade na época. O livro de referência foi escrito por Jerome F. Davis, que teve uma história sinistra por ficar aficcionado pela narrativa.

De acordo com as suas escolhas, que variam de aceitar o emprego como programador fulltime, você pode escolher o sucrilhos de café da manhã, até mesmo se discute com seu pai, ou faz coisas macabras. Um usuário no Reddit (link com spoiler) fez um fluxograma das possibilidades de resposta e interação. De acordo com suas decisões, seu jogo pode ser um sucesso ou um fracasso. E sua vida também.

No filme, a produtora de jogos Tuckersoft é responsável por sucessos como Nohzdyve e Metl Hedd (ambos são referência aos episódios de Black Mirror, Nosedive e Metalhead). Em uma das cenas pós-créditos, Stefan está no ônibus e escolhe uma fita da demo de Bandersnatch para ouvir em seu walkman. Não é uma música, mas sim ruídos de processamento e sinais (semelhante a fax e computadores antigos, como o ZX). O som foi codificado para QR code, que leva ao site da própria Tuckersoft! O site, além de ter na URL os números de uma das escolhas do filme (20541), possui mais referências aos demais episódios da série, como nomes de jogos, e o arquivo .tap para emular e jogar Nohzdive. Recomendo o emulador Speccy para aproveitar a nostalgia. O marketing está tão intenso que está surgindo ao redor do mundo lojas de games retrôs idênticas ao filme, assim como matérias em jornal.

Já ouviu falar na teoria de que Pac-Man é na realidade um jogo de terror, onde o pobre coitado do Come-Come fica correndo de fantasmas, sem livre arbítrio, num pesadelo infinito? Esse tema também é abordado no filme, se tornando o clímax da narrativa, com alguns easter eggs entre outro desenvolvedor de jogos, Colin, e suas decisões. A imersão ao mundo do videogame é bem abrangente. 

Bandersnatch é um jogo falho que de fato existiu, desenvolvido pela Imagine Software, porém a produtora faliu antes do lançamento (9 de julho de 1984, data de início do filme). O jogo teve os direitos comprados, surgindo dele Brataccas, um game para Amiga, Atari ST, e Macintosh em 86.

O nome Bandersnatch originalmente deriva de um monstro do livro Alice Através do Espelho, de Lewis Carrol, mas não tem relação direta com a aparição do filme (ficaremos sem spoilers nesta matéria). Nome também usado para os monstros da versão americana de muitos jogos de Final Fantasy, e Resident Evil – Code: Veronica.

Na década de 80, múltipla escolha era uma revolução. O PS3 e PS4 possuem vários jogos para você mesmo definir seu destino, com nossa Análise:

Além da narrativa se tornar mais personalizada, a ideia de que podemos escolher o final mais interessante da jogatina faz toda a diferença. Além de deixar o jogo mais fluído, a vontade de colecionar finais diferentes aumenta o gameplay, criando mais fidelidade. Detroit: Become Human, por exemplo, foi nomeado na The Game Awards com melhor Narrativa, melhor Direção e Performance. Infelizmente não levou nenhum, mas foi páreo duro, como um dos jogos mais aguardados e emocionantes de 2018, com inúmeras possibilidades, finais e escolhas.

A crítica do filme interativo, além de trazer os aspectos inquietantes de Black Mirror, também nos mostra que as escolhas que fazemos interfere em terceiros. Neste caso, o próprio protagonista percebe uma interferência em suas decisões (como se não fosse ele mesmo [mas sim, você e eu]). Decisões importantes são tomadas que mudam completamente o rumo da narrativa, tornando as cenas cada vez mais inusitadas, abordando até mesmo a própria Netflix. Isso é muito Black Mirror!

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